TRE-SP vê abstenção como ameaça às eleições

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: TRE-SP-4/3/2020

Diante de pesquisas que mostram que algumas pessoas admitem não votar nas eleições municipais deste ano por medo de contaminação pelo novo coronavírus e da possibilidade de um recorde de abstenções, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP), desembargador Waldir de Nuevo Campos Júnior, faz um apelo aos eleitores. “Votando, o eleitor estará zelando pela saúde da nossa democracia. O mais importante é evitar a abstenção”, disse ele em entrevista ao Estadão.

De acordo com a última pesquisa Ibope, feita a pedido da Associação Comercial em parceria com o Estadão, 20% dos entrevistados dizem estar em dúvida sobre ir votar e 8% afirmam que não vão comparecer.

No primeiro dia de campanha, vimos que houve aglomerações em atos de alguns candidatos. Como eles devem agir em função da pandemia?
Veja bem, os candidatos não estão proibidos de praticar atos de campanha. A intervenção, quer da autoridade administrativa, quer da autoridade eleitoral, é excepcional e tem que ser de um laudo técnico que não pode ser municipal. Tem que ser estadual ou federal. Portanto, os partidos e candidatos devem ter muita cautela e consciência para não promover aglomerações. Hoje, existe a possibilidade do comício virtual, que eu acho que deve ser o preponderante nestes casos.

Os candidatos que causarem aglomerações podem sofrer algum tipo de punição?
Evidentemente que o candidato que promova algo neste sentido e cause prejuízo a alguém pode sofrer uma responsabilização não só eleitoral, mas civil e, eventualmente, até criminal por conta do contágio. Mas, na esfera eleitoral, o que se verifica é que se tomou muita cautela para que não houvesse interferências indevidas. Até porque eventuais gestores municipais, não por má-fé, podem ter uma percepção muito particular, mais aguda ou menos aguda, sobre o momento da pandemia no local. Para evitar interferências indevidas não foi proibido, mas os candidatos e partidos devem ter muita cautela e bom senso.

Pesquisas mostram que eleitores admitem não votar por medo de contaminação. A pandemia vai provocar aumento da abstenção na eleição?
Foram desenvolvidos controles razoáveis. Então, aqui fica o meu pedido aos eleitores. Tenham certeza de que se todos respeitarem as regras sanitárias nós estaremos velando pela saúde de todos. E votando o eleitor estará zelando pela saúde da nossa democracia. O mais importante é evitar a abstenção.

Está havendo um aumento da judicialização eleitoral nos últimos anos?
A judicialização é natural nas campanhas. Não digo que seja excessiva, mas o que está havendo é um controle interno entre os próprios atores do processo político porque temos uma legislação bastante restritiva para garantir a isonomia entre os candidatos. Porque o poder econômico desequilibra, o poder de autoridade desequilibra, o uso das redes sociais também. Quanto mais restritiva for a legislação, maior será a margem de judicialização.

As campanhas têm demonstrado muitas dúvidas sobre a aplicação da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) nestas eleições. Como esta lei será aplicada? O TSE deve fazer a normatização?
A Lei das Eleições, quando trata da propaganda na internet, delega a normatização mais pormenorizada ao TSE. A disposição expressa é que o candidato poderá fazer propaganda “por meio de mensagem para endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, partido ou coligação observadas as disposições da LGPD”. Isso está expresso. Não temos regulamentação mais específica. Sei que há uma discussão muito grande se é uma lei que muda o processo eleitoral ou não, se ela seria aplicável agora ou só no próximo. A questão é a seguinte: se está em vigência é uma lei que deve ser observada. O regramento normativo tem que vir do TSE.

O Estadão publicou um levantamento mostrando que só 13% dos candidatos a prefeito são mulheres. A grande maioria ainda é de homens brancos. A política de cotas está funcionando?
Esta seria uma opinião muito subjetiva, mas me parece que tudo tem levado no sentido de buscar essa paridade. Afinal de contas, as mulheres são maioria na sociedade e entre os eleitores. É preciso que haja reflexo na representação política. Com relação ao gênero foi estabelecida uma cota e os partidos têm que cumprir. Quanto aos negros, não temos uma cota, mas a necessidade de paridade na distribuição dos recursos.

De alguns anos para cá a desinformação é cada vez mais uma ferramenta de disputa política, em alguns casos contra a própria Justiça Eleitoral com mentiras sobre as urnas eletrônicas. O que está sendo feito para evitar que isso ocorra?
A Justiça Eleitoral não é mediadora da verdade. Além disso, o tempo da Justiça nem sempre é suficiente para evitar a distorção dos fatos. A atuação deve ser plural através de uma educação midiática. O ministro (Luís Roberto) Barroso (presidente do TSE) está buscando junto às redes sociais parcerias e providências para evitar a disseminação em massa da desinformação. Hoje há índices que mostram que o eleitor já tem uma boa noção desta realidade. O problema é que temos profissionais e empresas com um refinamento muito grande da formatação via algoritmos dessas fake news. É preciso que o eleitor esteja atento, se preocupe com a origem, a autoria, verifique principalmente junto aos grandes meios de comunicação. É preciso que o eleitor esteja com a guarda sempre a postos para não ser ludibriado por uma fake news.

Faltam mecanismos legais mais eficazes de controle público sobre as plataformas usadas para disseminação de desinformação?
Até o ano passado eu era corregedor do TRE-SP e nessa condição participei daquele grupo de enfrentamento à desinformação criado pela ministra Rosa Weber (ex-presidente do TSE). Discutimos muito. Eu sempre defendi que só a legislação não resolve. Precisamos que as empresas públicas e privadas tenham controles internos. Quer seja os meios tradicionais quer sejam as redes sociais mas creio que as redes sociais estão hoje muito mais envolvidas por problemas que ocorreram no mundo inteiro. É preciso, sim, ter uma legislação rígida, mínima e que seja aplicada com rigor. Mas só a legislação sem a educação midiática e sem essas parcerias será indiferente.

A desinformação e as novas formas de comunicação colocam a democracia em risco?
Não. A democracia não está em risco, pelo contrário. As novas formas democratizaram a informação. Hoje não existe mais chance de abafar um caso rumoroso. Estamos vivendo um momento extremamente importante das comunicações sociais. No entanto elas trouxeram este risco. Fake news existe desde que o homem é homem, agora com as redes sociais fica difícil de controlar. É preciso uma conscientização da sociedade para que isso seja minimizado. Pesquisas no exterior mostram que onde a polarização não se instala de forma importante por conta dessa consciência da sociedade as fake news perdem espaço.

Estadão