Inquérito das fake news pode ser o pior para Bolsonaro

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Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS

A divulgação do vídeo com duas horas de xingamento do presidente Jair Bolsonaro e de seus ministros mais leais contra autoridades da República tem o potencial de azedar ainda mais suas relações com o Supremo, o Legislativo e os governadores. É cedo, porém, para dizer que as cenas, vistas até agora por meia dúzia de pessoas mas sobre as quais muitos vaticínios já se fazem, seja uma “bala de prata” do inquérito que apura as denúncias do ex-ministro Sergio Moro contra o presidente da República.

Bolsonaro, pelos relatos de quem assistiu o vídeo da reunião do dia 22 de abril, teria demonstrado a intenção de trocar o superintendente da Polícia Federal no Rio para proteger sua família de investigações do órgão. Para um experiente procurador federal, que não joga no time dos engavetadores, a configuração de um crime de advocacia administrativa, ou seja, o patrocínio de um interesse privado por um administrador público, precisa demonstrar a consumação, ou seja, que a troca resultaria em benefício pessoal para o presidente e sua família.

A maior contribuição do vídeo, até aqui, foi tornar mais difícil o pedido de arquivamento do inquérito, atitude que os depoimentos de Moro e do ex-diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, poderiam sugerir. É na continuidade da investigação que provas mais robustas podem vir a surgir.

Há dúvidas se as novas provas do inquérito relatado pelo ministro Celso de Mello surgirão dos depoimentos dos ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Walter Braga Netto (Casa Civil). Os primeiros relatos dos depoimentos confirmam as expectativas de que os ministros protegeriam o presidente. Restam ainda a busca e apreensão do celular do ex-ministro, os relatórios da Polícia Federal e da Abin, além do depoimento do próprio presidente da República. Este ainda dependeria de requisição da Polícia Federal ou do Procurador-Geral da República, Augusto Aras, mas seus colegas o consideram inevitável.

Das quatro frentes de investigação abertas no Supremo sobre o presidente da República, aquela que os procuradores avaliam como mais comprometedora é a das “fake news” conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes. É um inquérito que, assim como o segundo relatado pelo decano, em relação ao ato em defesa do AI-5, tem potencial de dano à Lei de Segurança Nacional. O caso em mãos do ministro Celso de Mello, porém, refere-se à participação de deputados federais e não ao discurso do presidente da República em frente ao quartel-general do Exército. O de Moraes ainda teria potencial de fazer andar a investigação em curso no Tribunal Superior Eleitoral que comprometeria toda a chapa.

O quarto e mais recente dos processos, que chegou esta semana à Corte, o ministro Ricardo Lewandowski terá que decidir se o presidente deve apresentar seus exames da covid-19. A dúvida dos procuradores não é se a informação, como alega a Advocacia-Geral da União, é privativa do presidente, mas se, num processo criminal como este, originado da Lei de Acesso à Informação, ele seria obrigado a produzir provas contra si mesmo. A situação seria diferente se a investigação nascesse de um dos muitos pedidos de impeachment represados na Câmara que alegam dano à saúde pública a partir das aglomerações promovidas pelo presidente, estivesse, ou não, infectado.

Valor Econômico