Principal publicação científica do mundo aprova vacina russa

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Foto: © Sputnik / Assessoria de imprensa do RFPI

Menos de um mês após o registro da vacina russa Sputnik V contra a COVID-19, a mais influente revista científica no mundo, The Lancet, publicou hoje os resultados das primeiras duas fases de testes clínicos do medicamento, algo que era muito aguardado pelos representantes da comunidade científica mundial.

O material publicado responde às críticas de especialistas estrangeiros e traz a tão esperada clareza sobre o desenvolvimento do medicamento pelos cientistas russos.

É válido ressaltar que a Sputnik V, sendo a primeira vacina contra a COVID-19 registrada na Rússia e no mundo, não só é eficaz no combate ao coronavírus SARS-CoV-2 como sua aplicação é segura.

A publicação dos dados da primeira e segunda fases de testes pela The Lancet, segundo afirmam os cientistas do Centro Nacional de Pesquisa de Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya, é o primeiro passo de uma série de publicações sobre a Sputnik V em revistas científicas.

“Em setembro, também serão entregues para publicação os dados completos dos testes da vacina em animais – primatas, hamsters sírios, ratos transgênicos, nos quais a vacina mostrou 100% de eficiência (os resultados nos primatas e hamsters sírios foram obtidos antes dos testes clínicos). Os primeiros resultados dos testes clínicos pós-registro [terceira fase], com a participação de 40 mil voluntários, serão publicados em outubro-novembro”, disseram os desenvolvedores da vacina, Aleksandr Gintsburg e Denis Logunov, do Centro Gamaleya.

Uma das principais conclusões a que os cientistas do Centro Gamaleya chegam no artigo científico é a segurança da vacina. De acordo com os resultados dos testes clínicos da primeira e segunda fases, não foram detectados pelos especialistas efeitos indesejados graves da vacinação por nenhum dos critérios de avaliação.

Nem todas as outras vacinas contra a COVID-19 podem se orgulhar de tamanho sucesso, algumas delas acabaram trazendo efeitos indesejados graves em 25% dos vacinados.

Na publicação foram também apresentadas provas científicas da eficiência da vacina Sputnik V.

Como exemplo, é comprovada sua capacidade de gerar uma resposta imunológica duradoura do organismo em 100% dos vacinados graças à tecnologia única de aplicação em duas etapas.

Denis Logunov, vice-diretor do Centro Gamaleya, garante que se observa imunidade humoral e resposta imunológica celular em 100% dos vacinados, o que é suficiente para proteger o ser humano de forma eficaz contra a infeção pelo coronavírus.

“O nível de anticorpos nos voluntários vacinados foi 1,4-1,5 vezes maior do que nas pessoas que adoeceram e venceram a doença. Como comparação, a empresa farmacêutica britânica AstraZeneca obteve um nível de anticorpos nos voluntários vacinados praticamente igual ao nível de anticorpos daqueles que adoeceram após infecção pelo coronavírus”, publicou a revista, citando Logunov.
Da mesma forma, o Centro Gamaleya afirma que, no contexto dos testes clínicos da Sputnik V, em todos os voluntários se desenvolveu a imunidade celular T, representada tanto por células CD4+, como por células CD8+.

Estas células permitem reconhecer e destruir as células infectadas pelo coronavírus.

Um dos maiores receios da comunidade científica em relação ao uso de vacinas na base de vetores de adenovírus do ser humano – é este precisamente o método usado pela vacina Sputnik V – seria a existência anterior em algumas pessoas de imunidade em relação aos adenovírus.

Em outras palavras, havia o receio de que esta imunidade não deixasse entrar no organismo a quantidade necessária de adenovírus humano,que na vacina exerce a função de “táxi”, levando às células o material genético da membrana externa do coronavírus (é bom lembrar que a vacina Sputnik V não contém o próprio coronavírus, o que excluiu completamente a possibilidade de infecção).

Considerando que as pessoas habitualmente adoecem por adenovírus (um exemplo é o simples resfriado), nelas pode se formar imunidade, a qual teoricamente poderia reduzir a eficiência da vacina, que usa adenovírus como vetor.

Os resultados dos testes acabaram mostrando o oposto: a imunidade pré-existente não influencia a eficiência da vacinação.

“Foi escolhida uma dose segura ótima, a qual garante resposta imunológica eficaz em 100% dos vacinados, até naqueles que tiveram há pouco tempo uma infecção por adenovírus. Isso acaba por reduzir a necessidade de desenvolver novas vacinas na base de plataformas não verificadas”, diz-se na publicação.
Tais plataformas não verificadas têm sido desenvolvidas por algumas empresas ocidentais devido aos receios sobre os adenovírus humanos, segundo especialistas russos. Algumas delas, como exemplo, a tecnologia mRNK (vacina da empresa Moderna) ou o adenovírus de chimpanzé (vacina da empresa AstraZeneca), nunca antes foram utilizadas para a criação de vacinas registradas.

Tais medicamentos necessitam de testes a longo prazo devido aos receios de sua influência na função reprodutiva do organismo, além de possíveis propriedades cancerígenas elevadas, capazes de provocar doenças oncológicas.

Na revista The Lancet, os cientistas russos apresentam referências aos testes de segurança da plataforma na qual a vacina Sputnik V está baseada.

“Assim, desde 1953 no mundo já foram feitos 250 testes clínicos e publicados mais de 75 artigos internacionais, os quais confirmam a segurança das vacinas e remédios desenvolvidos nesta base […] Os medicamentos na base de vetores de adenovírus humanos são usados na prática há mais de 15 anos. É o caso da vacina contra o vírus Ebola e o medicamento contra o câncer Gendicina, usado na China há mais de 12 anos”, explicou Denis Logunov.
Tecnologia única de 2 vetores
Uma das particularidades da vacina russa, segundo o acadêmico e diretor-geral do Centro Gamaleya, Aleksandr Gintsburg, é o uso de dois adenovírus – os sorotipos 5 e 26 – em duas injeções separadas.

Atualmente, a vacinação dupla é reconhecida por muitos especialistas como fator capaz de fortalecer substancialmente a imunidade contra o coronavírus.

Contudo, se usarmos o mesmo vetor nas duas injeções, o sistema imunológico inicia um mecanismo de defesa e começa a rejeitar o medicamento na segunda injeção.

A utilização de um segundo vetor resolve o problema completamente, ajudando a evitar esse efeito neutralizante.

Centro Gamaleya versus AstraZeneca
Se, por um lado, alguns criticam o fato de a vacina russa ter sido testada em um pequeno número de voluntários, os cientistas ressaltam que conseguiram testar o sistema de duas injeções em um grupo de pessoas mais amplo do que, por exemplo, fez um dos líderes no desenvolvimento de outra vacina contra a COVID-19, a empresa AstraZeneca.

A gigante britânica utilizou quatro vezes menos voluntários na primeira e segunda fases para a determinação da eficiência de duas injeções de sua vacina.

“A quantidade de participantes nos testes clínicos da vacina russa Sputnik V na primeira e segunda fases, quando se utilizaram duas injeções, foi quatro vezes maior do que o número de pessoas inoculadas com duas injeções na AstraZeneca”, explicou o diretor-geral do Fundo Russo de Investimentos Diretos (RFPI, na sigla em russo), Kirill Dmitriev.
Tecnologia única e segura
Na semana passada, a Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA, na sigla em inglês) dos EUA anunciou a possibilidade de recorrer ao procedimento acelerado de registro de vacinas candidatas nas condições da situação epidemiológica atual, ou seja, sem a necessidade de realização da terceira fase de testes clínicos em dezenas de milhares de voluntários.

A possibilidade de o mesmo acontecer no Reino Unido foi discutida pelo governo do país.

Contudo, os órgãos reguladores nestes países ressaltam a possibilidade de registro acelerado somente para vacinas que já comprovaram sua eficiência e segurança.

Na opinião dos especialistas russos, existem poucos medicamentos capazes de atender a tais exigências.

“No dia de hoje, a única tecnologia que corresponde a tais critérios é a plataforma na base de vetores de adenovírus humanos. Ela já comprovou sua segurança em inúmeros testes ao longo de décadas”, considera Kirill Dmitriev.
Publicação como ‘resposta final’
De acordo com Dmitriev, a publicação dos dados da vacina russa na revista The Lancet é a resposta final às críticas feitas à Rússia após o registro da Sputnik V em agosto passado.

“Agora a Rússia, por sua vez, pode fazer algumas perguntas à comunidade internacional. Apelamos para a publicação dos dados oficiais que comprovem a eficiência duradoura das vacinas na base do adenovírus de chimpanzé ou mRNK, a ausência de riscos cancerígenos e efeitos colaterais na fertilidade durante sua aplicação. Não seria também nada mau saber a razão pela qual a AstraZeneca insiste em recusar judicialmente sua responsabilidade em caso de efeitos colaterais”, acrescentou.

Sputnik