Crime organizado apela a armamentismo federal para sobreviver

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Foto: Reprodução

Especialistas em segurança pública e autoridades policiais atribuem à atuação das forças de segurança e de instituições financeiras no combate ao crime organizado, à flexibilização na legislação armamentista e à pandemia a crescente sofisticação das quadrilhas, evidenciadas nos mega-assaltos que se se tornaram mais frequentes nos últimos anos, como o de Criciúma (SC) na semana passada.

Por um lado, grupos criminosos têm sido descapitalizados em sua principal fonte de receita por uma maior apreensão média de drogas pelas polícias, pelo maior aparato de inteligência e tecnologia para coibir a lavagem de dinheiro e por uma redução da demanda devido ao coronavírus. Em consequência, ainda segundo essa tese, há a necessidade das quadrilhas de planejar ações mais elaboradas e de maior capacidade bélica, para superar a repressão policial.

A Polícia Federal, responsável por reprimir o tráfico de drogas, tem direcionado suas operações em sufocar o braço financeiro das facções criminosas. No final de novembro, por exemplo, o órgão deflagrou uma operação que chamou de “maior apreensão do ano e uma das maiores da história contra a lavagem de dinheiro do tráfico internacional de cocaína”. Batizada de Enterprise, obteve judicialmente o bloqueio de R$ 400 milhões em bens e imóveis dos investigados, incluindo carros de luxo, joias, aeronaves e uma casa na Espanha, de dois milhões de euros.

— É possível que essas ações de asfixiamento ocasionem esse efeito. Com uma batida mais pesada para atacar as finanças, isso está no nosso radar — justifica o delegado o Elvis Secco, coordenador-geral de repressão a drogas e facções criminosas da Polícia Federal.

A maior facção paulista, que domina os presídios brasileiros, sofreu, ainda, uma baixa importante em 2020, com a prisão, em Moçambique, de Gilberto Aparecido dos Santos, conhecido como Fuminho, um de seus principais fornecedores de drogas. A pandemia e o consequente esvaziamento dos clientes nas bocas de fumo geraram problemas de fluxo de caixa. Para Renato Sérgio de Lima, diretor presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, essa conjuntura favorece a realização de novos mega-assaltos.

— Não podemos descartar que a pandemia reconfigurou tudo. Não dá para esquecer que o Fuminho, o maior traficante da América do Sul, foi preso em março. O volume de investigações ainda não é suficiente para dizer que isso está acontecendo, mas é uma hipótese que as facções, elas próprias, estejam colocando em prática os esses crimes.

Em abril, o presidente Jair Bolsonaro revogou três portarias do Exército que estabeleciam regras para rastreamento e identificação de armas de fogo no Brasil. A avaliação é que ficou mais fácil ter armas sem ser descoberto. As normas também tratavam da obrigatoriedade de dispositivos de segurança em armas de fogo.

Chamados de “novo cangaço”, os mega-assaltos tiveram início no final dos anos 1990 em pequenas cidades do Nordeste. O termo remete à atuação de cangaceiros que, entre os séculos XIX e XX, sitiavam cidades do sertão nordestino e encurralavam forças de segurança em episódios de roubo e violência.

— O termo traz a perspectiva de policiais que veem nesses assaltos pontos em comum com o cangaço: quadrilhas enfrentando a polícia, “sitiando” a cidade e permitindo que a população presencie as forças de segurança minadas, obstruídas — explica a cientista social Jania de Aquino, professora da Universidade Federal do Ceará, que há duas décadas estuda o “novo cangaço”.

O modo de atuação desses bandos é semelhante. Grupos numerosos tomam um município de pequeno ou médio porte, desprovido de forças especializadas de segurança, e agem em datas com grande circulação de dinheiro — em geral, no final do mês, perto do dia de pagamento.

Os criminosos se valem de estratégias de guerra. Ao bloquearem as saídas de batalhões e delegacias, tiram a capacidade da polícia de se mover e ficam com o caminho livre para agir. Em geral, usam reféns e apavoram a população, de modo a evitar retaliação. Também bloqueiam as estradas para impedir reforços policiais de cidades vizinhas.

O Globo 

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