Ministro da Justiça mantém recusa em entregar dossiê
Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
O Ministério da Justiça e Segurança Pública se recusou a entregar ao Ministério Público Federal (MPF) uma cópia do dossiê elaborado para monitorar grupos antifascistas; disse que este assunto agora é de responsabilidade direta do ministro, André Mendonça; e afirmou que, por essa razão, só aceitará ser oficiado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. A posição da pasta está num documento de 11 páginas encaminhado à Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, que instaurou um procedimento preliminar – chamado notícia de fato – para apurar as circunstâncias da elaboração do relatório de monitoramento de opositores do presidente Jair Bolsonaro.
O dossiê foi produzido pela Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do Ministério da Justiça, na gestão de Mendonça. O relatório lista 579 servidores da área de segurança pública e professores que integram movimentos ou defendem ações contra o fascismo. Os dados dessas pessoas foram enviados a diferentes órgãos de persecução e investigação.
A Seopi integra o Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin). Com a chegada de Mendonça ao Ministério da Justiça, produziu o relatório de monitoramento de grupos antifascistas. Antes, o foco da secretaria era direcionado a ações de inteligência na área de segurança pública, combate ao crime em fronteiras e integração entre polícias.
A existência do relatório foi revelada pelo portal “Uol”. O ministro da Justiça demitiu o diretor de Inteligência, coronel Gilson Libório de Oliveira Mendes, e determinou a abertura de uma sindicância para apurar as circunstâncias da elaboração do dossiê. Na semana passada, O GLOBO questionou o coronel de onde partiu a ordem para a confecção do relatório, se do ministro ou do secretário, ou se foi iniciativa dele próprio.
– Nem que sim, nem que não, nem talvez. Estou em silêncio – limitou-se a responder.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão Enrico Rodrigues de Freitas, com atuação no Rio Grande do Sul, instaurou o procedimento preparatório de apuração, que pode resultar na abertura de um inquérito, e pediu informações ao Ministério da Justiça. Entre os pedidos feitos estava o de encaminhamento de uma cópia do relatório produzido pela Seopi. A pasta se negou a repassar o documento ao MPF. Na semana passada, o ministério também deixou de encaminhar uma cópia do dossiê ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O parecer enviado ao MPF foi elaborado pela consultoria jurídica do ministério, formada por advogados da União. O documento foi encaminhado ao procurador da República pelo secretário substituto de Operações Integradas, Eduardo de Freitas da Silva.
“Não pairam dúvidas de que se revela equivocado o endereçamento da solicitação ao secretário de Operações Integradas, uma vez que, pela evolução dos acontecimentos, a temática foi alçada aos cuidados diretos do ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública”, cita o parecer. O documento afirma que este fato “exige a adaptação e observância dos rigores procedimentais aplicáveis aos ministros de Estado, inclusive nas relações interinstitucionais”.
Assim, conforme a alegação dos advogados do ministério, o secretário de Operações Integradas, o delegado da Polícia Civil do DF Jeferson Lisbôa Gimenes, deixa de ser o responsável “imediato” pela questão. “Não resta alternativa além da devolução do expediente ao procurador da República para que, pelas vias internas adequadas, encaminhe solicitação ao procurador-geral da República (Augusto Aras).” Ministros de Estado têm foro privilegiado junto ao STF. A equipe do ministro da Justiça, assim, pediu que o assunto passe a ser tratado no âmbito desse foro.
O parecer do Ministério da Justiça afirma que a Diretoria de Inteligência da Seopi é a “agência central” do subsistema de inteligência de segurança pública. E que os relatórios produzidos são sigilosos. “Diante da sensibilidade das informações marcadas por elevado grau de reserva, o legislador elaborou um minucioso sistema de controle externo sobre as atividades de inteligência. Não há margem jurídica para o fornecimento dos dados e documentos solicitados pelo procurador da República.”