Peru: vice renuncia à presidência interina

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A vice-presidente do Peru, Mercedes Aráoz , renunciou nesta terça-feira, um dia depois de ser empossada pelo Congresso para substituir interinamente Martín Vizcarra na Presidência do país. Na mesma carta em que abdicou do cargo, Araóz defendeu a antecipação de eleições gerais e afirmou que a razão “fundamental” de sua decisão é que “a ordem constitucional do Peru foi quebrada”. A decisão de Aráoz, que renunciou não só ao cargo de presidente interina como ao de vice-presidente, representa um revés para os parlamentares rebeldes, que resistem à dissolução do Congresso determinada por Vizcarra.

“Espero que minha renúncia conduza à convocação de eleições gerais no menor prazo possível para o bem do país”, tuitou Araóz. “Declino do cargo conferido ao renunciar ao cargo de vice-presidente constitucional da Republica.”

Em um documento direcionado ao presidente da Comissão Permanente do Congresso, Pedro Olaechea, a ex-vice-presidente diz que depois de a Organização dos Estados Americanos (OEA) afirmar que cabe ao Tribunal Constitucional do país se pronunciar sobre a constitucionalidade na dissolução do Congresso, “não há condições mínimas para o exercício da missão que me foi dada pelo Parlamento”.

O mais recente capítulo da crise política peruana teve início da segunda-feira, quando Martín Vizcarra dissolveu o Parlamento, dominado pela oposição fujimorista, e convocou eleições legislativas antecipadas para 26 de janeiro de 2020. A medida do presidente peruano, que assumiu o poder em 2018, foi motivada pela recusa parlamentar de modificar o processo de escolha dos juízes do Tribunal Constitucional, a Suprema Corte peruana.

Como justificava legal para a medida, Vizcarra recorreu ao mecanismo constitucional que afirma que o Executivo pode dissolver o Legislativo e antecipar eleições se tiver rejeitada pelo menos duas vezes uma “questão de confiança”, seja pela rejeição respaldo ao seu gabinete, a um projeto de lei ou política governamental.

Em resposta, o Congresso aprovou a suspensão temporária por 12 meses do presidente por “incapacidade temporária”, com os votos de 86 dos 130 deputados da Casa. Aráoz, então, tomou posse diante dos parlamentares rebeldes num Parlamento já dissolvido. Vizcarra não reconheceu a decisão, recebendo o apoio das cúpulas das Forças Armadas e da polícia do Peru. Além disso, nenhum país ou instituição reconheceu Aráoz como presidente.

O anúncio de Aráoz pegou muitos de surpresa. Pedro Olaechea, o recém-destituído presidente do Congresso, dava uma entrevista à CNN Español quando o repórter da emissora leu a carta de demissão de Aráoz para ele, parecendo deixá-lo sem palavras por um momento.

Com Aráoz fora, uma influente ex-parlamentar, Rosa Maria Bartra, disse que, na visão da oposição, Olaeachea deveria assumir a Presidência interina e supervisionar a transição para novas eleições gerais. A maioria dos peruanos apoia a dissolução do Parlamento, de acordo com uma pesquisa recente, e milhares de simpatizantes de Vizcarra saíram às ruas na segunda à noite para apoiar o presidente.

Manobra política
Ao dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, Vizcarra buscava garantir que o atual Congresso, dominado pela oposição da Força Popular, de Keiko Fujimori, indicasse quase a totalidade do Tribunal Constitucional. Derrotada nas eleições presidenciais de 2016, a filha do ex-presidente Alberto Fujimori está presa e sob investigação por sua ligação com o escândalo de corrupção envolvendo a empreiteira brasileira Odebrecht.

O governo havia apresentado uma “questão de confiança” para votação no Congresso de seu projeto que buscava alterar o processo de escolha dos integrantes do Tribunal Constitucional. A escolha dos membros é uma atribuição do Parlamento, mas o presidente defende que seu objetivo era deixar a escolha mais transparente. Na prática, porém, sua apreciação forçaria uma interrupção do atual processo de substituição dos integrantes da Alta Corte.

Segundo o presidente, essa foi a terceira vez que o Congresso lhe negou uma “questão de confiança”: ao rejeitar um projeto de reforma política apresentado por ele e ao rejeitar na prática a mudança no processo de escolha dos juízes do Tribunal Constitucional, já que os congressistas começaram na segunda a indicar integrantes da corte.

A crise política no Peru começou a ser gestada há três anos, quando o banqueiro Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018) derrotou, por uma margem muito estreita, Keiko Fujimori. Embora tenha perdido a Presidência, o partido da primogênita de Alberto Fujimori ganhou uma esmagadora maioria no Congresso. Com isso, manteve a pressão sobre Kuczynski até forçá-lo a renunciar em março de 2018. PKK, como é chamado, foi substituído por Vizcarra, que era seu primeiro-vice-presidente. Mercedes Aráoz era a segunda.

De O Globo