PM que pisou pescoço de mulher omitiu o “feito” em relatório

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Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Flagrado por câmeras de telefone pisando e colocando todo o peso de seu corpo sobre o pescoço de uma mulher, o policial que aparece nas imagens omitiu a informação de que a imobilizou com os pés o pescoço da vítima no boletim em que registrou a ação. A mulher prestou depoimento nesta sexta-feira e relatou também socos, chutes e puxão de cabelo, antes de ser pisoteada.

No boletim de ocorrência registrado na 101º DP em 30 de maio, dia da abordagem, o policial é testemunha e acusa a comerciante de resistência, desobediência, desacato e lesão corporal. No documento, ele admite que deu uma rasteira que resultou na perna quebrada da mulher, que passou por uma cirurgia e ainda se recupera das lesões. O PM não cita o pisoteamento. Ele relatou que, após a rasteira, a mulher “caiu da própria altura e ficou no chão” e foi algemada “até que a situação se acalmou” com a chegada de reforços, segundo o registro.

O policial narrou cronologicamente a abordagem e afirmou que teria recebido chutes e socos de dois homens que resistiam à ação. Disse ainda que a mulher teria agredido os policiais com “uma barra de ferro e um rodo”. As imagens divulgadas até agora não mostram os homens agredindo-o ou a barra de ferro.

Em depoimento nesta sexta-feira, a mulher negra de 51 anos — que prefere não ser identificada por temer pela segurança da família — relatou que investiu 3 vezes com um rodo contra o PM, na tentativa de liberar um homem que era agredido pelo oficial e “estava com bastante sangue” e “aparentemente já imobilizado”.

Ela foi então agredida pelo policial com socos no peito, chute na perna, puxão de cabelo e foi jogada contra um veículo antes de ser pisoteada no pescoço e desmaiar quatro vezes. Contou ainda que uma vizinha deitou-se sobre o seu corpo na tentativa de fazer o policial parar com as agressões.

A vítima prestou depoimento no 25º Distrito Policial de Parelheiros, onde corre o inquérito que apura abuso de autoridade pelos policiais envolvidos na abordagem.

Segundo a comerciante, policiais militares foram até o local procurando pelas imagens, após os vídeos que flagraram a agressão começarem a circular em aplicativo de mensagens.

Após a abordagem, o policial foi transferido de batalhão e continuou atuando nas ruas. Segundo a Secretaria de Segurança Pública do governo paulista, ele chegou a ser afastado, mas “por um erro”, acabou retornando às ruas.

O portal UOL revelou que o soldado foi afastado de fato nesta terça-feira, após a reportagem do Fantástico deste domingo, que exibiu as imagens da agressão do policial contra a comerciante.

A informação difere do que foi dito pelo governador João Doria, que, logo após o programa da TV Globo, disse em rede social que as cenas causavam repulsa e que os policiais já tinham sido afastados.

A Secretaria de Segurança Pública também afirmou na segunda-feira, em nota, que “os policiais envolvidos foram afastados e permanecerão fora das atividades operacionais até a conclusão das investigações”. Na última quinta-feira, esclareceu que “constatado o equívoco, foi novamente afastado, situação que permanece até hoje”, sem especificar a data do primeiro e do último afastamento do soldado.

A mulher possui um bar na região de Parelheiros, zona sul de São Paulo, e foi abordada por policiais às 13h do sábado, 30 de maio, após denúncias de que um carro com som alto estaria em frente ao comércio, incomodando a vizinhança. As imagens mostram os policiais rendendo um homem e apontando a arma para outro, além das agressões à comerciante. Segundo a comerciante, elas começaram após tentar defender o dono do carro, que era rendido pela polícia.

Os PMs envolvidos no caso afirmam que foram atacados durante a abordagem e registraram boletim de ocorrência.A comerciante de 51 anos ficou presa na 101º DP de São Paulo durante um dia após a abordagem, com a perna fraturada e lesões no rosto e corpo, e afirma que não foi ouvida pela delegada responsável. Agora responde às quatro denúncias dos oficiais em inquérito.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirmou, em nota, que “não compactua com desvios de conduta de seus agentes e apura rigorosamente todas as denúncias”.

O Globo