Relator da 2a instância quer convencer Maia a aprovar votação
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata do cumprimento da pena após condenação em segunda instância, o deputado Fábio Trad (PSD-MS) avalia que o texto em tramitação na Câmara ainda passa por um processo de “desinformação”. O tema voltou ao centro dos debates no Congresso após o traficante André do Rap ser solto, mesmo com a condenação de magistrados de segundo grau. Em entrevista ao GLOBO, o parlamentar vê como positiva a disposição do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em votar o assunto em plenário ainda este ano. Mas, para isso, entende que a PEC deve ser analisada ainda este mês em comissão especial.
Para que isso ocorra, a Câmara precisa aprovar um projeto de resolução para que as comissões sejam instaladas. Os colegiados estão inativos desde o início da pandemia, quando os deputados adotaram o sistema remoto de votação.
Leia a entrevista a seguir:
Quais são os próximos passos para a PEC avançar?
Acabei de fazer uma reunião agora com o Alex Manente (autor da PEC original) e Marcelo Ramos (presidente da comissão especial). Decidimos pedir ao presidente Rodrigo Maia que nos receba na terça-feira, na residência oficial, para que possamos incluir no projeto de resolução (para recriação de comissões) uma cláusula que permita a ele, presidente, instalar qualquer comissão.
Por que a PEC não avança na Câmara?
Não consigo identificar a razão exata da dificuldade de se pautar a PEC da segunda instância, mas vamos continuar pedindo. E, é claro, vamos aproveitar a manifestação do presidente Rodrigo Maia de que votará a PEC até o final do ano.
O Congresso tem legislado no sentido de privilegiar os direitos de defesa. Por que, neste caso, poderá ser diferente?
A PEC ainda está sofrendo um processo de desinformação por parte de muitos parlamentares que ainda estão supondo que ela se refere apenas à questão penal ou que pode retroagir. Na verdade, ela tem uma outra dimensão, pois é extensiva a todas as áreas do direito. Também só irá incidir sobre os processos iniciados após a sua promulgação. O Brasil é o único país no mundo em que, para se concretizar uma decisão, a parte pode se utilizar de quatro graus de jurisdição, retardando indefinidamente a efetividade do processo. Então, na medida em que os parlamentares forem se informando melhor a respeito do conteúdo desta PEC, que não tem nada a ver com a primeira proposta apresentada, vamos avançar para aprovar.
É provável que a proposta ainda seja alterada?
Na comissão, transcorreu o tempo de apresentação de emendas. Em plenário, só acho que poderia ser alterada se não for desidratada a essência dela. Por exemplo, uma alteração que, na minha visão, desnaturaria a essência da PEC: fazer o trânsito em julgado na terceira instância, o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Perde o sentido da PEC. Então, isso está fora de cogitação.
Como vai funcionar a súmula vinculante do STJ?
O Superior Tribunal de Justiça, hoje, não tem a atribuição de editar a súmula vinculante como o Supremo o faz. A ideia é dar ao STJ essa atribuição, porque a lei federal infraconstitucional precisa ser padronizada. A interpretação dela precisa ser unificada. Como haverá o trânsito em julgado logo depois da segunda instância, nós não queremos que as decisões dos tribunais locais sejam diferentes das decisões do STJ. Qual é a vantagem dessa ideia? Dar mais mais segurança jurídica, estabilidade e segurança no Direito.
Há pressão de empresas? Elas terão menos recursos para contestar débitos tributários.
Nenhuma pressão. Lembro que a PEC só incidirá sobre os processos iniciados após a promulgação. Portanto, é verdade, muitas empresas terão que desembolsar valores no caso de serem derrotadas na segunda instância. Mas elas terão tempo para se adequar a essa nova realidade. Até chegar à segunda instância, as empresas terão tempo suficiente para se adaptar a essa nova realidade. Também temos que lembrar: muitas empresas vão receber créditos com mais celeridade. As empresas não estão somente no polo passivo. Elas estão no polo ativo. Por isso, o que vai acontecer é um choque de efetividade no sistema.
Como vê o caso André do Rap?
A responsabilidade, a meu ver, neste caso, é do juiz da primeira instância que não aplicou a lei (e renovou a prisão preventiva). Vamos admitir que a PEC tivesse sido aprovada e a ação penal do André do Rap fosse iniciada depois da promulgação da PEC. Aí, sim, não haveria esse problema todo, porque ele já estaria cumprindo a pena em definitivo. A despeito da condenação em segunda instância, ele ainda não estava cumprindo a pena. Portanto, a PEC é um exemplo. Se estivesse em vigor, não resultaria em desdobramentos tão polêmicos.
Como será a tramitação do texto em comissão especial?
O ideal seria votar na comissão especial este mês, porque aí teríamos novembro e dezembro para a articulação política. Assim, poderíamos viabilizar a aprovação em plenário. Precisamos de 308 votos. A nossa aflição é que o presidente Maia paute muito próximo do recesso em dezembro. E aí, corremos o isco de não votarmos em segundo turno, ou alguma coisa ficar pendente. Se houver votação neste mês na comissão, teremos tempo para articular com os líderes. Nós temos o receio de que votando tudo de sobressalto, na comissão especial e um dia depois em plenário, termos dificuldades para um acordo.
Há alguma resistência no Senado?
A única resistência que diagnostiquei diz respeito à veiculação normativa. Alguns senadores eram contrários à PEC e preferiam resolver a questão por meio de projeto de lei. Mas, como a PEC avançou, está pronta para ser votada, não me parece que haja mais resistência.
O mais recente indicado ao STF, Kassio Marques, disse que respeitará a vontade do Congresso sobre o assunto. O que achou?
Muito positiva a declaração dele. Nós já sabemos que a execução da pena após condenação em segunda instância é facultativa, e não obrigatória. Mais uma razão para que a gente delibere. Caso o Parlamento se omita nesta questão, haverá insegurança jurídica, ela persistirá.
Caso seja aprovada a PEC, o assunto será pacificado no STF?
Nada impede que alguém ingresse com uma ação de inconstitucionalidade, mas não creio que o Supremo, diante de deliberação congressual de uma emenda constitucional, vá se contrapor a uma vontade do Legislativo.