Cientista político vê demonização da política em baixa

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Reprodução

O cientista político Jairo Nicolau acredita que o sentimento antipolítica que ajudou a onda bolsonarista em 2018 retrocedeu nos últimos dois anos. Nicolau, que participou ontem da “live” do Valor, afirmou que as eleições de 2016 e 2018 foram momentos de ruptura e de recusa para com uma parte da elite política tradicional, mas que atualmente já se observa um movimento em sentido contrário.

“Acho que uma parte da velha política está voltando, os que conseguiram sobreviver, e eu vejo também jovens políticos concorrendo, mas que parecem os políticos tradicionais em alguns Estados. Não vejo mais a retórica que foi cultivada pelo Novo, pelos movimentos de renovação e até pelo bolsonarismo”, disse Nicolau, que é professor da Escola de Ciências Sociais da FGV/Cpdoc.

Para ele, um bom indicador desse movimento é o fato de o candidato Eduardo Paes (DEM) estar liderando as pesquisas para a Prefeitura do Rio de Janeiro, cidade que segundo Nicolau é a “terra da antipolítica” e local onde o presidente Jair Bolsonaro teve “o desempenho mais impressionante” nas eleições de 2018.

“Minha impressão é que a gente está voltando um pouco à velha ordem”, ponderou.

O cientista político ressaltou que o eleitor aprendeu nos últimos dois anos que “renovar por si só não é um bem”. “A renovação da bancada do PSL e a renovação de alguns governadores significaram um desastre nas políticas públicas, na qualidade da representação. O eleitor vendo isso, começa a fazer uma conta, que o problema não é a renovação, o problema não é o tempo que o político tem de vida pública, mas sim a qualidade, a dedicação, o que ele tem para mostrar. Talvez a gente chegue a um ponto mais de equilíbrio nessa eleição”, frisou.

Em 2018, esse sentimento antipolítica foi responsável, segundo Nicolau, pelo resultado “mais surpreendente” da história política do país, com a vitória de Bolsonaro. Nicolau ressaltou que Bolsonaro era um político “medíocre do ponto de vista da atividade parlamentar”, estava “há muito tempo na pista” e não era um político novo ou “uma liderança que emerge”. Além disso, frisou, as condições em que concorreu eram adversas, com recursos muito pequenos, partido pequeno, pouco tempo de televisão e gastos semelhantes aos de um deputado federal.

“Todas as apostas eram na direção de que ele seria mais um candidato ‘outsider’, um candidato fora do sistema, pela retórica e não pela biografia, e com um resultado de nicho, muito provavelmente. Eu próprio apostava que ele tinha muito mais uma vocação de ser um eterno deputado federal, o que a gente chama de vocação para cargos proporcionais, e não o candidato que teve a votação estupenda que ele teve, candidato que teve a maior votação que um candidato já teve em São Paulo”, disse. “Por isso ele merece esse título ou a eleição de 2018 merece o título de uma eleição que elegeu o candidato com o perfil mais surpreendente da nossa história das eleições democráticas desde 1945.”

O cientista político disse ainda que a pandemia poderá colaborar para que a taxa de reeleição de prefeitos este ano seja alta, uma vez que o cenário de necessidade de ações contra a covid-19 colocou os prefeitos na linha de frente, aumentando a exposição dos governantes em pleno ano eleitoral. Além disso, ele estimou que o pleito deste ano será o começo de um processo que levará a fusões entre partidos menores, uma vez que o fim das coligações criará um cenário difícil para a sobrevivência de partidos pequenos.

“Estamos no meio de um processo de reforma partidária que eu acho que vai ser a mais profunda que a gente viveu desde a redemocratização”, disse Nicolau. “O fim das coligações por incrível que pareça vai gerar um efeito devastador sobre a vida de alguns partidos em pequenos municípios”, frisou.

Valor Econômico