Imobiliárias negociam alternativas para IGPM
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– A alta da inflação medida pelo IGP-M, índice mais usado para aplicar reajustes dos aluguéis, acendeu uma discussão sobre como deve ser calculada a reposição da inflação dos contratos no país e levou grandes imobiliárias a adotarem alternativas como descontos ou substituição do indexador de correção monetária pelo IPCA.
O IGP-M subiu 23,14% em 2020, contra 4,52% no IPCA. Entre inquilinos, advogados, empresas e até mesmo entidades como o Secovi, há o consenso de que a alta foge da realidade do mercado imobiliário, e que não deveria ser aplicada no atual momento.
Nesse cenário, surgiram até iniciativas de imobiliárias e advogados para que o IGP-M seja abandonado de vez como fator de correção dos contratos.
A disparada do indicador é explicada pela alta correlação dele com o câmbio, mas aliado à crise econômica, ele se tornou um risco para quem busca manter o inquilino no imóvel.
Recomendação é negociar
Por enquanto, não houve adesão generalizada, mas o Secovi, sindicato da habitação, reconhece que agora a melhor alternativa é negociar e sugere a adoção de uma mescla de indicadores.
— A recomendação do Secovi às imobiliárias é estimular a negociação para que haja adequação ao preço de mercado. Se a maioria dos índices vai numa direção e o IGP-M tem um pico, é um problema e isso precisa ser entendido (pelos proprietários) — afirma Jaques Bushatsky, diretor da entidade.
Para ele, no entanto, a troca do índice de maneira permanente também traz riscos a ambas as partes.
— É preciso cuidado nessa ideia de aposentar o IGPM porque o índice do passado não diz nada sobre como ele será no futuro, e o indicador já esteve negativo em alguns momentos. É preciso ter cautela e estudar outras iniciativas — afirma.
Bushatsky diz que a entidade discute com empresas do setor e um grupo de advogados maneiras de lidar com os impactos da crise do coronavírus, e defende pessoalmente o reajuste anual a partir de uma média de vários índices, o que eliminaria volatilidades.
— Já se fez isso no passado e existem contratos de aluguéis que estipulam uma cesta de indicadores que podem ser levados em conta. Dá um pouco mais de trabalho, mas é perfeitamente possível — ressalta.
A advogada Kizzy Mora, do escritório Peixoto & Cury, é uma das que propõe que o IGP-M seja substituído permanentemente pelo IPCA porque o primeiro, segundo ela, é um índice mais volátil e não reflete necessariamente a realidade do mercado imobiliário.
— É preciso rever urgentemente o reajuste pelo IGP-M porque ele é muito influenciado por preços de commodities e, em um momento de real desvalorizado, salta. O preço dos aluguéis no geral não teve alta similar, não há sentido econômico em reajustar os contratos antigos para algo fora do praticado em contratos novos — diz.
Ela afirma que é o inquilino pode recorrer à Justiça argumentando que o contrato precisa de um reequilíbrio econômico caso não haja negociação por parte do locador.
Segundo Marcelo Valença, advogado especializado em direito imobiliário, a rigor os contratos podem estipular outros índices para corrigir os valores dos aluguéis.
— Essa diferença entre os índices é algo inédito e tem a ver com o câmbio desvalorizado, não é algo perene. O Código Civil prevê que o contrato possa ser revisado quanto ele perde o equilíbrio econômico-financeiro, mas o que prevalece é a negociação porque a judicialização traz custos para ambas as partes — ressalta.
Segundo ele, grandes contratos corporativos já têm previsão de um índice misto para definir os reajustes, o que é ainda raro em pequenos contratos.
Mudança no mercado
Empresas como o QuintoAndar, plataforma digital que administra R$ 30 bilhões em imóveis em 30 cidades no país, já fizeram a alteração do IGP-M para o IPCA. No caso da start-up, de maneira permanente a partir de novembro.
Segundo o QuintoAndar, o preço médio do metro quadrado de aluguéis residenciais caiu 6,26% em São Paulo e 3,51% no Rio de Janeiro entre janeiro e dezembro de 2020.
— Todos os contratos intermediados pelo QuintoAndar já têm o IPCA como índice de referência, e só muda caso inquilino e proprietário queiram fazer a modificação. Desde então, locadores e locatários de contratos antigos têm nos procurado para pedir a alteração também porque, apesar de nem IGP-M nem IPCA medirem inflação de imóveis, o primeiro é mais volátil — diz José Sergio Osse, diretor da start-up.
Segundo ele, manter a praxe e fazer a correção monetária pelo índice mais alto poderia gerar uma alta nas vacâncias dos imóveis.
— Na prática, o valor dos aluguéis tem caído. Na comparação entre um aluguel novo e um de contrato vigente, a diferença seria grande, e incentivaria o inquilino a sair e alugar outro imóvel. O proprietário não teria o reajuste e ainda perderia a renda do aluguel em si em um momento de economia desaquecida — afirma Osse.
O IPCA, de acordo com Osse, é bom para o proprietário também porque nunca teve variação negativa, o que já aconteceu com o IGPM em 2017, por exemplo.
A Lello, uma das maiores imobiliárias do país, administra hoje mais de 11 mil contratos de aluguel na Grande São Paulo e decidiu mudar a partir deste mês o índice de reajuste anual das novas locações.
— No passado já mudamos de índice por uma razão parecida, no momento é o IPCA que está mais equilibrado. A mudança de padrão é definitiva, a menos que o proprietário queira usar outro indicador. Uma alta tão grande em meio à economia em crise pode aumentar a vacância — afirma a diretora para locação da Lello, Roseli Hernandes.
Ela continua:
— Nos contratos vigentes, fizemos uma força tarefa propondo a todos os proprietários recomendando que optassem por reajustar pelo IPCA ou fizessem uma redução no valor do reajuste. Muitos aceitaram e tive até os que não reajustaram para não perder o inquilino.
Imobiliárias de menor porte, como a Pecoraro, que administra 200 contratos na zona Oeste de São Paulo, também têm negociado os reajustes, mas não adotaram a mudança de índice por enquanto.
— A gente mostra aos proprietários quanto aumentaria se o IGP-M todo fosse aplicado e oferece a opção de dar desconto ao inquilino. A gente prefere manter um bom locatário, que paga tudo certo, a ter o imóvel vazio, mas a decisão é caso a caso, depende do dono do imóvel — diz Marina Pecoraro, gerente da empresa.
Na JB Andrade Imóveis, no Rio, o IGP-M também continua sendo o índice utilizado em quase todos os contratos de locação, mas, segundo a diretora Solange Portela de Andrade, houve casos nos quais o inquilino pediu para usar o IPCA e os proprietários concordaram.
— Vale lembrar que já tivemos épocas em que o IGP-M esteve bem baixo e até negativo. Ou seja, nesse primeiro momento é complicado fazer uma previsão, por isso permanecemos com o IGP-M. A palavra do momento é negociar. Os proprietários estão dispostos a encontrar uma solução que seja boa para ambas as partes — avalia Solange.
O gerente de imóveis da Apsa, Jean Carvalho, concorda com Solange e considera arriscado trocar o índice:
— Hoje é o IGP-M, já foi o IPCA no passado. As regras não devem ser mudadas por causa de um momento pontual. O reflexo de qualquer alteração no indexador de reajuste somente será percebido depois de 12 meses. Até lá, o cenário poderá alterar. A recomendação é sempre negociar com o inquilino.
Negociação como inquilina e proprietária
A negociação de fato tem resolvido muitos casos, como o da secretária administrativa Tania Bouch Barros, que conseguiu aplicar o INCC-M no lugar do IGP-M tanto no imóvel onde é inquilina, na Zona Norte do Rio, quanto no apartamento onde é a proprietária, na Zona Sul. O índice acumulou 8,66% de alta nos 12 meses até dezembro.
Ela aluga, desde 2018, um imóvel de dois quartos em um condomínio com área completa de lazer em Engenho Novo, o qual pagava R$ 1.076 até mês passado. Como não teve redução salarial, ela conta que não pediu desconto na pandemia, porém, pediu para adiar de outubro para janeiro o reajuste do seu contrato.
— Quando veio o índice do IGP-M, conversei com o dono que era inviável o valor e que tinha visto uma imobiliária usando o INCC como base. Ele topou e o reajuste foi menos de 8%, mais próximo dos anos anteriores. A diferença é que o novo contrato é válido por 12 meses, e não 30 meses como de costume.
Tania seguiu a mesma lógica no quarto e sala do Flamengo onde é a locatária. Devido à boa localização, próximo da praia e do comércio, o valor do imóvel era de R$ 1,7 mil antes da pandemia. Durante 2020, seu inquilino teve redução no salário e ela deu desconto de R$ 150 até dezembro.
— Ele estava lá há sete anos e sempre foi um bom inquilino. Tem de ser flexível, ou todos perdem — justifica Tania.
Ela conta que baixou em R$ 500 o valor do aluguel no Flamengo para a futura nova locação:
— A empresa dele, que é uma multinacional, decidiu pelo home office até 2022, então ele retornou para o Sul, para ficar com a família. Mas como a situação mudou muito, eu pesquisei os preços ao redor e baixei o valor. Ainda não fechei o contrato mas a ideia é ter por base o INCC-M e fazer um contrato mais curto, como aconteceu no imóvel onde moro.
Sem acordo, mudança foi a solução
Já a fisioterapeuta Luciana Loja não conseguiu negociar o valor do aluguel do imóvel onde estava há três anos, no Flamengo, e decidiu se mudar.
Durante a pandemia, ela teve suspensão de contrato no centro de reabilitação onde trabalha e não pôde atender pacientes no particular, por causa do isolamento. Inicialmente, conseguiu um desconto de R$ 2 mil para R$ 1,3 mil no aluguel.
— Quando voltei a trabalhar, as contas ainda estavam difíceis e vi que as pessoas estavam negociando. Conversei com a imobiliária e baixaram para R$ 1.7 mil. Perguntei se poderíamos mantê-lo, pois, em fevereiro, voltaria o valor cheio, mas, depois de insistir algumas vezes, disseram que não — relata Luciana, que agora vai pagar R$ 1.6 mil por mês em um imóvel parecido no bairro vizinho Catete.
Ela continua:
— Eu queria continuar lá, porque gostava e mudança gera gastos. Quando saí, a imobiliária disse que faria o aluguel pelo preço que pedi, mas já era tarde. Acredito que acham que estamos falando da boca para fora, mas não avaliaram o contexto da pandemia.
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