Bolsonaro distorce fala de diretor-geral da OMS
Foto: Pablo Jacob/Agência O Globo
Na tentativa de validar o próprio discurso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) distorceu uma entrevista do diretor-presidente da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Ghebreyesus, e insinuou hoje que a entidade estaria alinhada às críticas ao isolamento social, medida necessária para combater o alastramento do coronavírus.
A reclusão tem sido recomendada pelas autoridades de saúde em todo o planeta e apontada como ação essencial de enfrentamento da doença que já matou 159 pessoas no Brasil e deixou milhares de vítimas no mundo. Ontem (30), Ghebreyesus afirmou que, além da preocupação com a saúde, “os governos precisam garantir o bem-estar das pessoas que perderam sua renda”.
“Cada indivíduo é importante, cada indivíduo é afetado pelas nossas ações. Qualquer país pode ter trabalhadores que precisam trabalhar para ter o pão de cada dia. Isso precisa ser levado em conta.”
No entanto, na mesma entrevista, o diretor-presidente da OMS voltou a enfatizar a importância do isolamento social e deixou claro que essa medida de precaução “é a única opção que temos para derrotar esse vírus”. “É vital respeitar a dignidade do próximo. É vital que os governos se mantenham informados e apoiem o isolamento.”
Ao deixar o Palácio da Alvorada, nesta manhã, Bolsonaro retirou de contexto a fala de Ghebreyesus e disse que, por ele ser africano, “sabe o que é passar dificuldade”. O objetivo do mandatário brasileiro é legitimar a tese de que a reclusão social, recomendada pelo Ministério da Saúde de seu próprio governo, deve ser flexibilizada, pois afeta a economia e pode levar a desemprego em massa.
“O que o diretor-presidente da OMS falou? Esse povo humilde fica o dia todo na rua para levar um prato de comida à noite em casa. Ele falou que ele era africano sabe o que é passar dificuldade. A fome mata mais do que vírus.”
“Quando eu falei isso, entraram até com processo no Tribunal Penal Internacional [em Haia, nos Países Baixos] me chamando de genocida. Eu sou um genocida por estar defendendo o direito de você levar um prato de comida para casa. Ele [Ghebreyesus] estava meio constrangido, mas falou a verdade. Achei excepcional a palavra dele. Meus parabéns: OMS se associa a Jair Bolsonaro”, ironizou.
O presidente também evitou comentar a postura do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), que tem pedido reiteradamente para que a população fique em casa, na contramão das opiniões do chefe. Bolsonaro que que a medida seja limitada apenas a quem está nos grupos de risco —idosos e pessoas com problemas de saúde preexistentes.
“Não sei o que ele falou. Parto do princípio que eu tenho que ver, e não acreditar no que está escrito. Não se esqueça que eu sou o presidente.”