Portugal mantém quarentena mesmo com vacinação

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Foto: PATRICIA DE MELO MOREIRA / AFP

Portugal entrará novamente em quarentena a partir desta sexta-feira. É uma consequência da explosão de novos casos devido ao relaxamento das medidas de restrição no Natal, que levou aos recordes nos índices de transmissão e óbitos causados por Covid-19. Muito criticado no Parlamento pela estratégia de combate nos últimos meses, o primeiro-ministro António Costa anunciou o fechamento por 15 dias, renováveis por mais uma quinzena.

Em campanha de vacinação contra o coronavírus para os profissionais de saúde, Portugal repete o primeiro confinamento, quando o país parou em março e abril de 2020. Mas com números muito piores e a dez dias da eleição para a Presidência da República. Haverá permissão para sair de casa para votar antecipadamente no próximo domingo e no dia da eleição, 24 de janeiro. Os idosos votarão dentro das casas de repouso.

As universidades e escolas permanecerão abertas para os pais poderem trabalhar em casa, porque o trabalho remoto é obrigatório, sempre que possível e sem necessidade de acordo entre patrões e trabalhadores. A multa para o descumprimento será dobrada. A decisão de manter as escolas abertas gerou debate e dividiu especialistas ouvidos pelo governo. Uma das hipóteses era manter aula presencial apenas os alunos mais novos, até 12 anos, e fechar turmas com alunos mais velhos para reduzir o risco de contágio. Com receio, muitos pais resolveram não enviar seus filhos às escolas nesses últimos dias.

— Serão as mesmas regras de março e abril, com as exceções do calendário das eleições e da vontade de não sacrificar a atual geração de estudantes. Iremos manter em pleno funcionamento todos os estabelecimentos educativos. Sei que é um tema que divide a comunidade científica, mas une a comunidade educativa. Avaliamos as consequências, que foram irrecuperáveis no ano letivo de 2020. As cautelas tornaram as escolas seguras. Esta é a nova e relevante exceção — disse Costa.

Ao GLOBO, a presidente da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, disse que a exceção às escolas é equivocada.

— É um erro, porque as escolas continuam a ser locais de contágio. Só justifica aula presencial com alunos muito pequenos. É ridículo dizer que não tem risco, porque transmissão há em todo lugar — afirmou Cavaco.

O 9º estado de emergência foi aprovado pelo Parlamento. Apenas o comércio essencial, como supermercados e farmácias, seguirá aberto. Serviços públicos somente com marcação. Hotéis, cafés e restaurantes fecham e deixam em risco 100 mil empregos neste trimestre. Haverá exceção para entregas em domicílio, com controle das taxas de serviço e comissões para as plataformas digitais. O preço do botijão de gás também será limitado. Será exigido teste de diagnóstico e, quando necessário, confinamento compulsivo para a entrada em Portugal. Competições esportivas serão permitidas, mas sem público. Estabelecimentos culturais fecham.

Segundo levantamento de terça-feira do Imperial College de Londres, a taxa de transmissão (Rt), que mede o ritmo de contágio, é de 1,42, maior que a do Brasil (1,22), maior da Europa e a quarta do mundo. Estava abaixo de 1 antes do Natal.

O boletim diário da Direção Geral da Saúde divulgou que esta quarta-feira foi o pior dia da pandemia, com recordes de 156 mortes e 10.556 casos. O país ultrapassou a barreira dos 500 mil casos gerais (507.108 mil) e soma 8.236 mortes. Segunda-feira foi o dia da maior soma de mortes (no geral) em 12 anos no país, com 633. Foram impulsionadas pelos óbitos causados pela Covid-19, de 155. A média diária é de 11,1 mortes por milhão de habitantes, enquanto na União Europeia é de 7,60.

A escalada não é exclusividade de Portugal e a maioria dos países europeus também apertou as medidas este mês. Mas ao contrário da Alemanha, que fechou escolas e o comércio não essencial em meados de dezembro, da França, que limitou a circulação e encerrou restaurantes e salas de espetáculos, ou Espanha e Reino Unido, que restringiram deslocamentos e os participantes da ceia natalina por casa, Portugal autorizou circulação entre cidades e não estabeleceu limite de pessoas no Natal. Na terça-feira foram registrados 840 casos por milhão de habitantes, o maior número entre os países citados.

— A estratégia do Natal foi determinante, mas não é só. O confinamento parcial ao fim de semana a partir de 13h criou um aglomerado de pessoas de manhã, enquanto nada nos dizia que havia maior contágio à tarde. Foram medidas como estas, avulsas e ineficazes, que nos devolveram ao confinamento — declarou Cavaco.

A Ordem dos Médicos divulgou nota na qual alerta para o fato de a estratégia de comunicação do governo desde o início da vacinação, em 27 de dezembro, ter “contribuído para a redução da percepção do risco por parte da população”. De 28 de dezembro a 8 de janeiro, 60% da população em contato com dez ou mais pessoas relaxou no uso da máscara, diz o Barómetro Covid-19. Desde a semana do Natal, a circulação de pessoas na rua em dias úteis é igual aos tempos pré-pandemia.

— A esperança que a vacina nos dá é a mesma que alimenta o relaxamento — disse Costa.

As autoridades de saúde teriam perdido o rastreio e as origens de quase 90% dos contágios são desconhecidas. Hospitais de Lisboa transferiram doentes para outras cidades, como o Porto, que também caminha para situação crítica, com 100 casos suspeitos por dia no Hospital São João. Hospitais de campanha foram preparados na capital e em Portimão.

— Não temos gente nem como internar as pessoas. Estes são os problemas. Havia um conjunto de medidas para aliviar o SNS, que era a fixação dos recém-formados e regresso dos que emigraram. O primeiro-ministro é o responsável, porque alertamos para isto — disse Cavaco.

O Globo 

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