
Nova golden shower bolsonarista gera crise institucional
Foto: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
O presidente Jair Bolsonaro retorna da folga no Guarujá (SP) com o desafio de equalizar as divergências internas na equipe e resolver o impasse com o Congresso. Ao mesmo tempo em que a ala militar, fortalecida no Planalto, intensificou as cobranças sobre o desempenho do ministro da Economia, Paulo Guedes, a irritação do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, com os parlamentares elevou a tensão entre governo e Legislativo e desencadeou a convocação de novos protestos.
Movimentos liderados por apoiadores de Bolsonaro disseminam nas redes sociais a convocação para que a população saia às ruas no dia 15 de março para protestar contra o Congresso e em defesa do presidente da República. “Chega de chantagistas, Dia do Basta!”, diz um dos cartazes virtuais, que ecoa a fala do general Augusto Heleno. “Nós não podemos aceitar esses caras [parlamentares] chantagearem a gente o tempo todo”, reclamou o ministro em uma conversa que acabou vazada nas redes oficiais.
Outro post com as imagens de Heleno e do novo chefe da Casa Civil, Braga Netto, afirma que os generais estão convocando os brasileiros para as ruas. “Vamos às ruas em massa. Os generais aguardam as ordens do povo. Fora Maia e Alcolumbre”. O movimento conta com a adesão de parlamentares próximos a Bolsonaro, como Carla Zambelli (PSL-SP), General Peternelli (PSL-SP) e Eder Mauro (PSD-PA).
Na noite de domingo, um vídeo em apoio à manifestação teria sido compartilhado pelo próprio presidente por WhatsApp, segundo divulgou o site do jornal “Estado de S.Paulo”. A informação também foi veiculada nas redes sociais por militantes bolsonaristas, como o empresário Winston Ling. O suposto disparo do WhatsApp presidencial já repercutia ontem à noite. “Estamos com uma crise institucional de consequências gravíssimas”, comentou no twitter o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Contudo, um interlocutor disse ao Valor ter tratado do assunto com Bolsonaro, e o presidente lhe assegurou que se trata de “um fake”. Segundo esta fonte, próxima do presidente, é falso que Bolsonaro teria disparado a mensagem com o vídeo para grupos de seus apoiadores.
Um vídeo diferente, também em defesa do ato, foi veiculado pelo presidente pelo WhatsApp há alguns dias, segundo confirmou ao Valor o ex-deputado Alberto Fraga. O ex-parlamentar, considerado um dos políticos mais próximos ao presidente, ressalta que Bolsonaro não lhe pediu que divulgasse o vídeo nem fez qualquer comentário adicional ao encaminhamento.
Ele admite, entretanto, que a informação de que Bolsonaro divulgou um vídeo convocando as pessoas para as manifestações complica mais a relação institucional com o Congresso, num momento em que o Planalto busca um acordo para evitar a derrubada de um veto que limita o controle dos parlamentares sobre o Orçamento. “É ruim, é muito chato”, disse Fraga. “Mas ele não incentivou ninguém a fazer os protestos e não se manifestou para colocar o Executivo contra o Legislativo”, afirma.
Guedes colocou-se ao lado de Heleno na controvérsia com o Legislativo, em solenidade no Planalto na última quinta-feira. “É normal o Congresso querer entrar no Orçamento, mas não precisa pisar no nosso pé”, disse o ministro.
Integrantes do Planalto acabaram surpreendidos com a reação dos apoiadores e a avaliação é que esse movimento afetará o acordo costurado entre o Planalto e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre os vetos presidenciais ao projeto que limita o controle do governo sobre o Orçamento. O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, disse ontem ao Valor que se reunirá hoje com Bolsonaro para discutir o assunto e que já não sabe se será possível manter o trato.
“O presidente estava comigo na praia e eu não vi ele mandando nada [comando sobre manifestações] em nenhum momento”, disse o ministro, segundo quem não há “o dedo” de Bolsonaro na mobilização. “Tem deputado pedindo para o presidente dizer para as pessoas não se manifestarem. Ele não vai fazer isso”, completou.
O trato com o Congresso abriu uma divisão na base do governo e gerou divergências entre alguns dos principais auxiliares de Bolsonaro. Pai do acordo, Ramos ficou sob pressão desde quando se tornou pública a insatisfação dos ministros Paulo Guedes e Heleno com o acordo.
“Está tendo uma histeria coletiva. Estão me colocando como o general do Congresso e o Heleno como o general do Bolsonaro, e isso não tem nada a ver”, queixou-se Ramos ao Valor sobre as convocações para os protestos. “Nós já não sabemos o que vamos mandar depois dessa confusão dos memes”, disse, referindo-se ao alastramento do chamado às manifestações pelas redes sociais.
No diálogo que veio a público, Heleno queixava-se com Guedes dos termos do acordo com o Congresso. Guedes vinha demonstrando insatisfação com a coordenação política. Segundo um interlocutor de Guedes, o titular da Economia queixou-se da perda do timing para o envio de projetos relevantes do governo para o Congresso. O exemplo mais recente foi a reforma administrativa.