Apoio à educação inclusiva é gigantesco no Brasil
Uma década após o país ter decretado oficialmente adesão à convenção mundial da ONU pelos direitos das pessoas com deficiência —que, entre outros pontos, preconiza a educação inclusiva, em que toda criança estuda em um mesmo ambiente, sem segregação— o brasileiro indica apoiar o modelo.
Pesquisa nacional do Datafolha encomendada por um dos mais importantes organismos do Brasil na defesa dos direitos e do bem viver da criança, o Instituto Alana, feita com 2.074 pessoas em 130 municípios, indicou que 86% dos entrevistados avaliam que “as escolas ficam melhores quando incluem alunos com deficiência”.
Com margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos, o levantamento foi realizado entre 10 e 15 de julho deste ano e contou com dez perguntas cujas respostas foram estimuladas por meio de um cartão entregue aos entrevistados para serem escolhidas.
Outros pontos considerados positivos à escola inclusiva na pesquisa foram que 76% dos entrevistados “acham que a criança com deficiência aprende mais ao lado de crianças sem deficiência” e 68% que se disseram contrários à afirmação de que “a criança com deficiência em sala atrasa o aprendizado das sem deficiência”.
Embora seja o modelo vigente e esteja sendo aplicado em todo o país, a escola inclusiva ainda enfrenta resistência, sobretudo entre organizações e famílias de pessoas com limitações intelectuais mais graves, que alegam faltar preparo ao professor e aos colégios para atender a esse público de forma satisfatória, além de dar a ele segurança e acolhimento adequados.
Rotineiramente, projetos de lei surgem no Congresso com o intuito de criar exceções ou propagados “aperfeiçoamentos” nas escolas onde todos estudam juntos —crianças com e sem deficiência.
As medidas tratam da abertura de salas especiais dentro de colégios, oferta de ensino institucionalizado ou ainda de abertura de possibilidade aos pais de educar seus filhos com deficiência em casa.
Não raro também acontecem a propagação de denúncias de bullying envolvendo
crianças com deficiência dentro das escolas regulares, o que motiva indignação e revolta de grupos que defendem um modelo com mais proteção a esse público.
Dos entrevistados, 67% apontam “falta de formação do professor para tratar com o aluno com deficiência”.
Ao mesmo tempo, os pesquisados não consideram que haja resistência à inclusão, uma vez que 71% acham que “o professor tem interesse em ensinar o aluno com deficiência”.
Para Raquel Franzi, coordenadora da área de educação do Instituto Alana, um dos desafios atuais mais importantes em relação à educação da criança com deficiência é não retroceder no modelo estabelecido, que é também o aplicado em outras várias partes do mundo.
“Além de tentar garantir o acesso da criança com deficiência à escola, temos de tentar evitar o retrocesso que é o não direito à educação inclusiva”, afirma.
“É um desafio constante dar visibilidade a experiências positivas que acontecem em todo o país, mostrar que uma concepção protetiva e segregada de escola não é um caminho.”
Atualmente, a Lei Brasileira de Inclusão determina pena de reclusão a gestores de escolas que neguem matrícula a um aluno com deficiência.
A alegada dificuldade de condições das escolas em poder atender a todos também tem reflexos na pesquisa, quando 37% do entrevistados dizem que “concordam que a escola pode escolher se matricula ou não uma criança com deficiência”.
De acordo com Rodrigo Hübner Mendes, fundador e diretor executivo da Fundação
Rodrigo Mendes —que, entre outras missões, oferece gratuitamente ferramentas práticas para que o professor ensine alunos com deficiência com demandas específicas—, os dados da pesquisa convergem com a observação das várias redes de ensino onde a instituição atua.
“Por um lado, [a pesquisa mostra] extraordinário amadurecimento da sociedade civil sobre o direito das pessoas com deficiência à educação em escolas comuns, acompanhado da percepção de que todos saem ganhando quando a escola abraça a diversidade humana”, afirma ele.
“Por outro lado, o estudo reforça o que várias outras pesquisas vêm revelando: formação sobre esse tema é uma das demandas prioritárias manifestadas pelos professores que estão em sala de aula.”
Para o Alana, um dos preceitos científicos que fortalecem a adoção da escola inclusiva, o que comprova que o benefício da inclusão tem repercussões em todo o ambiente escolar, principalmente nos alunos sem deficiência, aparece na pesquisa Datafolha, mesmo que de forma indireta.
De acordo com o levantamento do instituto, 68% dos entrevistados se declaram contrários à afirmação de que a “criança com deficiência em sala atrasa o aprendizado das sem deficiência”.
Além disso, 93% dos entrevistados que convivem com pessoas com deficiência na escola são “favoráveis à ideia de que as escolas se tornam melhores ao incluir crianças com deficiência”.
Conforme explica Raquel Franzi, para a criança sem deficiência, a interação com a diversidade física, sensorial e intelectual promove melhoria no desempenho acadêmico, sobretudo em linguagem e matemática, aumento da habilidade de resolução de problemas, ampliação da disposição para tarefas
Já para a criança com deficiência, além de benefícios parecidos com os das crianças típicas, ela aponta “promoção de independência e autonomia, maior participação da vida em sociedade, nas ruas e no trabalho”.
“Esses dez anos de educação inclusiva no Brasil já demonstram um enorme avanço. As gerações atuais já acessam pessoas com deficiência na escola, no trabalho, na vida social e vemos pessoas com deficiência concluindo o ensino médio, ingressando no ensino superior, tomando decisões. Os efeitos são transformadores e reais.”
Os exemplos mais bem-sucedidos de escolas inclusivas no Brasil são os que contam com o envolvimento de toda a comunidade escolar, em parceria com famílias e grupos de apoio à inclusão.
Cabe ao poder público e às próprias escolas fornecerem condições e instrumentos adequados de aprendizado, interação e permanência desse público em sala de aula.
Da FSP