Flavio Dino justifica medidas mais duras por isolamento
Foto: GILSON TEIXEIRA
“As liberdades individuais não são absolutas no nosso regime constitucional. Há uma construção milenar desde o direito romano segundo a qual, por vezes, restrições ou limitações às liberdades são essenciais para proteger liberdades.”
A frase, do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), fez parte da discussão do UOL Debate desta quinta-feira, sobre como governantes podem impor isolamento social sem ferir direitos individuais. No contexto, Dino, que já foi juiz federal, argumentou que em situações extremas, para se proteger a sociedade como um todo, se pode interferir no direito de ir e vir dos cidadãos. Algo que já ocorre com o chamado “poder de polícia” do Estado.
Além do governador maranhense, o UOL Debate reuniu Helder Barbalho (MDB), governador do Pará, Renata Gil, presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros); Ubiratan Sanderson (PSL-RS), deputado federal; e Julio Croda, médico infectologista da Fiocruz.
“Se a liberdade for absoluta, agride a liberdade de outras pessoas. Por isso existem as restrições. Normas são fundamentais quando em interesse coletivo de grande magnitude, tipo saúde pública. É elementar, básico e acaba sendo uma falácia ideológica essa ideia segundo a qual os estados não podem impor limites”, disse Dino.
Para defender o isolamento social, o governador do Maranho declarou ainda “ser falsa a ideia de que a pandemia esteja sob controle”.
O ponto de vista foi semelhante ao de Helder Barbalho. Para o governador paraense, “é fundamental” entender que a saúde pública depende de um comportamento coletivo.
“Nesse momento, nós temos que ter a clareza que nós estamos diante da avaliação do direito à coletividade buscando compatibilizá-lo com o direito individual. É fundamental que nós possamos compreender que a excepcionalidade leva à necessidade de um ordenamento pontual, de momento, com estratégia para garantir que a coletividade possa ter a proteção em saúde”, analisou.
Barbalho foi diagnosticado com a covid-19 e, segundo ele, está assintomático neste momento. “Fiz tomografia para fazer a identificação do meu quadro pulmonar e estou tomando azitromicina”, relatou ele, hoje no nono dia de isolamento. “Graças a Deus, tudo bem.”
Para a magistrada Renata Gil, as decisões judiciais recentes têm mostrado que os juízes estaduais buscam “o equilíbrio entre a garantia das liberdades individuais e a proteção ao bem-estar coletivo.”
O comportamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em relação às medidas de isolamento social adotadas pelos governadores foi um dos pontos que gerou discordância entre o governador do Pará e o deputado Sanderson, governista.
Barbalho afirmou que o presidente passa uma mensagem dúbia à população e prejudica as ações propostas também pelo Ministério da Saúde.
“Quando aqui reporto de que a mensagem é dúbia, a mensagem vem na contramão, particularmente no momento que o presidente da República, como maior líder, estimula que pessoas estejam nas ruas, participa de manifestações, ele fragiliza estratégia do seu próprio Ministério da Saúde.”
Sanderson rebateu ao afirmar que o Palácio do Planalto coordena as ações de combate à pandemia.
“Respeito o posicionamento dos senhores, mas discordo quando afirmam que o presidente da República seja alguém que esteja se omitindo para que a vida humana seja preservada”, afirmou.
O deputado federal defendeu, em vários momentos, uma gradual diminuição do isolamento social, com base na análise de contexto de cada região para que a economia seja retomada. Criticou ainda o que classifica como excessos ao submeter cidadãos à possibilidade de serem “algemados e levados no camburão” por desrespeito ao isolamento.
O governador do Pará citou a demanda de novos casos de covid-19 na região metropolitana de Belém, que tem, segundo Barbalho, quase 100% de leitos de UTIs ocupados.
“O percentual de UTIs ocupadas chega a 90% em todo estado. Mas, quando faço o recorte para a região metropolitana, estamos próximos de 100% de ocupação”.
Segundo Barbalho, as Unidades Básicas de Saúde não estão conseguindo oferecer os serviços de maneira que a população possa ter atenção básica ou início precoce do atendimento para evitar quadros mais graves.
O deputado federal Ubiratan Sanderson defendeu o direito de ir e vir como fundamental, mesmo durante o isolamento. E viu exagero na resposta legal de prefeitos e governadores.
“Acho que aquele jargão de que a virtude não está nos extremos deve ser levado em consideração”, disse. “Sabemos que nenhum direito é absoluto, isso é algo me parece cristalino.”
Segundo o congressista do PSL, há um exagero “quando prefeitos e governadores determinam através de decretos, leis municipais, estaduais, a proibição a visitas de pacientes terminais. Exagero pelo simples fato de pessoas estarem caminhando na rua serem colocadas em um camburão”, afirmou.
A presidente da AMB afirmou ser favorável ao trabalho educativo em detrimento a punições para pessoas que desrespeitem as medidas de isolamento social.
O monitoramento de dados de telefones celulares durante as medidas de isolamento referentes à pandemia do novo coronavírus é uma medida necessária para a defesa de valores coletivos, embora não seja uma medida desejável, defendeu Renata Gil.
Para a juíza do Rio de Janeiro, a medida não é ideal, mas é válida em situações como a atual.
“A gente teve uma decisão recente de um magistrado de São Paulo deferindo essas medidas, e isso vem ao encontro do que aconteceu na China”, alegou. Segundo Renata, trata-se de um “embate de valores individuais, essa proteção e valor da coletividade”.