Gabinete do ódio também é cabide de empregos

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Foto: Dida Sampaio/Estadão

Quase um ano e meio após o início do governo, a promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro de cortar 30% dos cargos da administração pública não foi concretizada nem mesmo no Palácio do Planalto, que hoje emprega 3.395 funcionários. O número está perto de bater uma marca histórica: é apenas 4,2% menor do que o registrado na gestão de Michel Temer (MDB), que contava com 3.544 servidores.

O chamado gabinete do ódio, núcleo liderado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), ajudou a manter o Planalto inchado. A Assessoria Especial da Presidência, onde fica o grupo de apoiadores do filho “02” do presidente, ultrapassou o número de servidores dos governos anteriores.

Localizado no terceiro andar do Planalto, ao lado da sala de Bolsonaro, esse “departamento” quase dobrou da época de Temer para cá. Bolsonaro nomeou 23 assessores especiais; Temer, 13, Dilma Rousseff (PT), 17, e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu antecessor, 15.

O enxugamento da máquina foi prometido por Bolsonaro várias vezes, ao longo da disputa de 2018. Trata-se, porém, de uma promessa longe de ser cumprida. Agora, com as negociações para barrar eventual processo de impeachment, o presidente partiu para o “toma lá, dá cá” explícito e negocia cargos com o Centrão – bloco de partidos antes chamado por ele de “velha política” –, em troca de apoio no Congresso.

Quando era coordenador da campanha de Bolsonaro, em 2018, Onyx Lorenzoni – hoje ministro da Cidadania – chegou a dizer que o novo governo promoveria um “corte intenso” e uma “despetização”. Em novembro daquele ano, já eleito, Bolsonaro se reuniu com a equipe de transição e, após ter em mãos o número real de servidores, informou que desbastaria a máquina pública. “Não posso falar o porcentual. No mínimo, aí, 30%”, disse.

O corte em massa de apadrinhados petistas e emedebistas no governo não representou queda no número de pessoal, mas apenas troca em massa por bolsonaristas. As substituições mantiveram a máquina inchada e os “puxadinhos” em pé. “Puxadinhos” é o termo usado para designar as repartições improvisadas nos andares do prédio principal e do anexo do Planalto, para abrigar servidores.

Os assessores especiais não são os únicos funcionários que ficam no entorno do presidente. Perto dele, no Gabinete Pessoal – a chamada “cozinha política” do Planalto – trabalham outras 166 pessoas. Esse núcleo sempre existiu, em outros governos, e acomoda a equipe de execução de trabalhos do presidente. Ali estão lotados ajudantes de ordem, servidores da preparação da agenda, do Cerimonial, da secretaria particular, do acervo documental, do recebimento e respostas das correspondências pessoais e sociais.

Dados obtidos pelo Estadão com a Diretoria de Administração da Presidência mostram que, dos atuais funcionários do Planalto – incluindo pessoal de carreira e temporários –, 993 ocupam cargos de assessoramento superior, de livre provimento, os chamados DAS. Além da Assessoria Especial e do Gabinete Pessoal, os servidores do Planalto também estão distribuídos nos quatro ministérios palacianos.

O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e a Secretaria-Geral lideram o ranking interno, com um terço dos servidores cada. O restante está lotado na Secretaria de Governo (598) e na Casa Civil (326).

No serviço público, as remunerações dos DAS variam de R$ 2,7 mil a R$ 16,9 mil. Os servidores do palácio recebem funções comissionadas e gratificações em diversos valores, que variam de R$ 645 a R$ 6,2 mil. O teto é estabelecido pelos salários do presidente e dos ministros: R$ 30.934,70.

O GSI tem 1.138 servidores e apenas 69 DAS. A maior parte deles trabalha na segurança presidencial, reforçada em cerca de 20% no atual governo. Técnicos da área justificam o aumento da segurança pelo fato de Bolsonaro ter sofrido um atentado a faca, em 2018. Já a Secretaria-Geral, que cuida da administração do Palácio do Planalto, mas ganhou atribuições da Casa Civil, tem agora 1.143 funcionários, 299 DAS.

Na disputa de 2018, quando ocupava o posto de coordenador da campanha de Bolsonaro, Onyx chegou a anunciar uma tesourada em 20 mil cargos de confiança do governo. Ao assumir a Casa Civil, em janeiro de 2019, Onyx encontrou 497 servidores na pasta. Não demorou para anunciar a “despetização” do Palácio do Planalto e a exoneração de 320 comissionados. Em seguida, porém, houve uma espécie de “porteira aberta” para aliados do Rio Grande do Sul.

Pré-candidato ao governo gaúcho em 2022, o ministro já contava, no fim de dezembro, com 352 funcionários na Casa Civil. Perdeu para a Secretaria-Geral, porém, um dos principais braços de sua pasta, a Subchefia de Assuntos Jurídicos (SAJ). Bolsonaro tirou Onyx da Casa Civil e o realocou na Cidadania. Desde a sua saída, a Casa Civil cortou mais 26 servidores.

Na Esplanada, nas autarquias e nas fundações, a promessa de enxugar a máquina não foi cumprida. No fim do governo Temer, em dezembro de 2018, havia 32.694 cargos e funções comissionadas em todo o Executivo. No último mês de março, o mesmo número era de 31.872, uma redução de apenas 2,5%.

Na prática, se for considerada apenas a administração direta, o número de cargos e funções comissionados caiu de 23.172 em dezembro de 2018 para 22.079 – redução de 4,7%. Os dados constam do Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape).

Estadão