Propagandista do neoliberalismo admite guinada à esquerda

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Foto: Simon Dawson/Reuters

Mailson da Nóbrega é um desses “cabeças-de-planilha” ultra neoliberais que tantos malefícios causaram ao Terceiro Mundo com suas propostas desumanas que colocavam o capital e os negócios acima do ser humano.

Foi ministro da Fazenda de José Sarney entre 1988 e 1990 e adotou à época, durante o surto inflacionário que duraria uma década e meia mais, a política do “arroz com feijão”, que consistia em se afastar da heterodoxia do Plano Cruzado e o congelamento de preços de Dilson Funaro. Foi um rotundo fracasso.

A gestão de Nóbrega foi marcada pela mediocridade e viu crescer, sob si, o surto inflacionário até a marca estrondosa de mais de mil por cento de inflação ao ano, ao fim dos anos 1990, permitindo que Fernando Collor se abatesse sobre nós.

No artigo de Mailson que você vai ler a seguir, ele, como vem acontecendo à larga entre o establishment neoliberal, reconhece que a explosão de desigualdade, que sua ideologia vinha provocando, e a ilusão suicida do “Estado Mínimo” não têm mais lugar na nova ordem mundial que a covid19 está fazendo nascer.

Confira.

A pandemia de Covid-19 pode vir a ser a lente de aumento que fará um alerta para a desigualdade social — crescente no mundo rico nos últimos anos — e para ideias obsoletas do Estado mínimo. As visões liberais tendem a mudar.

Em seu aspecto político, o liberalismo nasceu com o Iluminismo (séculos XVII e XVIII), que defendia o individualismo e o fim do absolutismo, além da promoção da liberdade, da tolerância e da separação Igreja-Estado. Dele derivaram as três grandes revoluções do período: a Revolução Gloriosa inglesa, a Revolução Americana e a Revolução Francesa.

Muitas foram as conquistas, mas, no início, os liberais desconfiavam da democracia, temendo a tirania da maioria. John Stuart Mill, o liberal mais influente do século XIX e autor da obra clássica On Liberty, advogava o voto plural ponderado pela educação. O trabalhador não qualificado teria peso um; o qualificado, dois; o superintendente, três; e assim por diante. No topo, o voto de profissionais bem educados seria multiplicado por seis.

No início do século XIX, em sua vertente econômica, o liberalismo provara os benefícios do capitalismo. No plano político, realçara o valor da liberdade de expressão e de imprensa. Mesmo assim, a cidadania limitava-se aos direitos civis. Direitos políticos do voto universal apareceram para os homens em 1830 nos EUA (restrito aos brancos) e em 1884 no Reino Unido. Lá, as mulheres passaram a votar nos anos 1920. Na Suíça, em 1971.

Mudanças virão, agora voltadas para reduzir a desigualdade e melhorar a distribuição de renda

Direitos sociais como os de sindicalização e limitação das horas de trabalho surgiram no fim do século XIX. Tornaram-se plenos com a Grande Depressão e com o Estado de bem-estar social do pós-guerra. No Brasil, a plenitude esperou a democratização.

No alvorecer do século XX, a concentração de renda derivada do capitalismo sem freios justificou a expansão de direitos trabalhistas e a criação do imposto de renda progressivo. Nos anos 1960-1970, o esgotamento e os excessos de políticas keynesianas de anos anteriores acarretaram mudanças. As ideias da Escola de Chicago e de dois de seus mais ilustres mestres, Friedrich Hayek e Milton Friedman — ambos ganhadores do Prêmio Nobel de Economia —, influenciaram os governos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, pautados por redução do papel do Estado, austeridade fiscal, desregulação e privatização.

Tais políticas provocaram, não intencionalmente, desigualdade e concentração de renda sem paralelo. Atualmente, nos EUA, 1% da população abocanha 42% da riqueza. A participação dos trabalhadores na renda, de 65% nos anos 1970, caiu desde então para menos de 60%. Viu-se o mesmo em outros países.

Hoje, copiosa literatura realça essa realidade. O Fórum de Davos fala em Stakeholder Capitalism, isto é, com atenção focalizada em todos os interesses, e não apenas nos acionistas. Ideias ultraliberais perdem apelo. Mudanças virão, agora voltadas para reduzir a desigualdade e melhorar a distribuição de renda. A pandemia pode acelerar o debate.

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