Entrevista do presidente da CPMI das fake news
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, o senador Ângelo Coronel (PSD-BA) admite a contaminação política que se espalhou no colegiado, mas acredita que as investigações mobilizaram as plataformas de redes sociais a estudarem mecanismos para coibir perfis falsos, disseminação em massa de fake news e, neste ano, o controle será mais rigoroso. Ele fala, ainda, sobre o depoimento de Hans River, acusado de fazer disparos em massa, em 2018, e dos ataques dele à jornalista Patrícia Campos Mello. Confira os principais trechos:
Valor: O senhor considera que as apurações da CPMI das Fakes News poderão colaborar para coibir ou prevenir a desinformação nas eleições?
Senador Ângelo Coronel: Após a instauração da CPMI, as plataformas começaram a se movimentar. Ontem mesmo eu recebi aqui a diretoria do Facebook, onde já estão criando crivos para banir conteúdos falsos. Questionei que é muito relativo o conteúdo ser falso ou não, e dei a sugestão para eles colocarem tarjas de “conteúdo duvidoso” em algumas publicações, até que uma agência de checagem verificasse a veracidade. Já apresentei dois projetos de lei. Um é para que quando uma pessoa for habilitar um chip numa operadora ela deve estar presente na loja e precisa apresentar o CPF. Há muitas denúncias de pessoas que habilitam chips com CPFs falsos, ou de pessoas mortas. Hoje você habilita um chip na internet com qualquer CPF. Quero que exijam a presença da pessoa com seu CPF.
Valor: E sobre o outro projeto?
Coronel: Aí é para as redes sociais. Para ter um perfil, o cidadão precisa se identificar. Hoje as pessoas não se identificam, só criam um e-mail. Pode ser um criminoso digital. As plataformas devem exigir CPF da pessoa, checar se está ativo, fazer recadastramento de usuários e banir os perfis falsos. Não é censura. É proteção.
Valor: Dificilmente os debates da CPMI então devem refletir em algo para o período eleitoral deste ano.
Coronel: Acredito que não, até porque a CPMI vai até abril, se não houver prorrogação.
Valor: Mas algo do relatório e desses debates da comissão podem contribuir com a Justiça Eleitoral?
Coronel: O depoimento de Hans River foi talvez o mais importante até então, porque ele mostrou o modus operandi, como funcionaram milhões de disparos em massa para vários candidatos nas eleições passadas. Montaram um bunker gigantesco, segundo ele, em São Paulo, com dezenas de pessoas trabalhando 24 horas, soltando mensagens em massa para desconhecidos. Conseguiram uma base de dados e soltavam mensagens falsas. Já conversamos com o WhatsApp e eles estão tentando, ao máximo, reduzir esse tipo de envio. Quando um chip sair da normalidade, eles vão bloquear. Com certeza vamos evitar muitos disparos nestas eleições.
Valor: Em seu depoimento, Hans River atacou e fez insultos à jornalista Patrícia Campos Mello, o que foi repudiado por profissionais da comunicação e segmentos da sociedade. A “Folha de S.Paulo” divulgou documentos que comprovam a lisura da repórter no contato com o depoente, acusado de propagar fake news. A CPMI investiga também essa onda de ódio na internet e ele vai lá, faz uma declaração falsa, num depoimento. O que pode ser feito?
Coronel: Achei um absurdo o depoente atacar a jornalista, e principalmente porque ele não apresentou nenhuma prova material [sobre a acusação de que a repórter teria tentado seduzi-lo para obter informações]. Se a jornalista estivesse lá no momento e provasse que ele estava mentindo, eu poderia dar voz de prisão a ele. Tenho essa prerrogativa. Mas como não houve acareação, a gente não podia comprovar, na hora, se ele estava falando verdade ou mentira. O papel dela, como cidadã, é entrar com um processo. No relatório final vamos dar o indicativo de pessoas que merecem ser indiciadas. Se a Patrícia em sua defesa provar que ele mentiu e que ele tentou deturpar e depreciar a imagem dela, não tenho dúvida que ele será alvo de indiciamento criminoso.
Valor: A CPMI foi criticada por ter vários objetos de investigação, desde desvirtuamento das eleições a cyberbulling. Foi um erro?
Coronel: O requerimento inicial, de fato, ficou muito grande, muitos itens problemáticos. Em função das eleições de 2018, a gente vê que 90% das ações na CPI são dos deputados que defendem o governo Bolsonaro e os que acusam Bolsonaro. Ou seja, são os que acham que Bolsonaro se elegeu pelo envio de mensagens de massa e os que defendem que Bolsonaro não fez isso. Estamos na metade da comissão, tentando mudar o foco para essa área de saúde, muito importante, onde há os criminosos que passam informações falsas para a sociedade, como foi o caso do sarampo, coronavírus.
Valor: Há um debate sobre liberdade de expressão e propaganda na internet. O que pode clarear a diferença entre apoio político e disseminação de conteúdos falsos?
Coronel: A Constituição permite a crítica. O que não permite é o anonimato. É liberdade de expressão, liberdade de imprensa, a Constituição protege qualquer cidadão. O que é vedado é depreciar um alvo, com perfil falso. Não é censura. É proteger as pessoas. Você pode acabar com reputações com mensagem falsa. Aprovamos em 2019 um projeto, para a classe política, em que se um adversário critica o outro, com difamação pesada, comprovada, terá uma penalidade, prisão de 2 a 8 anos. Temos que estender isso para toda a sociedade. Temos que fazer com que as eleições sejam disputadas de forma limpa e que o povo eleja os candidatos honestamente, com liberdade, não por indução, ou porque alguém foi difamado e você passa a acreditar nisso. Quando lá na frente prova que é mentira, já perdeu a eleição. A mentira desequilibra qualquer pleito eleitoral.