Dinheiro público alimenta guerra entre Joice e Bolsonaros

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Ex-líder do governo no Congresso, a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) utiliza dinheiro de sua cota parlamentar para pagar uma empresa que gerencia suas redes sociais, usadas como armas na guerra digital que trava com os filhos do presidente Jair Bolsonaro.

A EG Consult, sediada no Rio de Janeiro, recebe R$ 2.500 mensais da verba pública para, entre outras tarefas, administrar um grupo de WhatsApp em que a deputada rebate acusações de traição e critica adversários.

Joice tem denunciado o uso de uma estrutura sediada no Palácio do Planalto para coordenar “milícias digitais” usadas contra desafetos do governo. Ela diz que essa rede, que passou a tê-la como alvo e seria chefiada pelos filhos de Bolsonaro, teria 20 perfis no Instagram alimentando uma rede de cerca de 1.500 páginas.

A proprietária da EG Consult, Elisa Gomes de Oliveira de Morais, é administradora e criadora do grupo de WhatsApp “Joice, eu apoio!”, parte da estrutura de comunicação da deputada. Mensagens enviadas para o grupo são respondidas de forma automática com a assinatura “Atendimento JH”.

Esse serviço não aparece discriminado nas notas fiscais emitidas até o mês passado pela EG Consult para receber o dinheiro da cota da deputada. As notas citam “geração de materiais de ordem gráfica e multimídia, gerenciamento, atendimento e suporte aos usuários das plataformas de comunicação utilizadas pela deputada federal”, e mencionam Facebook, Instagram, YouTube e Twitter.

A cota parlamentar é uma verba da Câmara criada para custear despesas do mandato. Entre os gastos previstos está “divulgação da atividade parlamentar”, segundo ato da Mesa Diretora da Câmara de 2009, que regulamentou o uso dos recursos.

O conteúdo das redes sociais de Joice, no entanto, inclui mais do que a exposição de sua atividade como deputada. Textos e vídeos com ataques a opositores são frequentes.

O mesmo ocorre com o grupo de WhatsApp gerenciado por Morais. Nos dias seguintes à sua destituição do cargo de líder, a administradora postou: “Joice nunca traiu o governo. Isso é discurso de quem é membro do Gabinete do Ódio”.

A referência é a uma estrutura com três assessores da Presidência —Tercio Arnaud Thomaz, 31, José Matheus Salles Gomes, 26, e Mateus Matos Diniz, 25— que seriam parte da chamada “milícia digital”.

Em outro diálogo, Morais reage a um membro do grupo que chama Joice de “traidora disfarçada de justiceira”. “Não existe nenhuma traidora aqui. Que saiam [do grupo] todos os fakes e MAVs”, disse ela, em referência à sigla para Militância em Ambientes Virtuais.

A administradora também postou um banner com texto em que Joice diz: “Os filhos dele [Bolsonaro] estão induzindo ele ao erro constante e enterrando o governo. Vou proteger o presidente até mesmo dos próprios filhos. Sigo lutando pelo Brasil”.

O contrato com a Eg Consult foi assinado no mês de junho. Segundo a deputada, a razão foi a necessidade de prestar contas do mandato e ouvir as pessoas que a procuram.

EMPRESA NÃO TEM RELAÇÃO COM ESSE CONTEÚDO, DIZ DEPUTADA
“São milhões de seguidores e cidadãos que precisam ser atendidos, de modo que eu, sozinha, infelizmente não tenho condições de atender a todos”, afirmou a deputada federal Joice Hasselmann, por meio de nota.

Segundo a parlamentar, as postagens em redes sociais que são ataques a adversários são de sua responsabilidade. “Se eu for atacada, irei rebater. A empresa não tem nada a ver com esse tipo de conteúdo”, declarou.

Isso não se aplica ao grupo de WhatsApp, no entanto, em que os textos são de responsabilidade da proprietária da EG Consult, Elisa Morais, segundo registros obtidos pela Folha.

De acordo com a parlamentar, a ação da empresa contratada por seu gabinete não tem semelhança com a milícia virtual que ela denuncia.

“Estamos falando de uma empresa regulamentada que presta serviços, que tem CNPJ, que emite notas fiscais. […] A milícia digital atua por baixo dos panos, são perfis fakes que fingem não estar vinculados a determinadas pessoas e que espalham discurso de ódio”, afirma.

A Folha não conseguiu contato com Elisa Morais, dona da Eg Consult.

Folha