Nenhum presidente brasileiro teve imagem pior que a de Bolsonaro no exterior

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Foto: Reprodução

Entre domingo (24) e segunda-feira (25), diversos veículos de imprensa internacionais publicaram longos artigos e reportagens com duras críticas à resposta do presidente Jair Bolsonaro à crise gerada pelo novo coronavírus.

O brasileiro é descrito um “líder vingativo”, com atuação “irresponsável e perigosa”, que investe seu tempo em brigas com juízes, parlamentares e “até os próprios ministros” enquanto governadores pedem ajuda.

“Quebrar o Brasil” e “levar o país ao desastre” são alguns dos prognósticos associados à atuação do presidente, descrito como um dos raros negacionistas da gravidade da pandemia e tem sua atuação apresentada como uma das piores em todo o planeta.

Quatro eixos principais dão contexto aos materiais publicados: o vídeo da reunião ministerial em que Bolsonaro supostamente exporia sua intenção de interferir em investigações contra familiares e pessoas próximas, a gestão ambiental do governo em meio à pandemia, o veto imposto pelo aliado Donald Trump à entrada nos EUA de pessoas que estiveram no Brasil e a insistência do presidente brasileiro em minimizar a pandemia e incentivar aglomerações públicas.

Diferente da narrativa governista, que costuma atribuir as críticas à esquerda, as análises negativas também estampam as páginas de veículos tradicionalmente conservadores, como o jornal britânico The Telegraph.

O mesmo vale para ícones mundiais do liberalismo econômico, celebrado pelo ministro Paulo Guedes (Economia) e pelo filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, como é o caso do jornal Financial Times.

Na manhã desta segunda-feira, em frente ao palácio do Alvorada, o presidente foi questionado por uma apoiadora sobre a imagem negativa de sua gestão no exterior.

“A imprensa mundial é de esquerda”, insistiu o líder brasileiro, citando mais uma vez o presidente norte-americano. Em descompasso com Bolsonaro, Trump tem descrito o Brasil como alvo de um “surto”, “duramente atingido” e vivendo “um momento difícil” em meio à pandemia.

“O Trump sofre muito nos Estados Unidos também”, disse o presidente brasileiro.

Financial Times
A publicação mais comentada nesta segunda-feira vem do jornal britânico Financial Times.

Um artigo assinado por Gideon Rachman, colunista-chefe para assuntos internacionais do jornal, aponta no título que “o populismo de Jair Bolsonaro está levando o país para um desastre”.

O texto compara as respostas de Bolsonaro e de Trump à pandemia, classificando a do brasileiro como “ainda mais irresponsável e perigosa”.

O texto cita a “obsessão dos dois líderes pelas supostas propriedades de cura” da hidroxicloriquina. “Mas, enquanto Trump simplesmente está tomando o remédio, ele mesmo, Bolsonaro forçou seu Ministério da Saúde a lançar novas diretrizes recomendando a droga para pacientes de coronavírus.”

O paralelo se repete em relação ao apoio de ambos a protestos contra medidas de isolamento. Trump, segundo o texto, expressou simpatia aos manifestantes. Já Bolsonaro foi além e participou dos atos.

O especialista conclui que o Brasil será duramente afetado econômica e socialmente conforme a doença se espalha pelo país. Para Rachman, “Bolsonaro obviamente não é culpado pelo vírus”, mas pela “resposta caótica que permitiu que ele fugisse do controle”.

O texto cita um paradoxo em sua conclusão – apesar da gestão do presidente aprofundar a crise no país, ela pode ajudá-lo politicamente – já que o vírus impede grandes manifestações, como as registradas durante o impeachment de Dilma Rousseff.

Para o analista, “Bolsonaro prospera por meio de políticas que dividem”.

“Mortes e desemprego causados pela covid-19 estão sendo exacerbados pela liderança de Bolsonaro. Mas, perversamente, um desastre econômico e de saúde pública pode criar um ambiente ainda mais propício para a política do medo e da irracionalidade”, diz o autor, no jornal inglês.

The Telegraph
O jornal conservador The Telegraph vai além e diz que Bolsonaro pode ficar conhecido como “o homem que quebrou o Brasil”.

O texto cita declarações recentes do presidente, que classificou a pandemia como “histeria” e “resfriadinho”, e disse que estaria imune aos sintomas mais graves da doença graças a seu “histórico de atleta”.

“Dois meses e 340 mil casos confirmados depois, o pequeno resfriado ceifou as vidas de pelo menos 20 mil brasileiros, e provavelmente muitos mais”, aponta o jornal.

O Telegraph destaca o Brasil como novo epicentro global da pandemia, “registrando médias diárias mais altas que qualquer outro lugar no mundo”.

O texto diz que os problemas de Bolsonaro não terminam aí e cita o vídeo da reunião ministerial – “um escândalo que pode levar a um impeachment”, segundo o jornal.

Ainda segundo a reportagem, a estratégia de Bolsonaro não encontra similares em nenhum lugar do mundo – “o presidente estimula uma cultura de bullying e desprezo pelos que pensam diferente”.

“Um líder ciumento e vingativo dirigindo uma nação em crise”, descreve o jornal a partir de relatos de fontes no governo em Brasília.

NYT
Nos EUA, o jornal The New York Times destacou o veto de Trump a viajantes vindos do Brasil.

“Enquando hospitais colapsam e governadores imploravam por ajuda, Bolsonaro passou os últimos meses brigando com a Suprema Corte, com o Congresso e até com seus próprios ministros”, diz o jornal. “Agora ele se vê como alvo de uma investigação que apura se ele protegeu sua família de investigações sobre corrupção.”

O NYT aponta que o presidente brasileiro vê sua aprovação caindo, enquanto a pandemia está fora de controle no país.

Segundo o jornal americano, o bloqueio vindo de um aliado como Trump é um revés para Bolsonaro, que “repetidamente tentou ganhar capital político a partir de sua afinidade ideológica com o presidente americano”.

“O potencial de transmissão não detectada do vírus por indivíduos infectados que tentam entrar nos Estados Unidos oriundos do Brasil ameaçam a segurança do nosso sistema de transporte e infraestrutura e a segurança nacional”, afirma a proclamação assinada por Trump no fim de semana.

O veto, que passa a valer a partir do dia 29 deste mês, deixa de fora cidadãos americanos e estrangeiros com visto de residência permanente, entre outras exceções.

O documento da Casa Branca cita dados da pandemia no Brasil para justificar a medida e uma avaliação do Centro para Prevenção e Controle de Doenças (CDC) de que o país está vivenciando uma ampla transmissão da covid-19.

A secretária de imprensa da Casa Branca, Kayleigh McEnany, disse que as novas restrições ajudarão a garantir que estrangeiros não tragam infecções adicionais para os EUA, mas não se aplicariam ao fluxo de comércio entre os países.

“Bolsonaro se viu repetidamente esnobado pelo governo dos EUA”, lembra o jornal, citando ameaças de Trump de aumentar taxas sobre produtos exportados pelo Brasil e a possibilidade de vetar a entrada do Brasil na OCDE.

Outros veículos
Outros veículos como a agência de notícias Reuters, a revista semanal Newsweek, o jornal britânico The Guardian e o portal econômico Business Insider também dedicaram textos repercutindo as más notícias associadas ao Brasil.

Nesta segunda-feira, uma das principais notícias da Business Insider aponta, no título, que “povos indígenas do Brasil correm risco de ‘genocídio'”, apontando taxas de mortalidade mais aceleradas que no restante da população.

BBC