Malandragens de Trump expuseram problemas eleitorais nos EUA

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 Foto: MANDEL NGAN / AFP / 24-11-2020

Enquanto os esforços do presidente Donald Trump para reverter o resultado da eleição se desintegram, os Estados Unidos parecem ter escapado do cenário apocalíptico que se especulava no epílogo da campanha. Desde 3 de novembro, não houve tanques nas ruas ou protestos disseminados, não houve qualquer intervenção descarada do Judiciário ou de um Legislativo estadual com motivações políticas. A vitória óbvia de Biden se sobrepôs às teorias de conspiração promovidas por Trump e sua enxurrada de processos sem embasamento.

No fim — e com a batalha pós-eleitoral instigada por Trump e seu partido nos tribunais também se encerrando — os ataques do presidente à eleição foram um anticlímax. Foram marcados não por convulsões políticas, mas pela carta de uma burocrata desconhecida nomeada pelo presidente, Emily Murphy, da Administração dos Serviços Gerais, autorizando a transição formal do governo para Joe Biden.

Desta vez, o país parece ter evitado o colapso de seu sistema eleitoral. Da próxima, os americanos podem não ter a mesma sorte.

Mesmo sendo evidente que a missão do presidente de subverter a escolha popular tenha fracassado, ela expôs fissuras na estrutura da democracia americana e abriu caminho para disrupções ou até mesmo desastres futuros. Com manobras legais mambembes, Trump conseguiu bloquear a passagem de poder por boa parte de um mês, tendo a submissa indulgência republicana e causando medo e frustração entre os democratas.

Ele, contudo, nunca chegou perto de sua meta, pois autoridades estaduais resistiram a seus esforços de eliminar grandes quantidades de votos legais e juízes rejeitaram de imediato os pedidos sem fundamento da equipe jurídica do presidente.

Ben Ginsberg, o advogado republicano mais proeminente de sua geração, disse duvidar que outro candidato vá tentar replicar, passo a passo, o que Trump fez. Poucos, ele crê, vão considerar Rudy Giuliani e Sidney Powell — os rostos da cruzada do presidente — como autores de um novo e engenhoso manual.

— Em alguns meses, olharemos para trás e veremos que a estratégia de Trump foi, simplesmente, um fracasso total — disse Ginsberg, que representou o ex-presidente George W. Bush na disputa eleitoral de 2000. — Mas o sistema passou por um teste de estresse como nunca antes.

Este teste, ele crê, revelou um número suficiente de cláusulas vagas e brechas na lei eleitoral americana para que uma crise seja plausível. Ginsberg apontou, em particular, para a falta de regras uniformes para a certificação do resultado das eleições por autoridades estaduais e a incerteza se os Legislativos estaduais teriam poder de nomear quem desejarem para o Colégio Eleitoral, mesmo que isso vá contra o voto popular.

Mesmo sem causar uma crise constitucional completa, Trump já despedaçou a norma há muito estabelecida de que o perdedor deve reconhecer sua derrota rápida e graciosamente, evitando contestações sem motivos claros. Ele e seus aliados também rejeitaram a antiga convenção de que cabe à mídia declarar o vencedor, explorando a fragmentação da imprensa e a ascensão de plataformas como o Twitter e o Facebook para criar uma realidade alternativa para seus seguidores.

O próximo republicano a perder uma eleição apertada pode se deparar com eleitores que esperam uma repetição do que ocorreu em 2020. Se um democrata adotar as mesmas táticas, o Partido Republicano não teria credibilidade para reclamar.

Ainda mais importante, analistas políticos e jurídicos apontam, é o modo como Trump identificou perigosos pontos de pressão no sistema. Estas vulnerabilidades, afirmam, podem ser manipuladas para um efeito desestabilizador por uma terceira pessoa em uma eleição mais disputada ou com evidências reais de interferência externa ou irregularidades. Talvez em um pleito como o de 2016, quando o vencedor do voto popular não coincidir com o do Colégio Eleitoral. Nestes cenários, tentar interromper a certificação dos resultados adotando as táticas ensaiadas em 2020 pode não ser uma aposta tão arriscada.

Trump, de fato, conseguiu perturbar os processos eleitorais normais em uma série de estados. Ele convocou líderes republicanos de Michigan para a Casa Branca, enquanto seus aliados cogitavam a ideia de indicar eleitores pró-Trump para representar o estado, onde Biden ganhou por mais de 150 mil votos, no Colégio Eleitoral.

O presidente também inspirou uma campanha contra o secretário de Estado da Geórgia, o republicano Brad Raffensperger, que se recusou a endossar as alegações falsas de fraude eleitoral. Os dois senadores republicanos do estado, que buscam sua reeleição em um pleito extraordinário em janeiro que definirá qual partido terá o controle do Senado, chegaram a demandar a renúncia de Raffensperger.

Só o tempo dirá se Trump será um mau perdedor isolado ou se foi o pioneiro de um novo Velho Oeste eleitoral . Houve eleições muito mais disputadas neste século, como a de 2000 e a de 2016, mas nenhum outro candidato derrotado lançou mão das mesmas táticas corrosivas que o atual presidente.

Como em muitos outros de seus esquemas durante os últimos quatro anos, os planos de Trump contra as eleições se descarrilaram em parte por fatores externos, como o grande número de estados-chave vencidos por Biden, mas também por sua própria culpa. Seus advogados e conselheiros nunca criaram uma estratégia de verdade para reverter o voto popular, apostando em uma combinação de pronunciamentos televisionados para demonstrar poder e alegações de fraude sem evidências.

Barbara Pariente, juíza aposentada da Suprema Corte da Flórida que supervisionou a batalha legal no estado que determinou a vitória de Bush em 2000 disse que é fundamental que o Congresso esclareça o processo para a condução e resolução dos sufrágios. Caso contrário, põe o país em risco de calamidade nos próximos anos. A equipe de Trump, a seu ver, já rompeu com normas fundamentais da conduta legal ao dar entrada em processos pedindo a eliminação de grandes quantidades de votos legais “sem qualquer evidência de irregularidade”.

— Conforme eu olho para o que está acontecendo agora, creio que seja um ataque real ao sistema democrático americano, e está levando dezenas de milhares de americanos a questionarem o resultado — disse. — Há graves implicações, a meu ver, para o futuro deste país.

Mesmo que o Congresso venha a impor regras mais claras sobre os procedimentos eleitorais, no entanto, há razão para duvidar se isto seria suficiente para reverter a mentalidade de guerra alimentada por Trump. Em seu fracasso, ele criou o caminho para travar uma batalha contra um resultado desfavorável nas urnas, com o apoio de vozes sonoras na mídia conservadora e na base de seu partido.

E, se esta for a última alternativa, os milhões de eleitores que continuaram fiéis a Trump e que se demonstram maciçamente indiferentes aos fatos e procedimentos legais representam a arma mais potente para o presidente ou para alguém que possa seguir seu exemplo.

Shawn Rosenberg, professor de Ciência Política e Psicológica na Universidade da Califórnia que é pessimista sobre a trajetória da democracia americana, disse que o presidente vem sendo amplamente eficaz ao explorar o vácuo entre a complexidade do sistema político do país e o conhecimento rudimentar que boa parte dos eleitores têm do governo. Para este grupo, normas políticas e procedimentos são “muito abstratos” e bem menos importantes que uma simples vitória, impulso no qual Trump apostou, em detrimento das instituições democráticas.

Rosenberg alertou que, por mais que a oposição tenha conseguido vencer um presidente em busca da reeleição — algo raro no país — o resultado não foi a derrota maciça que provaria que os EUA não são vulneráveis às mesmas erosões vistas em democracias mais recentes, como a Polônia e a Índia. A seu ver, isso foi uma decepção para os críticos do presidente, na direita ou na esquerda.

— A esperança era que Trump tivesse ido tão longe que despertaria nos americanos uma consciência e determinação — disse Rosenberg. — E, claramente, este não foi o caso para cerca de 72 milhões deles.

O Globo

 

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