Médico atleta relata dores do coronavírus

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Foto: Reprodução

Acostumado a uma rotina de treinos intensos, o ortopedista Vitor Luis Pereira, de 30 anos, sentia o cansaço até em suas atividades caseiras. A falta de ar e o corpo dolorido, dessa vez, não eram resultado das provas de atletismo pela equipe de sua universidade. A febre intermitente por quase duas semanas dava indícios do que se tratava, e os exames confirmaram: coronavírus.

“Me senti um pouco apreensivo de estar nessa situação, ainda mais eu sendo jovem, super ativo. Não imaginava ficar dessa forma”, afirmou Pereira em entrevista a ÉPOCA. “Fiquei 12 dias com febre direto. Isso que dava o maior mal-estar, de sentir o corpo todo cansado, destruído mesmo, como se estivesse moído”, acrescentou.

Pereira pratica esportes desde jovem – da natação ao basquete. Foi federado pela Escola Paulista de Medicina, da Unifesp, nas modalidades lançamento de disco e arremesso de peso até ingressar na residência médica em 2016. A partir daí, trocou os treinamentos diários por musculação e levantamento de peso olímpico. E, sem compromisso, auxilia a equipe de atletismo da faculdade como professor.

O histórico de atleta não impediu que, no último dia 11, o médico apresentasse os primeiros sintomas do Covid-19. Foram cinco dias de uma febre que cedia com medicação e logo retornava. Depois, veio o cansaço.

“No começo, notei quando fui subir uma rampa e fiquei cansado”, contou Pereira. “Foi piorando a falta de ar até para atividades dentro de casa. Subir escada, tomar banho, isso já me deixava bem cansado. Era como se fosse um peso no peito”, descreveu o ortopedista.

Na manhã do dia 17, ele procurou o hospital. A tomografia do tórax acusou padrão de coronavírus, e Pereira foi colocado em isolamento domiciliar. Os sintomas, porém, se agravaram e nem mais a febre cessava. A falta de ar e a tosse se tornaram recorrentes. Em dois dias, foi internado no Hospital São Luiz, em São Paulo, onde ficou por uma semana.

Primeiro, Pereira ficou em um quarto, mas logo foi transferido para a UTI. Os cinco dias em que lá esteve foram de isolamento total, sem visitas. Segundo o ortopedista, era o que mais o afligia. “Foi bem ruim, ainda mais virar paciente sendo médico. Todo contato era limitado. Não podia ver meus pais, amigos”, disse.

As redes sociais e a música tornaram-se seu refúgio para superar a solidão. Pereira mantém, por hobby, uma dupla de DJs com um amigo também médico. Não imaginava, quando criou o Bone Brothers no ano passado, que seus hits eletrônicos embalariam sua recuperação.

Seu tratamento também contou com as substâncias hidroxicloroquina e azitromicina, alvos de polêmicas nas redes sociais sobre sua eficácia. Os estudos ainda não são conclusivos, embora os fármacos estejam sendo aplicados por alguns profissionais. No caso de Pereira, ele consentiu com o uso devido ao estado grave em que se encontrava. Foram cinco dias de dose ajustada mais um antibiótico forte para evitar uma nova infecção.

O ortopedista não sabe como contraiu o vírus. Acredita que pode ter sido em um encontro com colegas americanos no início do mês. Mas não descarta a possibilidade de um paciente ter transmitido.

Pereira está em casa com os pais e sem sintomas. A conselho de seu médico, vai aguardar mais uma semana antes de retomar as atividades. Isso porque ainda há risco de uma infecção oportunista por conta de seu pulmão ter ficado bastante inflamado.

A experiência, segundo o ortopedista, mudou sua visão de mundo. Neste domingo (29), Pereira afirmou em suas redes sociais: “Saio dessa mais forte. E mudado. Pronto pra ajudar na luta contra o COVID-19. Pronto pra valorizar o que realmente importa na vida. Porque a tal da gripezinha nao vai parar. E, se não fizermos nada, vai levar muito daquilo que amamos. Já está levando”.

O relato viralizou e alcançou 23 mil curtidas. Nele, o médico pede às pessoas que levem a doença a sério e sigam as orientações do Ministério da Sáude e da Organização Mundial da Saúde (OMS). “Respeitem esse maldito vírus”, suplicou. O discurso vai na contramão das falas do presidente Jair Bolsonaro, que classificou, há pouco tempo, a pandemia como uma “gripezinha”. Enquanto Pereira compartilhava seu post, Bolsonaro saía às ruas em Brasília em desrespeito às recomendações das autoridades.

“Percebi que uma coisa que parecia não ser tão grave pode te derrubar. Saio valorizando muito mais as coisas pequenas da vida, famílias, amigos. Espero poder ajudar, principalmente a conscientizar as pessoas”, disse Pereira.

Época