MEC corta R$ 348 milhões em livros para a educação básica
O MEC (Ministério da Educação) decidiu que o bloqueio mais recente de seu orçamento, anunciado no final de julho, atingirá a educação básica. Ao todo, a pasta bloqueou R$ 348.471.498 na “produção, aquisição e distribuição de livros e materiais didáticos e pedagógicos para educação básica”.
A informação, publicada ontem no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira), foi coletada e repassada ao UOL pela ONG Contas Abertas.
No dia 30 de julho, o governo federal anunciou a decisão de bloquear R$ 348 milhões do orçamento do MEC como parte de um contingenciamento maior, de R$ 1,442 bilhão, referente ao terceiro bimestre de 2019. Caberia ao ministério decidir onde seria o corte, que poderia ser diluído em diversas ações da pasta.
Secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco afirma que “o valor exato do bloqueio recém-anunciado foi idêntico ao valor bloqueado nos livros didáticos”.
O governo também cortou outros R$ 94,4 milhões em assessoramento e assistência técnica de organismos internacionais, R$ 35 milhões em avaliação da educação básica e R$ 9,4 milhões do Pronatec (bolsas e auxílios). Esse valor, no entanto, foi compensado pelo desbloqueio de outros R$ 94,4 milhões referentes ao contingenciamento de abril.
Voltam para o orçamento R$ 1,7 milhão para apoio a entidades de ensino superior não federais e R$ 21 milhões para a administração da tecnologia da informação.
Também foram desbloqueados R$ 1,7 milhão para o plano estratégico de formação inicial e continuada de profissionais do magistério da educação básica, R$ 26,5 milhões para o projeto Desafio da Sustentabilidade, R$ 29,5 milhões para o gerenciamento orçamentário de políticas educacionais e R$ 14 milhões para “despesas diversas”.
“Os remanejamentos são de decisões anteriores”, explica Castello Branco. “Os decretos estipulam apenas o valor a ser contingenciado por pasta. Internamente eles podem mover esses contingenciamentos como quiserem.”
Procurado, o MEC informou em nota que a produção, aquisição e distribuição de livros e materiais didáticos e pedagógicos para a educação básica estão garantidas em 2020.
Discurso presidencial
A decisão do governo volta a contrariar discurso do presidente, que em entrevista no mês de maio afirmou que não pretendia “cortar recurso por cortar”. “A ideia é pegar e investir na educação básica”, afirmou.
No mesmo mês, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou no plenário da Câmara dos Deputados que a educação básica está defasada. “Cinquenta por cento das nossas crianças passam pelo ensino fundamental sem aprender a ler, escrever e fazer conta”, disse.
Este não é o único problema enfrentado pelo MEC. Ao todo, o governo bloqueou R$ 6,1 bilhões da educação neste ano, maior corte entre a Esplanada dos Ministérios.
Educação e empregos
“Essa é a prioridade do governo para o ensino básico?”, questiona a professora Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV (Fundação Getulio Vargas). “Recebo essa informação com muita tristeza, porque o governo tinha acenado que a prioridade seria a educação básica. Fazia sentido porque o Brasil gasta pouco nesse setor.”
Ela lembra que 81,7% dos alunos brasileiros estudam em escolas públicas. “Uma das boas coisas que o Brasil construiu ao longo dos anos foi justamente um programa sólido de livro didático e material de apoio aos professores”, diz.
Costin afirma que as escolas já deixaram de receber livros no primeiro semestre. “Talvez esse seja o anúncio de um bloqueio já realizado, porque muitos professores não receberam seus livros no primeiro semestre. Várias editoras já tinham imprimido e não puderam entregar. Será ainda mais triste se esse for um corte adicional.”
Para a diretora-executiva do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), Mônica Gardelli Franco, o bloqueio não apenas impede que “os alunos de todas as escolas públicas, do [ensino] fundamental ao médio, tenham material” como “mexe na economia produtiva do livro didático”.
Ela afirma que a cadeia de empregos do setor deve ser afetada. “O livro didático é o maior volume de produção das editoras brasileiras. Toda a cadeia produtiva será afetada: o autor, a produção e a distribuição do material para escolas.”
Do UOL