Troca na Receita pode blindar Flávio Bolsonaro
Em poucas semanas, Jair Bolsonaro desmontou o Coaf, fritou o diretor da Polícia Federal e indicou um aliado para a Procuradoria-Geral da República. Agora chegou a vez de mexer no comando da Receita.
O presidente atribuiu a demissão de Marcos Cintra ao projeto da nova CPMF. É uma versão capenga, que não explica a troca abrupta. Na segunda-feira, o ministro Paulo Guedes também defendeu a recriação do imposto. Chegou a fornecer detalhes sobre alíquotas e previsão de arrecadação.
Se a ideia foi mal recebida, o presidente deveria tirar satisfações com o ministro. Não faz sentido punir um subordinado pela incontinência verbal do chefe.
Na Receita, Cintra era visto como um secretário ausente. Ele assumiu o cargo com o objetivo de influenciar os debates da reforma tributária. Demonstrava mais interesse em defender suas teses do que em comandar o dia a dia do Fisco.
De qualquer forma, o economista prometeu aos auditores que barraria tentativas de interferência política. Ontem eles estavam menos preocupados com sua saída do que com a escolha de quem irá substituí-lo.
Em agosto, o noticiário registrou diversas tentativas de intervenção na Receita. O superintendente do Rio foi pressionado a afastar o chefe da alfândega em Itaguaí, área de influência das milícias. Também resistiu a trocar o comando do posto de atendimento na Barra, bairro em que vive a família presidencial.
Na mesma semana, Bolsonaro reclamou publicamente do Fisco. Sem apresentar provas, ele acusou o órgão de promover uma “devassa” contra seus parentes. Também se queixou a Cintra de “perseguição” a um irmão, conforme noticiou o “Valor Econômico”.
O capitão tem um motivo mais próximo para se incomodar. A Receita participava ativamente das investigações que envolvem o senador Flávio Bolsonaro, suspeito de embolsar salários de assessores. O caso está paralisado por decisão do ministro Dias Toffoli.
O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais, Mauro Silva, está pessimista. Ele tinha restrições a Cintra, mas teme que ele dê lugar a um pau-mandado do governo. “Este risco nos preocupa muito, porque estamos assistindo a um desmonte dos órgãos de combate à corrupção. Infelizmente, a perspectiva de piora é grande”, afirma.