Ruralistas se revoltam com proteção do STF a sem-terra
Foto: Leo Caldas/Folhapress
As decisões dos últimos dias de Edson Fachin, ministro do Supremo Tribunal Federal, sobre demarcações de terras indígenas revoltaram a bancada ruralista, uma das mais numerosas do Congresso, com 295 parlamentares.
Na quarta-feira (6), Fachin determinou a suspensão dos processos judiciais de reintegração de posse e de anulação de demarcações de terras indígenas até o fim da pandemia do novo coronavírus ou até a conclusão do julgamento que trata do tema na Corte.
Na quinta-feira (7), o ministro suspendeu os efeitos de um parecer da Advocacia-Geral da União que vinha sendo usado pelo governo Jair Bolsonaro para interromper demarcações de terras indígenas.
Em nota, a Frente Parlamentar Agropecuárua (a bancada ruralista) diz que as decisões dão “uma espécie de salvo-conduto para invasão de propriedade.”
Eles vão recorrer ao plenário do STF junto com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).
Presidente da FPA, o deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS) classifica como “abuso do poder judicial” o fato de Fachin ter decidido sobre o tema monocraticamente, sem submetê-lo ao plenário do STF.
“Situações como esta contribuem para minar a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas”, diz.
Assinado pelo então presidente Michel Temer (MDB), o parecer 001/2017 passou a considerar que indígenas têm direito à terra “desde que a área pretendida estivesse ocupada pelos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal”, em outubro de 1988.
Ele foi assinado em um momento em que Temer buscava apoio na Câmara para que deputados votassem contrariamente à admissibilidade de um pedido de impeachment. Para agradar a bancada ruralista, assinou o parecer que carrega uma tese cara aos deputados que a compunham.
Segundo a FPA, o parecer “proporcionava segurança jurídica à sociedade brasileira para identificar, demarcar e proteger o que realmente é uma terra indígena.”
Esse entendimento jurídico, chamado de “marco temporal”, tem sido fortemente criticado por várias organizações não governamentais, pois representa a impossibilidade legal de indígenas reivindicarem seus territórios que não estavam por eles ocupados em outubro de 1988.
Muitos povos foram expulsos de suas terras durante a ditadura militar, no entanto, antes da promulgação da Constituição.
Com base nessa tese do marco temporal, o então ministro da Justiça, Sergio Moro, vinha promovendo o impedimento de demarcações de terras indígenas.
No começo de 2020, conforme revelado pela Folha, Moro devolveu à Funai 17 processos de demarcação de terras indígenas que estavam no órgão à espera de uma decisão do ministro.
Na prática, a medida representarou ainda mais demora nas demarcações e jogou dúvidas sobre as terras, municiando partes contrárias às demarcações.