No Roda Viva, Santa Cruz critica autoritarismo de Bolsonaro
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil(OAB), Felipe Santa Cruz, disse na noite desta segunda-feira não considerar que houve quebra de decoro por parte do presidente Jair Bolsonaro nas declarações sobre seu pai, Fernando Santa Cruz. Em caso de quebra de decoro, as falas poderiam ser enquadradas pela lei que regula o crime de responsabilidade, hipótese na qual o líder da entidade não acredita.
— Se houve quebra de decoro, sinceramente não acho. Acho que é parte desse processo de polarização da sociedade, que leva as pessoas a fazerem afirmações como essa — disse Santa Cruz, em declaração concedida ao programa “Roda Viva”, exibido pela TV Cultura.
Na semana passada, ao reclamar sobre a participação da OAB na investigação do ataque a faca sofrido durante a campanha eleitoral no ano passado, Bolsonaro disse que poderia contar a Felipe Santa Cruz como o pai dele, Fernando, desapareceu durante a ditatura militar.
O presidente afirmou, em um segundo momento, que o militante teria sido morto por colegas da organização revolucionária da qual fazia parte,versão que não condiz com documentos da época e nem com o resultado da investigação da Comissão Nacional da Verdade. Ao declarar o episódio como encerrado, Bolsonaro também disse que não houve quebra de decoro nas próprias falas.
Desde então, circulam nas redes sociais notícias falsas que dão conta de que Fernando teria sido assassinado por comunistas e por membros da Ação Popular (AP), grupo do qual fazia parte. Outras publicações dizem que o presidente da OAB mentiu para receber R$ 37 mil de “bolsa ditadura”. No entanto, ele não consta entre os beneficiados pela indenização em razão de reparação feita pelo Estado.
No “Roda Viva”, o presidente da OAB defendeu que a disseminação de notícias falsas seja investigada pela Polícia Federal (PF) e o Ministério Público.
— Nós estamos desprezando o poder de manipulação das notícias falsas. Há uma máquina de disseminação pra destruir a honra das pessoas. Estamos deixando crescer um monstro. Essa bomba relógio vai matar a democracia. Ela pretende matar todos que ousem pensar diferente — afirmou Santa Cruz.
‘Arroubos autoritários’
Santa Cruz também demonstrou preocupação com o que chamou de “arroubos” autoritários das declarações de Bolsonaro.
— Eu quero que ele (Bolsonaro) governe para todos. Todas essas tentativas e arroubos autoritários têm que ser ultrapassados. Há sim um namoro confuso de afirmações sempre com a ideia de que as instituições estão criando problemas com sua visão de mundo — declarou durante o programa da TV Cultura.
Lava-Jato
Ao comentar sobre os vazamentos de conversas do Ministro da Justiça Sergio Moro e do procurador Deltan Dallagnol, Santa Cruz defendeu o afastamento de Dallagnol do cargo de coordenador da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba. No entanto, manteve cautela ao tratar sobre a possibilidade de nulidade dos processos em razão de suposta falta de isenção de Moro na condução dos processos.
— Temos dezenas de procuradores que podem exercer a função de coordenador da Lava-Jato — pontuou Santa Cruz. — Para saber se tem nulidade, somente olhando cada processo. Pode ter nulidade relativa. Mas posso dizer que não há o comprometimento da operação para o processo político.
Para o advogado, os vazamentos do caso devem levar a uma reflexão sobre os métodos utilizados na Operação Lava-Jato. Ele também disse que considera que a ação de combate à corrupção gerou na sociedade um sentimento de clamor pela punição.
— De positivo, a Lava-Jato trouxe para o Brasil a ideia de que não havia quem ficasse impune mais no país. Depois, porém, tivemos flexibilizações perigosas, prisões espetaculosas e humilhantes. Começo a ter processos que são julgados de maneira subjetiva — destacou Santa Cruz. — Apenas se pede que seja criado um processo que tenha equilíbrio, o mínimo de paridade entre as partes. Eu gostaria de pedir que a defesa também participasse das coletivas de imprensa junto com os procuradores, por exemplo.
Por fim, o presidente da OAB se opôs ao modelo de endurecimento da política de segurança pública com o aumento do encarceramento, defendido pelo presidente Bolsonaro.
— Temos 726 mil presos, muitos deles provisórios. Nós só regredimos nesse modelo de encarceramento em massa. Especialistas dizem que o crime veem caindo pela dinâmica do crime e não em razão dessas políticas — contrapôs Santa Cruz.