Ministério Público pressiona PGR a denunciar Bolsonaro

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Foto: CAROLINA ANTUNES/PR

A saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública provocou uma enxurrada de críticas de procuradores do Ministério Público Federal, inclusive de integrantes e ex-integrantes da Lava Jato, e também pedidos de investigação sobre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Ex-integrante do grupo de trabalho da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República, o procurador regional Vladimir Aras disse nas redes sociais que os episódios narrados por Moro em seu pronunciamento “são gravíssimos”.

“Houve relatos sobre falsidade ideológica, obstrução da justiça e crime de responsabilidade, que deverão ser investigados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) e pela Câmara dos Deputados”, afirmou Aras. “Interferência política na Polícia Federal é inadmissível.”

“A Polícia Federal se notabilizou como uma das forças policiais mais respeitadas do mundo por atuar tecnicamente, com um corpo funcional bem preparado e com bastante autonomia operacional. As consequências dessa intromissão política são incalculáveis.”

Ao anunciar sua demissão do governo federal nesta sexta-feira (24), Sergio Moro criticou a insistência do presidente Jair Bolsonaro para a troca do comando da Polícia Federal, sem apresentar causas que fossem aceitáveis.

Moro afirmou ainda que Bolsonaro queria ter acesso a informações e relatórios confidenciais de inteligência da PF. “Não tenho condições de persistir aqui, sem condições de trabalho.” E disse que “sempre estará à disposição do país”.

A demissão de Moro foi antecipada pela Folha nesta quinta-feira (23).

 

O presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), Fábio George Cruz da Nóbrega, também afirmou que as declações são “muito graves”.

“Sinalizam a ocorrência de crime de falsidade ideológica de responsabilidade do presidente da República, na assinatura de ato inexistente de exoneração a pedido do diretor-geral da PF, bem como de crime de responsabilidade, na tentativa de interferência na regularidade de investigações. Ambas as ocorrências precisam ser devidamente apuradas”, diz Nóbrega, em nota.

O procurador regional João Carlos Rocha, que foi assessor do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, afirmou nas redes sociais que após as declarações de Moro “é inevitável que se instaure uma investigação sobre a conduta do presidente da República”.

“O ex-ministro da Justiça acaba de relatar diversos fatos envolvendo crimes comuns e de responsabilidade”, afirmou.

Bruno Calabrich, também procurador regional, disse que “a bola está com a PGR”. “Trocar um agente público para interferir no resultado de uma investigação é uma acusação grave e precisa ser apurada”, apontou. A procuradora Monique Cheker disse que a Procuradoria-Geral da República “tem o dever de apurar”.

Sem citar Moro, Yuri Luz, que integra a Lava Jato paulista, apontou possível omissão do ministro em declarar eventuais irregularidades que tenha presenciado no governo.

“Todo servidor público tem o dever de funcional de comunicar imediatamente, às autoridades competentes, as ilicitudes de que venha a ter ciência”, disse, no Twitter.

“Imediatamente. Não oportunamente. Falar o que ocorreu é importante. Mas não torna legal a omissão ilegal que perdura certo tempo.”

Como apontou a coluna Mônica Bergamo, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) enxergaram vários crimes que podem ter sido cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro, segundo o que disse Moro em seu pronunciamento.

Um deles é o crime de advocacia administrativa: segundo Moro, o presidente queria acionar relatórios de inteligência de investigações da Polícia Federal.

 

Outros membros do Ministério Público também fizeram declarações de solidariedade a Moro, não necessariamente apontando necessidade de investigação.

Em nota, os procuradores da Lava Jato do Paraná manifestaram “repúdio às noticiadas tentativas de interferência do presidente da República na Polícia Federal em investigações e de acesso a informações sigilosas”.

Eles disseram que o combate à corrupção exigem instituições fortes e a escolha de pessoas para cargos relevantes no Ministério da Justiça e Polícia Federal deve ser impessoal e guiada por princípios republicanos.

“As investigações devem ser protegidas de qualquer tipo de ingerência político-partidária. É inconcebível que o presidente da República tenha acesso a informações sigilosas ou que interfira em investigações”, diz a força-tarefa.

“A tentativa de nomeação de autoridades para interferir em determinadas investigações é ato da mais elevada gravidade e abre espaço para a obstrução do trabalho contra a corrupção e outros crimes praticados por poderosos, colocando em risco todo o sistema anticorrupção brasileiro.”

Para a procuradora regional Thaméa Danelon, que coordenou a força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, “a criminalidade comemora” a saída de Moro do ministério.

Um dia antes, ela havia gravado um vídeo afirmando que “caso se confirme essa saída, vamos começar uma nova crise”. “Já estamos vivenciando crise, de saúde e da economia por conta do conoravirus, e vai ser mais um fator de crise para o nosso país”, disse.

Helio Telho, procurador da República em Goiás, questionou: “Bolsonaro está trocando Moro pelo Centrão? É isso, produção?”.

De Minas Gerais, o procurador Patrick Salgado afirmou não ter palavras “para descrever meu sentimento de profunda tristeza com a saída do homem íntegro, justo e ético” do Ministério da Justiça e sua “minha extrema decepção com o presidente Jair Bolsonaro”.

 

Antes do anúncio da saída de Moro, Jerusa Viecili, que integrava a Lava Jato de Curitiba, afirmou no Twitter que “investigações de crimes de colarinho branco e corrupção na área federal somente são possíveis com trabalho técnico e independente da Polícia Federal e do Ministério Público Federal”.

Também na internet, o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, disse que a entidade irá analisar os indícios de crimes apontados por Moro.

Folha