Mourão nega projeto de nova Constituição
Foto: Marcello Casal/Agencia Brasil
O Palácio do Planalto buscou se afastar da intenção do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), de apresentar um projeto de um plebiscito para a elaboração de uma nova Constituição. A pretensão do parlamentar foi manifestada no início da semana, mas, diante da repercussão negativa, integrantes do governo preferiram se distanciar da ideia. Ontem, após a proposta ser alvo de críticas de parlamentares e juristas, o vice-presidente Hamilton Mourão descartou qualquer envolvimento do Executivo. Já a Ordem dos Advogados Brasil (OAB) divulgou parecer afirmando que a convocação de uma consulta popular para tratar do tema não tem respaldo na legislação.
Mourão lembrou que o assunto foi abordado no momento da corrida eleitoral e entende que não cabe no debate político. “Isso aí (nova Constituição) já me pronunciei durante a campanha. Não tem mais o que falar porque a posição do governo, hoje, não é essa”, afirmou. O vice destacou que o presidente Jair Bolsonaro não falou sobre o assunto em “nenhum momento”. “O líder do governo é um parlamentar. Ele tem outras prerrogativas diferentes de quem é, como no meu caso aqui, vice-presidente eleito com o presidente Bolsonaro, que em nenhum momento tocou nesse assunto”, completou.
Indagado se o momento atual permitiria a construção de uma nova Carta, Mourão disse que existem opiniões divergentes sobre o assunto. Segundo ele, alguns acreditam que possível “paulatinamente” melhorar a Constituição por meio de emendas, enquanto outros desejam “voltar tudo para a estaca zero” e elaborar um novo documento.
Interlocutores do Executivo afirmam que apoiar a proposta de Barros seria criar desgaste para o governo com o Congresso. “Bancar essa história seria dar um tiro no pé. A repercussão com o Legislativo ia ser imediata e não conseguiríamos avançar com outras propostas”, afirmou uma fonte no Planalto, ouvida pelo Correio.
Para a OAB, um eventual plebiscito seria “ruptura da ordem constitucional” e “agressão” à democracia. “Em nossa ordem constitucional, o plebiscito constitui um instrumento de democracia direta enquanto via de participação popular nos negócios públicos. Não pode ser desvirtuado para servir de facilitador a uma tentativa de mudança inconstitucional da Constituição. Não há substrato histórico, jurídico, político ou social para se afastar a Constituição de 1988 no atual contexto brasileiro”, destacou a entidade.
E acrescentou: “A literatura constitucional contemporânea tem destacado a existência de formas de fragilização da democracia e do constitucionalismo por dentro das próprias regras democráticas e por meio de mecanismos formalmente legítimos, mas que são manuseados com fins autoritários. A defesa da democracia brasileira passa, invariavelmente, pela defesa da ordem constitucional em vigor”, alertou.
O jurista e especialista em Direito Constitucional Acácio Miranda classificou como “perigosa” a possibilidade de se discutir uma nova Constituição. “Seria inoportuno, em um momento como este, chamarmos para o debate sobre uma nova constituinte”, explicou.
O jurista afirma que, a partir do momento que a discussão fosse aberta, qualquer regime poderia ser aplicado para o Brasil. “A atual Constituição seria rasgada. A depender de quem fossem os constituintes, até um regime totalitário poderia ser estabelecido”, alertou.
Barros se inspirou na convocação de uma assembleia constituinte no Chile para elaborar um projeto de lei que ainda não foi apresentado. O advogado Bruno Salles Ribeiro, mestre em direito pela Universidade de São Paulo (USP), destaca que a situação política e jurídica brasileira e chilena são diferentes. “O Brasil não precisa de uma nova constituição. A do Chile era uma constituição atrasada. O movimento chileno não tem nada a ver com a nossa realidade. No Brasil, a Constituição foi promulgada após uma ditadura, e é uma Carta considerada uma das mais avançadas do mundo, que garante direitos e deveres”, observou.
Enquanto o governo tenta desvencilhar sua imagem da proposta, Barros afirma que a repercussão com sua base de eleitores foi positiva, portanto pretende protocolar um projeto de decreto legislativo (PDC) para a realização do plebiscito. O parlamentar alega que já tem um texto pronto, que precisa apenas de ajustes nas datas propostas para a realização da consulta popular. A ideia inicial era que a consulta fosse nas eleições municipais deste ano para, em 2022, ter uma Assembleia Constituinte.
O líder do governo argumentou de que a Carta Magna transformou o Brasil em um “país ingovernável”.