Desmatamento: investidores resistem ao Brasil
A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, ouviu ontem em Washington diversas perguntas sobre os problemas na Amazônia em reuniões com autoridades e investidores. O aumento recorde de 29,5% do desmatamento na floresta brasileira entre agosto de 2018 e 31 de julho deste ano, segundo dados do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, ofuscou o objetivo da viagem: convencer os americanos a retomar a importação da carne brasileira in natura. Se, no passado, o que fechava o mercado eram questões sanitárias, agora questões ambientais chamam a atenção.
Durante palestra no Instituto Brasil do Wilson Center, a ministra defendeu a política ambiental do país:
— O Brasil conta com uma das legislações ambientais mais exigentes do mundo. Nosso Código Florestal exige que os produtores rurais destinem parte da sua propriedade para preservação. Dito de outra forma, eles não podem produzir nesta área. Na Amazônia, por exemplo, 80% da área de uma propriedade são destinados à preservação.
VEREADORES
Paralelamente à visita da ministra, vereadores de Los Angeles e de Nova York iniciaram discussões para aprovar leis que proíbam aos dois mais populosos municípios dos EUA a compra de produtos de empresas que possam ser relacionadas a incêndios florestais e desmatamento da Amazônia.
— Assim como a perda de árvores na Amazônia pode agravar as mudanças climáticas na cidade de Nova York ou Los Angeles, podemos adotar uma postura contra as empresas cujas práticas provocaram esses problemas — afirmou à rede CBS Costa Constantinides, vereador de Nova York.
Segundo especialistas, este movimento de boicote, que já havia tido uma primeira onda com o aumento das queimadas na Amazônia no começo do ano, pode se agravar.
— As restrições a produtos brasileiros, sobretudo carne, têm sido por meio de padrões privados. As notícias sobre desmatamento podem acelerar esta tendência — disse Welber Barral, sócio da BMJ Consultores, que continua: — Para resolver isso, é necessário esforço coletivo, do governo e das empresas exportadoras.
Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda e da Unctad, avalia que o desmatamento recorde é ainda mais grave que a questão dos incêndios por consolidar uma tendência:
— Apesar do anúncio espetacular de mandar as Forças Armadas, nada se fez de sério. Há o risco real de impacto nas exportações em um momento de alta do dólar.
BALANÇA COMERCIAL
No ano, a balança tem superávit de US$ 34,8 bilhões, 26,7% a menos que em igual período do ano passado.
Um relatório da agência de classificação de risco Fitch, de 11 de novembro, já alertava para o impacto de um eventual boicote à carne brasileira. “O considerável aumento dos incêndios florestais na região amazônica em 2019 e a forte repercussão negativa internacional expõem o potencial risco comercial que fatores ambientais, sociais e de governança causam ao setor brasileiro de proteínas”, afirmou o texto.
A agência lembra que isso pode afetar a relação com os europeus. A Áustria já evocou questões ambientais para se opor ao acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. “O desmatamento da Amazônia pode causar danos de reputação aos frigoríficos brasileiros, levando à redução de suas exportações”.
Marcos Jank, professor do Insper que acompanha a viagem da ministra minimiza o risco de impacto econômico, em razão da alta demanda por proteínas, puxada pela China, mas avalia que, a longo prazo, a piora de imagem pode afetar produtos como carne e soja.
Procurado, o ministério disse que não faria comentários adicionais.