Oposição ecoa Gilmar e também fala em genocídio

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Foto: Michel Jesus/Agência Câmara

Em audiência na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira, 15, opositores do governo Jair Bolsonaro e lideranças indígenas repetiram que há um “genocídio” de comunidades tradicionais pela covid-19. A tese foi rejeitada pelo secretário de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério da Saúde, Robson Santos.

“Dizer que governo federal não trabalhou, que não se fez nada, que há indígenas abandonados, genocídio, com números que estão sendo apresentados. Preciso discordar”, disse o secretário.

Coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sônia Guajajara afirmou que “não é exagero” falar em genocídio. “Momento é dramático e assustador com o avanço da covid-19 (em povos indígenas)”. Ela afirmou que não há retrato fiel de contaminados pela falta de testes. Aqueles que são feitos, têm detectado o vírus, disse. “Onde joga o anzol, pesca covid.”

A tese de “genocídio” ganhou espaço no vocabulário de críticas contra o governo Jair Bolsonaro após falas de Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). “É preciso dizer isso de maneira muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É preciso pôr fim a isso”, disse o ministro, sobre a presença militares estarem à frente da gestão do Ministério da Saúde, em debate promovido pela revista IstoÉ no domingo, 11.

Gilmar ligou a fala sobre “genício” a mortes de indígenas, na terça-feira, 14, em debate do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). O ministro disse que a temática de “ameaça aos povos indígenas” é abordada com frequência na Europa e citou mobilização sobre o tema liderada pelo fotógrafo Sebastião Salgado. “Apontando que o Brasil pode estar cometendo genocídio. Então é este o debate”, disse Gilmar.

Como mostrou o Estadão, o medo de serem alvo de investigação por genocídio de povos indígenas em razão da acusação de inação diante da pandemia de covid-19 foi o que provocou a reação do Ministério da Defesa e dos comandantes das três Forças às declarações Gilmar.

No debate da Câmara, nesta quarta-feira, 15, o secretário de Saúde Indígena disse “refutar” a tese de genocídio. “Estou aqui para promover saúde. Não sou criminoso de guerra. Não vejo isso no governo. Está totalmente fora”, declarou.

O governo e lideranças indígenas apresentam dados divergentes sobre a covid-19. Enquanto o Ministério da Saúde aponta 10.517 infectados e 216 mortos, a Apib afirma que são 15.180 infectados e 517 óbitos.

O secretário da Sesai afirma que algumas entidades somam aos boletins dados de pessoas que, pela legislação, não são cobertos por ações para saúde indígena.

“Os dados não são aleatórios, para desmoralizar”, rebateu Mario Nicacio, vice-coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab) Santos também afirma que não há provas de que profissionais de saúde levaram a doença para dentro das aldeias, como apontam algumas lideranças indígenas.

A deputada Joênia Wapichana (Rede-RR), primeira mulher indígena na Câmara, apontou preocupação com avanço da mineração ilegal em áreas de comunidades tradicionais. “Tem contribuído para a contaminação”, disse. Wapichana também reforçou suspeitas de que agentes de saúde podem ter levado a doença. “Chegou em locais só acessados por avião.”

O secretário Robson Santos negou que o governo federal levou para aldeias Yanomami, em Roraima, comprimidos de cloroquina para enfrentar a covid-19, tratamento que não tem eficácia comprovada, mas é defendido pelo presidente Jair Bolsonaro. Segundo o secretário, a droga é entregue em todos os anos na região para o combate à malária, indicado na bula do fármaco.

Deputados da oposição defenderam derrubada de vetos feitos por Bolsonaro em lei que define medidas para combater o avanço do novo coronavírus entre indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. Entre os pontos rejeitados pelo presidente, está garantir o acesso universal à água potável, distribuir gratuitamente materiais de higiene, de limpeza e de desinfecção das aldeias, e ofertar leitos hospitalares e de unidade de terapia intensiva (UTI) e ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea.

“A postura de vetar é sim genocida”, disse o deputado e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha (PT-SP).

O secretário Robson Santos disse que manter o texto original da lei pode sobrecarregar a Sesai e tornar a gestão da Saúde Indígena “inexequível”. “Teremos umas 150 comunidades, em reconhecimento, que serão atendidas.” Ele disse ainda que há trabalho de perfuração de poços e tratamento de água, ao justificar um dos vetos. “O que vejo é questão que vai trazer a União alguns deveres que cabem aos Estados e municípios.”

Estadão