Governador de SC ataca agrotóxicos e irrita bolsonarismo

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Foto: Governo SC

O governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), decidiu criar uma regra pela qual o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pode variar dependendo do volume de agrotóxicos usado por agricultores – o uso restrito desses produtos garantiria alíquotas menores do imposto. A “tributação verde”, que vai na contramão de ações recentes do governo federal na área ambiental, tem causado atritos entre o governador e os setores bolsonaristas que o ajudaram a ser eleito.

Em carta, a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc), setor que representa 30% da economia local, afirma que a medida “leva pânico” ao setor e é “reflexo da ignorância” de Moisés, que agiria de acordo com suas “pueris convicções pessoais”.

“Esse discurso é próprio de quem nunca colocou o pé na zona rural, não tem a mínima noção do que vem a ser a atividade agrícola”, afirma a Faesc.

O empresário catarinense Luciano Hang, um dos mais próximos colaboradores de Bolsonaro, foi às redes sociais para comparar a política de Moisés às políticas dos partidos de esquerda. “Não faltava mais nada. Ideologias de esquerda sendo implantadas no Estado mais liberal do Brasil. Os catarinenses votaram no verde-amarelo e estão vendo nascer o vermelho em Santa Catarina? Parecem politicas do PSOL ou do PCdoB”, escreveu Hang.

O projeto de “tributação verde” acaba com o subsídio integral de ICMS para insumos agrícolas concedido hoje. Segundo a proposta, que ainda não foi votada pela Assembleia Legislativa, serão criadas quatro faixas.

Os produtos altamente tóxicos serão enquadrados na faixa vermelha, sem direito à redução na alíquota de 17%. A faixa amarela abrigará os produtos moderadamente tóxicos, com tributação de 12%. Na faixa azul estarão os pouco tóxicos, com carga de 7%, e aqueles improváveis de causar dano agudo, com 4,8%. A estimativa é que cerca de 80% dos agrotóxicos utilizados em Santa Catarina estejam na faixa azul.

A acusação contra Moisés de agir de forma “ideológica” tem sido frequente também em função da defesa que ele faz dos alimentos orgânicos. Empresários do setor agropecuário dizem que o governador ignora o impacto que a tributação vai ter principalmente no setor pecuário, já que grande parte da produção agrícola catarinense é voltada para o plantio de alimentos para o gado. Santa Catarina é hoje o maior produtor de carne suína e o segundo maior de carne de frango do Brasil.

“Infelizmente, o povo elegeu um governador ideológico que ninguém conhecia e agora nos vira as costas. O setor agrícola está revoltado”, diz o vice-presidente da Faesc, Emori Barbieri.

A entidade fará pressão sobre os deputados estaduais, muitos deles com base eleitoral nas regiões agrícolas, para que o projeto seja barrado na Assembleia. Caso contrário, deve recorrer ao governo Bolsonaro por meio da ministra da Agricultura, Tereza Cristina.

Moisés, que até o ano passado era um integrante do Corpo de Bombeiros praticamente anônimo, foi eleito em primeiro turno na esteira da onda conservadora que levou Bolsonaro à Presidência da República. Santa Catarina foi o Estado onde o presidente teve a maior votação proporcional – 71%.

Divergências

Depois da posse, Moisés passou a demarcar diferenças em relação ao governo federal, adotando um tom considerado por aliados como mais conciliador e se deslocando em direção ao centro político na discussão de pautas.

“É importante que as pessoas entendam que não estamos taxando o agronegócio e, sim, o agrotóxico. Assumi esse compromisso como governador, como cidadão e como pai. Precisamos construir um Estado melhor para quem vive em Santa Catarina e para as gerações futuras.”, disse Moisés ao Estado (mais informações nesta página). Apenas nos primeiros nove meses de gestão Bolsonaro foram aprovados mais de 300 tipos de agrotóxicos.

4 perguntas para Carlos Moisés

1. Qual o objetivo da “tributação verde?”

O modelo objetiva, sobretudo, promover a saúde pública e a preservação ambiental. É uma política inovadora e uma legislação pioneira no País. Embora Santa Catarina tenha largado na frente, a “tributação verde” é uma questão nacional e, mais cedo ou mais tarde, também será discutida pelos demais Estados.

2. O sr. sofreu pressão da direção do PSL para abandonar a proposta?

Nenhuma pressão. Essa política foi desenvolvida por técnicos altamente capacitados do governo e se baseia em resolução da Anvisa que dispõe sobre a rotulagem de produtos químicos usados na agricultura de acordo com os riscos e a toxicidade de cada um.

3.A Faesc afirma que o setor foi “traído”.

Reações nesse sentido eram esperadas e, por isso, o governo sempre esteve aberto ao diálogo. Estendemos o período de isenção fiscal até o dia 31 de dezembro. Foi uma condição necessária para que os agricultores possam ter o período de safra para a adaptação com as novas regras. Não se trata de proibir o uso de agrotóxicos, mas de não estimular e reduzir o uso.

4. O sr. foi procurado pelo presidente Bolsonaro ou algum ministro para falar sobre o assunto?

Temos o governo federal como um grande parceiro dessa gestão e estamos alinhados com o presidente. Santa Catarina nunca recebeu tantos ministros em tão curto espaço de tempo. Temos contempladas algumas demandas importantes para os catarinenses, com o apoio do governo federal. Portanto, temos recebido muitos ministros, porém, nenhum para tratar desse tema.

Estadão