Aliados de Dallagnol temem “julgamento punitivo”
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De imediato, o julgamento que pode afastar o procurador Deltan Dallagnol do comando da Lava-Jato em Curitiba acendeu sinal velho no QG da força-tarefa no Paraná, base e origem da maior operação de combate à corrupção já deflagrada no Brasil.
Uma eventual remoção do procurador da coordenadoria do grupo de trabalho representaria mais um golpe na esteira de uma série de movimentos recebidos com preocupação pela força-tarefa – a exemplo do pedido de devassa em seu banco de dados, da proposta de unificação de seus trabalhos sob comando da Procuradoria-Geral da República, em Brasília, ou do escanteamento do Ministério Público Federal do novo protocolo para celebração de acordos de leniência.
O momento desfavorável preocupa não apenas os integrantes da Operação Lava-Jato, mas o conjunto de promotores e procuradores que se dedicam a investigar e denunciar a criminalidade organizada.
Em nome da entidade que representa as categorias, o promotor de Justiça Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), diz que vê com ‘apreensão’ a ofensiva contra Deltan.
“Apreensão de que se tenha um julgamento punitivo. Isso pode representar um grande desestímulo à bandeira de combate à corrupção no País”, avalia. “Desnecessário dizer que a Lava-Jato é um marco de valores e de luta pelo afastamento desse fenômeno tão ruim para nossa República”, completa.
O julgamento de duas reclamações apresentadas pelos senadores Kátia Abreu (PP-TO) e Renan Calheiros (MDB-AL) contra o líder da Lava-Jato, previsto para ocorrer nesta terça, 17, foi suspenso liminarmente na noite desta segunda-feira, 17, pelo ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, que atendeu a um requerimento apresentado por Deltan.
Para Murrieta, os pedidos de afastamento contra o procurador representam uma tentativa de retaliação ao trabalho da força-tarefa e, em última instância, avançam contra a força do Ministério Público Federal para enfrentar a corrupção.
“É um caso muito perigoso para o Ministério Público. Há risco, não só da injustiça pessoal ao próprio Deltan, mas de uma injustiça com toda a instituição. O legislador nos deu independência funcional e inamovibilidade como armas para que para que a gente possa enfrentar situações graves, sérias e complexas, como o combate à corrupção, ao qual a Lava-Jato se dedicou, mas outros também outros problemas, como o tráfico de drogas, por exemplo”, argumenta o promotor.
Na avaliação do presidente da Conamp, é essencial preservar a independência de trabalho dos membros do Ministério Público, o que não deve ser confundido com tentativas de abusos de autoridade.
“Nós temos que ter a liberdade de atuação e não podemos ser amedrontados pela nossa atuação. Não é que nós queremos ter super-poderes. Não é isso. Nós queremos ter a garantir para atuar independente das interferências internas”, defende.
Segundo o promotor, o resultado julgamento que pode afastar Deltan ainda parece ‘imprevisível’, mas o processo é passível de questionamentos uma vez que é um caso ‘excepcionalíssimo’ para o qual o Conselho Nacional do Ministério Público está desfalcado em três membros – sendo duas cadeiras reservadas a servidores de carreira, teoricamente mais propensos a votar em favor da Lava-Jato.
“Esse instrumento da remoção compulsória, no caso dele não seria decorrente de uma sanção disciplinar, mas seria um pedido autônomo. Só foram julgadas pelo CNMP situações de procedimentos administrativos disciplinares onde havia desídia de membros do Ministério Pública, ineficiência. No caso é o inverso. Então, uma situação dessa, tão grave, tão emblemática, com precedente tão raro para se tornar um case, demanda a composição completa do Conselho. Caso contrário, você perde vozes de um colegiado que foi concebido para ter várias influências e várias visões para que se chegue a um julgamento adequado, a um meio termo, vamos dizer assim, de todos os influenciadores de opinião jurídica neste caso”, defende.
Para Murrieta, o Ministério Público Federal está diante do risco eminente de ‘enfraquecimento’ das forças-tarefas que integram a instituição.
“Essas forças-tarefas incomodaram muita gente. Vivemos uma verdadeira revolução no País. Com isso, atingimos também outros interesses. Olhando para outros países, percebemos que também houve um retorno das investidas feitas pelos órgãos de controle”, afirma.