Advogadas negras denunciam barreira invisível
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A advogada Marcelise Azevedo é a exceção que confirma a regra. Mulheres, ainda mais as negras, geralmente estão fora dos cargos de comando em empresas e escritórios.
Há 23 anos trabalhando no mesmo escritório, sendo sócia desde 1999, ela primeiro assumiu a coordenação da área previdenciária da firma em 2006.
Mais tarde, em 2013, ficou responsável pela coordenação da unidade de Brasília do escritório. Agora, desde fevereiro deste ano, integra a diretoria do escritório, que conta com dois homens e duas mulheres.
Há décadas, a expressão teto de vidro é usada como referência às barreiras invisíveis que impedem mulheres e outros grupos de galgarem cargos de decisão dentro da hierarquia de empresas, escritórios e governos.
Para Marcelise, entretanto, é preciso fazer uma ressalva quando se fala de mulheres negras.
“As mulheres negras, elas não são nem convidadas para a festa, elas não podem nem pensar no teto de vidro, porque elas já estão na porta de vidro, uma porta que não permite que elas entrem, elas ficam olhando de fora.”
Ela aponta a importância de iniciativas como a da Magazine Luiza, que criou um programa de trainee exclusivo para pessoas negras e também ressaltou que, não basta contratar mulheres, é preciso não fazer diferença na progressão de mulheres e homens.
“É uma questão de você dar condições de que ela permaneça, de que ela siga a vida dela, profissional e pessoal, dentro do escritório.”
Entre os sócios do escritório de Marcelise (o Mauro Menezes & Advogados), as mulheres são maioria, chegando a 62% do total. De 24 sócios, 15 são mulheres —e duas pessoas são negras.
Esse não é um cenário comum nas principais bancas jurídicas do país. No escritório Pinheiro Neto Advogados, por exemplo, uma das principais do país, o percentual de mulheres entre os sócios é de 14%: são 93 sócios e 15 sócias. Ao todo, o escritório tem 680 advogados.
Apesar de o número ainda ser inferior a 15%, ele já representa um avanço em relação a três anos atrás. Em 2017, 10% dos sócios eram mulheres. Eram 82 sócios e apenas 9 sócias.
Em relação ao recorte racial, o escritório afirmou não possuir os dados, pois não registra a autodeclaração de cor/raça de seus membros.
Para Ligia Pinto, que é coordenadora do Centro de Pesquisa em Direito, Gênero e Identidade da FGV Direito SP, o aumento do percentual de sócias não é irrelevante, no entanto ela destaca que o escritório poderia ter ido além.
“Fizeram 6 sócias e 11 sócios, porém de uma base de associados que deve ser paritária. Assim, poderia ter sido mais agressivo o posicionamento do escritório.”
Uma das linhas de pesquisa de Ligia é justamente quanto à subrepresentação de mulheres em cargos de chefia em diferentes setores. Nesse contexto, ela pesquisou a situação em alguns escritórios de advocacia, incluindo o escritório Pinheiro Neto.
O sócio-gestor do escritório, Alexandre Bertoldi, conta que, a partir do diagnóstico de 2017, foram feitas discussões e diferentes mudanças, uma delas no processo de eleição de sócios e sócias.
Em linhas gerais, antes a eleição era feita por voto direto dos sócios, agora existe um comitê que forma uma chapa com os candidatos e candidatas na etapa final, e os sócios podem aprovar ou rejeitar a chapa como um todo.
“A grande evolução é que você começa a lidar com o problema a partir do momento que você reconhece que ele existe, né? E acho que, de lá pra cá, a gente teve várias discussões e obviamente que não era proposital, mas a gente chegou à conclusão que o escritório tinha um baixo percentual de mulheres mais no topo mesmo.”
Apesar disso, ainda deve levar anos até que o número de sócias esteja próximo ao de sócios. Segundo Bertoldi, eles trabalham com a meta de que, a cada rodada de eleição de sócios, no mínimo 40% dos eleitos sejam mulheres.
“Nosso objetivo é chegar em 2025 com algo entre 25 e 30% de mulheres como sócias.”
Quanto ao dado racial, Bertoldi afirma que o escritório possui diferentes iniciativas para aumentar a diversidade, como programas de estágios de férias e de capacitação de estudantes de direito negros, mas que não possui na ficha de cadastro a autodeclaração.
“A gente não pergunta, ninguém é obrigado a declarar essas coisas aqui. Tem grupos de afinidade de negros, que participa quem quer, mas a gente não tem o dado assim porque nós não perguntamos.”
Questionado se o dado não era importante para o acompanhamento, ele afirmou: “A gente tem intenção de aumentar [o número de pessoas negras], mas a gente tem que aumentar desse jeito, sem perguntar para as pessoas. Aumentando a diversidade, você naturalmente aumenta.”
Redação com Folha
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