Alesp tem historico de acobertamento de deputados

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Foto: Divulgação

Será uma exceção se resultar em denúncia e condenação a investigação sobre a suspeita de “rachadinha” no gabinete do deputado estadual paulista Gil Diniz, líder do PSL na Assembleia Legislativa e braço direito da família Bolsonaro em São Paulo.

Outras suspeitas de que deputados da Assembleia de SP recolhiam para si parte do salário de funcionários comissionados não prosperaram em investigações do Ministério Público e tampouco foram analisadas na Casa.

A pedido da reportagem, a assessoria da Assembleia fez um levantamento e informou que, desde 1999, não houve casos de “rachadinha” levados ao Conselho de Ética. Isso não significa, porém, que não houve acusações desse tipo envolvendo deputados da Casa.

Muitas vezes os casos também incluíam suspeitas de outras práticas ilegais, como nepotismo e funcionários fantasma —mas a maior parte terminou arquivada pelo Ministério Público de São Paulo.

Em março deste ano, por exemplo, a Promotoria arquivou uma denúncia anônima de “rachadinha” no gabinete do deputado Campos Machado (PTB). Em julho, outra apuração, sobre funcionários fantasmas e nepotismo, também foi arquivada.

Nesse caso suspeito de “rachadinha”, os investigadores apontam que a acusação não tinha fundamentos que a comprovassem e, por ser anônima, não havia como solicitar mais informações ao denunciante.

Também partiu de uma denúncia anônima a investigação instaurada em julho para apurar suspeita de “rachadinha” no gabinete do deputado Coronel Nishikawa (PSL). O inquérito está sob sigilo.

A denúncia anônima, no entanto, é somente uma das dificuldades na investigação de “rachadinhas”. É preciso haver testemunhas dispostas a confirmar as suspeitas e, em geral, essas pessoas são funcionários dos gabinetes —ou seja, não interessadas em revelar todo o esquema.

Além das provas testemunhais, a investigação busca dados bancários e financeiros que corroborem o desvio do salário dos funcionários.

No caso de Gil Diniz, revelado pela coluna Painel, da Folha, o promotor Ricardo Manuel Castro determinou que a Assembleia forneça a qualificação completa dos funcionários do gabinete do deputado e também os comprovantes de pagamento dos salários deles.

Na segunda-feira (21), o promotor deu 15 dias para que Gil Diniz se defenda das acusações e marcou para 21 de novembro a oitiva de Alexandre Junqueira, o ex-funcionário do deputado que denunciou o suposto esquema ao Ministério Público.

Junqueira relata que era assessor especial no gabinete e lhe pediram que devolvesse parte do seu salário, o que ele não aceitou e, por isso, foi rebaixado ao cargo de motorista. Como punição, diz ter ficado em casa, impedido de trabalhar por quatro meses, quando finalmente foi exonerado em julho.

“Presenciei por várias vezes a circulação de dinheiro em espécie e o pagamento de diversas contas particulares com esse dinheiro oriundo da ‘rachadinha’”, relatou Junqueira. O ex-assessor diz ainda que o gabinete abriga uma funcionária fantasma.

Gil Diniz afirma que contratou Junqueira por tê-lo ajudado na campanha, mas que ele não se adaptou ao trabalho na Assembleia e foi exonerado. O deputado afirma que a acusação é falsa e trata-se de uma retaliação.

Outra suspeita de “rachadinha” na Assembleia diz respeito ao deputado Luiz Fernando Teixeira (PT) e foi arquivada neste ano.

“Inicialmente, a representação tem roupagem de denúncia anônima, subscrita por pessoa autodenominada por Otaviano da Silva sem qualificação nem documentação nem endereço válido. Não apresentou informações confiáveis”, escreve a promotora Luciana Vieira Dallaqua Vinci, ao solicitar o arquivamento em maio.

A acusação de Silva, feita em 2017, fala em “rachadinha”, funcionário fantasma, nepotismo cruzado, lavagem de dinheiro, ausência para fazer viagem ao exterior, tráfico de influência e evolução patrimonial injustificada.

O caso também foi analisado pela Promotoria do Patrimônio Público e Social, que o arquivou em janeiro do ano passado.

Houve ainda uma acusação contra o ex-deputado Adilson Rossi (PSB), relatando prática de nepotismo e que um de seus funcionários não recebia o valor integral do salário, apenas R$ 500. O inquérito foi instaurado e arquivado em 2014, sem comprovar as suspeitas.

Ainda está em andamento no Ministério Público uma investigação sobre a ex-deputada Clélia Gomes (Avante), revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo. Uma ex-assessora do seu gabinete depôs à Justiça e confessou ter sido responsável por arrecadar parte do salário dos funcionários.

A acusação também relata a existência de funcionários fantasmas, outro expediente visto com frequência entre os parlamentares e com o mesmo propósito da “rachadinha” —o de desviar salários de assessores para proveito próprio.

A legislação permite que assessores parlamentares atuem fora da Assembleia, em outras cidades do estado.

O deputado Edmir Chedid (DEM) é alvo de duas investigações que apuram se ele nomeou na Assembleia pessoas que de fato não trabalhavam para seu mandato. Uma terceira investigação, sobre o mesmo tema, foi arquivada em 2018.

Um dos casos de Chedid, revelado pelo SBT em 2015, também envolve o ex-deputado Aldo Demarchi (DEM). Os parlamentares empregaram os aliados políticos João Carlos Vitte (DEM), ex-prefeito de Santa Gertrudes (SP), e seu filho, João Carlos Vitte Júnior, em cargos na Assembleia. Segundo a reportagem, ambos se dedicavam, no entanto, a atividades pessoais na cidade.

Em 2016, o irmão do presidente Jair Bolsonaro, Renato Bolsonaro, foi exonerado após acusação de que seria funcionário fantasma do deputado André do Prado (PR). Ele estava lotado no gabinete desde 2013, mas foi flagrado trabalhando em uma das suas lojas de móveis em Miracatu (SP).

O inquérito sobre esse caso também foi arquivado. Em novembro de 2017, o Ministério Público concluiu que não ficou demonstrado que Renato não trabalhava para o deputado.

Foram apresentados documentos que demonstram sua participação em eventos representando o deputado e também a folha de ponto que atesta a frequência —esta, no entanto, é controlada pelos próprios deputados.

O filho mais velho de Bolsonaro, senador Flávio Bolsonaro (PSL), também é suspeito de praticar a “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio. O Coaf, órgão de inteligência financeira, apontou movimentação atípica nas contas de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.

Flávio Bolsonaro foi deputado estadual de 2003 a 2018 e, segundo o Ministério Público, há indícios robustos dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa de 2007 a 2018, período em que Queiroz, pivô da investigação, trabalhou com ele como uma espécie de chefe de gabinete.

A investigação foi suspensa pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, após pedido da defesa do senador.

DEPUTADOS ACUSADOS DE ‘RACHADINHAS’

Campos Machado – PTB

Coronel Nishikawa – PSL

Gil Diniz – PSL

Luiz Fernando Teixeira – PT

Adilson Rossi (ex-deputado) – PSB

Clélia Gomes (ex-deputada) – Avante

Edmir Chedid – DEM

Aldo Demarchi (ex-deputado) – DEM

André do Prado (ex-deputado) – PL

OUTRO LADO
Campos Machado (PTB) reiterou sua inocência nos casos investigados. Luiz Fernando (PT) afirmou ter sido vítima de uma denúncia anônima. “Reitero que este tipo de prática ilegal não faz parte do meu mandato”, disse.

Coronel Nishikawa (PSL) negou a prática de “rachadinha” em seu gabinete. Edmir Chedid (DEM) afirmou que “os servidores citados já foram ouvidos e comprovaram o exercício de suas atividades e controle de presença”. Disse ainda que “calúnias e acusações fantasiosas” partem de adversários políticos.

Aldo Demarchi (DEM) afirmou que seu funcionário “recebia as demandas de várias cidades da região” e atendia “entidades e a população em geral”. A reportagem não obteve resposta dos demais deputados.

Folha