Ativista sueca adolescente vira modelo para jovens brasileiros
Foto: Reprodução/Estadão
Impulsionados pela ativista sueca Greta Thunberg, cerca de 150 jovens brasileiros criaram uma campanha – por meio da organização Fridays for Future (Sextas pelo Futuro) – que já arrecadou quase R$ 900 mil para a proteção de indígenas da Amazônia durante a pandemia do novo coronavírus. Boa parte do grupo ainda cursa o ensino médio e se divide entre aulas e reuniões para fazer atos que desafiam parlamentares, governadores e ministros de Estado. Alguns têm pretensões eleitorais.
O movimento aceita participantes de até 29 anos, mas os seus destaques estão na faixa de 17 a 20. Depois de dezenas de milhares deles irem às ruas na Europa em 2019 contra o aquecimento global, novos atos estão previstos em Bruxelas em setembro contra a ratificação do acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia, aposta do governo Jair Bolsonaro na área econômica.
Um dos participantes do ato é o brasileiro Abel Rodrigues, que se mudou de Belém (PA) para Lisboa em 2018. Aos 20 anos, ele conheceu Greta num evento em Portugal no qual os dois discursaram e decidiu entrar para o Fridays for Future.
“Há uma pressão gigantesca na Europa para que esse acordo seja derrubado porque o Brasil não tem nenhum respeito pela proteção ambiental. As pessoas sabem as consequências negativas que é fazer lobby para rejeitar um acordo econômico desse nível, que pode levar até mesmo à recessão econômica de alguns países do Mercosul, mas a gente sabe que é muito mais urgente e necessário salvar a Amazônia e defender os povos indígenas. O Fridays vai se preparar para ir ao Parlamento e à Comissão Europeia para falar ‘olha, a Europa não pode ratificar esse acordo’”, afirmou Rodrigues.
O paraense vê o Fridays como “um movimento de massas que possui viés científico e faz pressão pública, mas que também é uma massa eleitoral”. “Os políticos esquecem que essas milhares de pessoas, talvez milhões, daqui a dois, três anos já poderão votar. É isso que os políticos estão subestimando ao não querer nos escutar.”
Na semana passada, a Alemanha expressou ter dúvidas sobre a ratificação do acordo Mercosul-UE um dia após uma reunião com Greta e líderes do Fridays for Future. O porta-voz da chanceler Angela Merkel colocou a situação da Amazônia como um dos possíveis empecilhos para o tratado. A ativista do movimento na Alemanha Luisa Neubauer escreveu, no Twitter, que “Merkel concordou com as críticas ao acordo do Mercosul e não pretende assiná-lo”.
Em outubro do ano passado, o estudante Ian Coelho, de 18 anos, entregou pessoalmente o prêmio “Exterminador do Futuro”, como forma de protesto contra o desmatamento na região amazônica, ao ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente). O ato ocorreu em uma audiência no Congresso. Coelho disse manter conversas com integrantes da bancada ambiental e ex-ministros. E já foi sondado por partidos para se candidatar a deputado em 2022.
“Como ministro do Meio Ambiente, Salles é um ótimo ministro do agronegócio. Ele é muito escorregadio, se você não prestar atenção e não souber, você pode cair no papo dele”, afirmou. “Mas é interessante ressaltar que nós, da juventude, não vamos cair. Não é a política ecocida que queremos.” Procurado, o ministério não respondeu até a publicação deste texto.
Segundo Valentina Ruas, de 17 anos, também de Brasília, a presença de ativistas em eventos no Congresso mostra que o grupo “está de olho” no Legislativo. “Acho engraçado que quando a gente vai a esses eventos são vários homens engravatados, mais velhos, e nós somos um monte de jovens.”
No Rio Grande do Sul, Amália Garcez, 17 anos, protocolou com outros jovens uma carta com uma série de demandas destinada ao governador Eduardo Leite (PSDB), como a obrigatoriedade do ensino sobre mudanças climáticas. Um dos seus desafios é conciliar os estudos com a Fridays for Future. “Priorizei muito mais o Fridays do que a aula em si. O que estou fazendo é muito valioso para mim como pessoa e para o mundo, é o que eu posso fazer agora para contribuir.”
Outra integrante do movimento, Iohana Santos, 17 anos, considera que o Fridays é “uma representação de que as pessoas que estão no poder não estão cumprindo o seu papel”, então os jovens precisam agir. “Em um grupo (virtual), alguém manda um vídeo ou uma foto falando algo que está acontecendo e começamos a trabalhar. Se for um incêndio, buscamos formas de mandar água”, disse Iohana, explicando como funcionam as reuniões com pessoas de todas as partes do mundo. Há ativistas de mais de 100 países.
Ao divulgar a campanha SOS Amazônia, os jovens da Fridays for Future deixam claro: não são eles os responsáveis por gerir os recursos. Por não possuírem uma entidade formal, o dinheiro é direcionado para a Fundação Amazônia Sustentável, que o distribuirá para comunidades indígenas e ribeirinhas. Até a semana passada, foram arrecadados R$ 264,6 mil, que, somados aos cerca de R$ 600 mil doados pela própria Greta, chegam perto da meta de R$ 1 milhão.
A participação da sueca na campanha deu mais visibilidade para o Fridays for Future no Brasil. “Se você não puder fornecer grandes quantidades de suprimentos, lembre-se que mesmo as menores ações podem criar um impacto positivo”, diz Greta no vídeo da SOS Amazônia.
O movimento Fridays for Future foi iniciado por Greta Thunberg em 2018, quando a sueca tinha 15 anos. Toda sexta-feira, ela passou a faltar às aulas para protestar na frente do Parlamento e exigir ações a fim de evitar mudanças climáticas. Na Conferência do Clima da ONU do ano passado, questionou como os adultos “ousam” agir de maneira negligente. Chamada de “pirralha” por Jair Bolsonaro, Greta foi escolhida como Personalidade do Ano pela revista Time em 2019.