Aliados de “Moro de saias” desafiam STF
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
A cúpula do Senado tenta costurar uma saída para a encruzilhada criada pela resistência em cumprir imediatamente a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de cassar o mandato da senadora Selma Arruda (Podemos-MT). A Justiça Eleitoral já marcou o pleito no Mato Grosso que escolherá o novo dono da cadeira na Casa para 26 de abril. Enquanto isso, o rito estabelecido pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para decidir sobre o caso pode se arrastar por mais um mês e meio, até o fim de março. Além de dar uma sobrevida à parlamentar, a decisão implica em não convocar agora para um mandato tampão o terceiro colocado na eleição, Carlos Fávaro (PSD), descumprindo decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli.
Não há consenso sobre o assunto entre os sete integrantes da Mesa Diretora. Selma precisa de quatro votos para manter o mandato. Em conversas reservadas, seus aliados tentam convencer Alcolumbre a enfrentar o TSE, mantendo a senadora no cargo. O julgamento final ocorreu em dezembro do ano passado. A decisão foi pela cassação imediata dela e de seu suplente, Gilberto Possamai, por abuso de poder econômico e caixa dois, independentemente de eventuais recursos. Eles são acusados de receber R$ 1,2 milhão entre abril e julho de 2018, valores que não foram declarados. Os defensores de Selma alegam que é injusto tirá-la do Senado antes que o caso seja resolvido na última instância possível, o Supremo Tribunal Federal (STF), e querem que Alcolumbre banque essa posição.
O GLOBO procurou nos últimos dias os sete integrantes da Mesa. Além do próprio Alcolumbre, ela é composta por dois vice-presidentes — Antonio Anastasia (PSDB-MG) e Lasier Martins (Podemos-RS) e quatro secretários — Sérgio Petecão (PSD-AC), Eduardo Gomes (MDB-TO), Flávio Bolsonaro (Sem partido-RJ) e Luis Carlos Heinze (PP-RS). Apenas dois deles se posicionaram claramente sobre o caso: Lasier Martins contra a cassação de Selma, e Petecão a favor.
Aliados de Alcolumbre lembram que ele tem evitado se indispor com o Judiciário e negam a perspectiva de a Mesa enfrentar a decisão. Para eles, ao estabelecer um rito para o caso, o presidente só quis evitar indisposição com colegas que defendem Selma, alegando que deu oportunidade para que ela se defenda.
Para Lasier Martins (Podemos-RS), correligionário da parlamentar, houve uma “represália violenta” contra ela por sua atuação como juíza no estado. Quando era magistrada titular da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, Selma mandou prender políticos influentes em Mato Grosso, incluindo o ex-governador Silval Barbosa (MDB). Ela era chamada de “Moro de saia”. Lasier defende protelar ainda mais a decisão, desmarcando a reunião da Mesa na próxima terça no aguardo que o STF se pronuncie sobre o caso.
— Estamos em um dilema triste. Descumprir a decisão de outro Poder é antidemocrático. Não consigo atinar o que a Mesa pode decidir, mas vou defender a posição de protelar (o rito) e pedir urgência ao STF —disse o senador.
A previsão é de escolha do relator na terça-feira. Lasier não poderá ser o relator porque é do mesmo partido de Selma. Os dois fazem parte do grupo Muda Senado, que reúne cerca de 20 parlamentares de diferentes siglas com o discurso de adotar uma “nova política” que privilegie demandas como o combate à corrupção. Uma das principais bandeiras do grupo é a defesa da prisão imediata de condenados em segunda instância. Outros senadores do Muda Senado, como Alvaro Dias (Podemos-PR) e Major Olímpio (PSL-SP), também defendem Selma e reclamam que a Justiça foi “célere” no caso dela supostamente por perseguição política à senadora.
Primeiro secretário da Mesa, Petecão é crítico à resistência do Senado em cassar o mandato imediatamente:
— Não dá mais para empurrar com a barriga. É querer comprar uma briga (com a Justiça) sem necessidade. Tem que cumprir o que manda a Constituição.
O senador é do partido de Carlos Fávaro (PSD), que conseguiu liminar do presidente do STF, Dias Toffoli, em 31 de janeiro, para assumir a vaga de Selma até a nova eleição no Mato Grosso, em abril.
Anastasia disse que não comentará o caso. Flávio Bolsonaro não retornou o contato do GLOBO. Sua indisposição com a senadora se tornou pública no ano passado, quando Selma deixou o PSL alegando ter sido pressionada pelo filho do presidente Jair Bolsonaro a retirar sua assinatura do pedido de criação da CPI dos Tribunais Superiores. Heinze não foi encontrado para comentar o caso e Gomes disse que aguardará a reunião da Mesa para se decidir.
Selma Arruda disse ontem que, por ora, não se pronunciará. No ano passado, a senadora se defendeu dizendo que é vítima de uma injustiça. A colegas de partido, disse que continuará frequentando o Senado até que a Mesa decida o seu futuro. A sites do Mato Grosso, comentou que pode voltar à advocacia. Selma disse ainda que atuará em uma fundação do Podemos.
Na berlinda desde que assumiu, a senadora usou verba pública para pagar sites do Mato Grosso que publicaram notícias positivas sobre ela. Em 2019, gastou R$ 130,1 mil com “divulgação de atividade parlamentar”. Os valores repassados variaram entre R$ 2 mil e R$ 5 mil. Os sites Muvuca Popular, Olhar Digital e Mídia News foram os que mais receberam. Procurados, os sites não se manifestaram. A assessoria da senadora também não respondeu aos questionamentos sobre o tema.