Ex-presidente do INPE chama salles de “ministro da destruição”
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Quase um ano depois de o físico e professor Ricardo Galvão ter sido demitido da diretoria do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), muita coisa ainda lembra o cenário que levou à sua queda, em 2019: recordes de desmatamento, pressão internacional pela preservação da Amazônia e um governo que contesta dados produzidos pelos próprios órgãos oficiais. De lá pra cá, contudo, cresceu a pressão pela saída do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles – o que, avaliou Galvão em entrevista ao Metrópoles, é fundamental para a “salvação do Brasil”.
“Supondo que este governo vá continuar, para a salvação do Brasil, para recuperarmos a imagem do país no exterior, Salles e Ernesto Araújo [ministro das Relações Exteriores] têm que ser exonerados imediatamente. Salles não poderia nem ter entrado, claramente ele assumiu como o ministro da destruição do meio ambiente”, afirmou Galvão na entrevista, concedida no fim da semana passada, antes de o Ministério Público Federal (MPF) entrar com ação de improbidade administrativa contra Salles, nessa segunda-feira (6/7).
O ministro é acusado de “desestruturação dolosa das estruturas de proteção ao meio ambiente”. Assinada por 12 procuradores da República, a ação pede o afastamento de Salles em caráter liminar, ou seja, imediatamente.
Para exemplificar, o ex-diretor do Inpe lembrou o discurso de Salles na reunião ministerial de 22 de abril, quando ele disse que a pandemia do novo coronavírus era uma oportunidade para o governo “ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”.
“Aquele circo de horror que todos nós assistimos, não pode ser mais claro que aquilo. Ele tem a visão de favorecer o capitalismo predatório, mesmo na Amazônia. A mentalidade dele é clara: ele vê o progresso econômico como oposto à preservação ambiental.”
Segundo ele, a pressão de países como Noruega, Alemanha, Suíça e Holanda deve aumentar e, para conter a insatisfação externa, não será o bastante seguir com o discurso de que dados são manipulados para “falar mal do Brasil”, como defende o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). ” Isso é conversa de criança, é tapar o sol com a peneira, os dados todos tem na hora que quiserem”, pontuou.
“O governo não tem nenhuma credibilidade externa. É essencial trocar o ministro. O protagonismo que o Brasil desempenhava no exterior na área do meio ambiente foi inteiramente destruído por este governo.”
Sobre o titular do Itamaraty, ele diz que, ainda que não atue diretamente na questão do meio ambiente, Araújo “também tem um discurso nesse sentido, nega a questão da mudança climática, e causa uma impressão muito má no exterior”. Recentemente, lembra, ele ouviu de um “brasileiro alto na diplomacia”, em Columbia (EUA), que o discurso do chanceler também “afeta violentamente a imagem do Brasil”.
Galvão também criticou o vice-presidente, General Hamilton Mourão (PRTB), que, desde fevereiro, comanda o Conselho da Amazônia. “Achava que era uma pessoa mais sensata, mas a verdade é que até agora não fizeram absolutamente nada”, acrescentando que o Brasil terá recordes, na série histórica dos últimos 15 anos, em queimadas e desmatamento.
Reiterando as queixas sobre a composição do colegiado – que não tem representantes dos governos estaduais, nem da comunidade científica, nem do empresariado especializado em desenvolvimento sustentável –, o professor classificou como “visão totalmente distorcida” a estratégia dos militares para a região.
“Nós temos muitos estudos feitos no Brasil, temos um plano de desenvolvimento da Amazônia sustentável que vem desde a gestão Marina Silva, existe um grande número de especialistas, e eles não chamam nenhuma dessas pessoas. Encheram de militares, é uma visão completamente distorcida do problema real que nós temos na Amazônia, de domínio do território. Mourão não tem competência sobre isso.”
A postura do governo federal, conclui, parece ser “para agradar os ingleses” – tanto na Força Nacional para a Amazônia quanto no recente discurso de Salles defendendo a exploração sustentável da floresta (que, para ele, só mudou por causa da pressão pública) –, o discurso não se reflete em ações práticas ou em uma proposta real de atividade econômica para a região, por exemplo.
“Tudo isso está sendo colocado simplesmente para agradar os ingleses. Tem um ditado que eu gosto: “Tra il dire e il fare c’è di mezzo il mare (entre o fazer e o dizer tem um mar no meio)”, ironiza.