Decreto de Bolsonaro desmonta política de educação inclusiva
Foto: Gustavo Bezerra/Arquivo
Documento, assinado na última quarta-feira (30/09) por Jair Bolsonaro, institui uma nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE), de forma autoritária, destruindo a política pública que foi construída democraticamente em defesa da educação inclusiva.
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O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) denuncia os retrocessos e desmontes propostos por Bolsonaro à Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva no País. Um decreto, publicado na última quarta-feira (30/09), do presidente Jair Bolsonaro a respeito de uma nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE), de forma autoritária, destrói a política pública que foi construída democraticamente em diálogo com pais, educadores e gestores da educação no Brasil.
Segundo o parlamentar é inaceitável que o presidente Jair Bolsonaro acabe, por um ato autoritário e unilateral, com uma política que só trouxe benefícios para as crianças, adolescentes e jovens com deficiência de todo o País. “Esta concepção de segregação e exclusão das pessoas com deficiência não pode ser aceita pela comunidade educacional e nem tolerada pela sociedade brasileira”, afirmou.
A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – incorporada no Brasil com status de norma constitucional – determina que as pessoas com deficiência não podem ser excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência, e que devem receber o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação.
Ao longo dos governos Lula e Dilma, as políticas de educação especial elaboradas sob a perspectiva inclusiva, construídas com setores da sociedade civil, educadores e gestores de educação, romperam paradigmas e avançaram, enormemente, com resultados efetivos sobre o acesso e a participação destes estudantes no ensino comum. Além disso, cabe destacar que o tema esteve em destaque na Conferência Nacional de Educação Básica (CONEB) e na Conferência Nacional de Educação (CONAE) vindo a subsidiar as propostas para o Plano Nacional de Educação (PNE).
Em 2007, quando o então ministro da educação Fernando Haddad apresentou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) as políticas de educação especial na perspectiva inclusiva passaram a ter um financiamento destacado e uma maior capilaridade no território nacional, com destaque para o financiamento de ações voltadas à acessibilidade em suas diferentes esferas, na formação de educadores, e na estrutura para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contra turno do ensino regular.
O destaque no financiamento para esta modalidade de ensino esteve presente também desde a elaboração e no texto final do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).
Em 2008, o MEC implementou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva propondo mudanças de valores, atitudes e práticas educacionais para atender a todos os estudantes, sem nenhum tipo de discriminação, assegurando uma educação de qualidade, as matrículas das pessoas com deficiência nas escolas regulares bateram recordes. De acordo com o Censo Escolar/Inep, entre 2003 e 2017 o acesso à escola regular de estudantes que antes cursavam a educação especial evoluiu de 504 mil matrículas para a 1,06 milhão.
Em todo o Brasil, foram implantadas mais de 42 mil salas de recursos multifuncionais, com foco na acessibilidade, contendo equipamentos, materiais pedagógicos, recursos e mobiliários, abrangendo 93% dos municípios. Também foram destinados recursos para projetos de acessibilidade física para 57 mil escolas públicas, além da aquisição e entrega de 1.874 ônibus para o transporte escolar acessível.
Entre 2003 e maio de 2016, a partir da adesão de secretarias estaduais e municipais de educação, foram efetuados amplos investimento em ações de inclusão e acessibilidade nas redes públicas de ensino. Também foi instituído um duplo aporte de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) garantindo valores adicionais para o atendimento educacional especializado dos estudantes matriculados em escolas regulares.
Entre 2007 e 2014, um total de 98.550 educadores em todo o País também receberam formação na área, por meio do Programa de Formação Continuada de Professores na Educação. Pelo menos 30 universidades contam com a oferta de cursos de Letras/Língua Brasileira de Sinais (Libras), com 2.250 vagas anuais para professores e tradutores/intérpretes.
Em termos recursos financeiros, os investimentos públicos ultrapassam a centenas de milhões. Foram cerca de R$ 314 milhões aplicados na aquisição e entrega de 2.307 veículos de transporte escolar acessível para 1.437 municípios brasileiros. Outros R$ 522 milhões foram destinados a 57,5 mil escolas públicas para a implementação de projetos voltados à acessibilidade desses espaços e a instalação de núcleos e ações de acessibilidade na educação superior demandou, ainda, um investimento de R$ 53,6 milhões.
O Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (LEPED/FE/Unicamp) apresentou manifesto em repúdio ao desmonte da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI/2008). “O referido documento faz retroceder todos os esforços empreendidos no país para que o estudante público-alvo da Educação Especial não mais fosse vítima da violência que se constitui a segregação escolar”, diz o documento.
O Leped assegurou, por meio do manifesto, que não permitirá que a Constituição Federal de 1988 seja desconsiderada, descumprida e renegada em seus preceitos educacionais, uma vez que seu texto define o acesso à escola comum como um direito indisponível do aluno, do qual a família e o Estado são os guardiões; que o aluno público-alvo da Educação Especial seja excluído e discriminado no sistema educacional brasileiro; que sejam ofuscados ou esquecidos os ganhos obtidos pelos alunos que, em razão da inclusão escolar, puderam seguir trajetórias de vida jamais imaginadas no tempo em que eram vigentes no país a concepção que agora o governo federal busca desenterrar; e que seja interrompido o movimento de inclusão na educação básica que permitiu ao Brasil ampliar, de maneira inédita, o acesso desse público ao nível superior.
Infelizmente não é de hoje que o governo Bolsonaro tem tentado destruir a educação inclusiva no país. Em dezembro de 2019, o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (LEPED/FE/Unicamp) denunciou a tentativa do governo federal de impor mudanças na atual política.
O governo golpista de Michel Temer também tentou implementar uma nova política, mas foi barrado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, recomendando que o Ministério da Educação se abstivesse de produzir qualquer alteração na PNEEPEI que estivesse em desconformidade com os parâmetros constitucionais e legais que tratam do tema. Em junho de 2018 o LEPED e a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD) levaram ao MEC uma carta com reinvindicações para a manutenção e fortalecimento da PNEEPEI.
Em fevereiro de 2020, a pesquisadora da Faculdade de Educação da Unicamp Meire Cavalcante, em entrevista à Rádio Brasil Atual, alertou que o Ministério da Educação, com o pretexto de “atualizar” a atual Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, tentava destrui-la.