Pesquisador diz que Bolsonaro foi aos militares “buscar colo”

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Foto: Wilton Junior / Estadão

O historiador José Murilo de Carvalho descarta a possibilidade de golpe no Brasil. A especulação disseminou-se a partir da segunda, 29, quando o presidente Jair Bolsonaro rapidamente demitiu o general Fernando Azevedo e Silva do cargo de ministro da Defesa. O militar irritou Bolsonaro por sua ação para manter as Forças Armadas fora da política. O presidente o exonerou em busca de maior solidariedade castrense às suas ações. Alguns interpretaram a ação como ensaio golpista. Para o pesquisador, porém, uma ação contra a democracia no País não contaria, no momento, com o apoio dos quartéis.

“É tudo que as Forças Armadas não querem”, diz José Murilo, em entrevista ao Estadão. Ele opina que um golpe afetaria a imagem que os militares cultivam e lembra que Marinha, Exército e Aeronáutica não querem a sua politização. Haveria ainda a possibilidade de, no caso de um golpe, erros do presidente serem atribuídos também aos militares.

O pesquisador destaca que é inédito que os três chefes das Forças Armadas coloquem seus cargos à disposição, como foi tentado nesta terça, 30. O ministro Walter Braga Netto, porém, demitiu os três no início da tensa reunião. Para José Murilo, Bolsonaro se sentiu “acossado” pela volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao processo político, pela disparada das mortes por covid-19, pela pressão do Centrão por cargos e por uma política mais ativa de combate à doença. Por isso, o mandatário, que, diz o historiador, vive seu pior momento, procurou o “colo” dos militares, para envolvê-los na política.

A seguir, a entrevista de José Murilo ao Estadão.

Como podemos avaliar as mudanças que o presidente Jair Bolsonaro está fazendo nas Forças Armadas?
O presidente encontra-se no pior momento de seu governo. Vê-se acossado de um lado pela volta de Lula ao cenário político e por outro pela disparada das mortes causadas pela covid-19. Acresce-se a isso a pressão do Centrão, não só por cargos como por uma política mais ativa no combate à pandemia, exigida pelo crescente apoio de seus eleitores à vacinação. Quem imaginaria que tão cedo o presidente da Câmara, membro do Centrão, o ameaçaria de impeachment? A insegurança leva o presidente a buscar o colo das Forças Armadas.

Bolsonaro já se referiu ao Exército como “seu Exército”. O que é isso?
É tudo o que o establishment militar não quer: a politização das Forças Armadas. Isso já foi dito pelo (ex) comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, e é também a posição do general Fernando Azevedo e Silva (ex-ministro da Defesa), que acaba de sair declarando que as Forças Armadas são instituições de Estado. Até o insuspeito general (Hamilton) Mourão, vice-presidente, já disse que se a política partidária entra nas Forças Armadas por uma porta, a disciplina sai pela outra.

Em quais aspectos a situação é comparável à de 64 ou de outro momento histórico do Brasil, outras crises militares?
Nada a ver com 1964. A crise atual tem sua origem mais próxima em 3 de abril de 2018, quando o comandante do Exército, general Villas Bôas, fez uma declaração política (no Twitter) para pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) às vésperas do julgamento de um habeas corpus a favor de Lula, quebrando a abstenção política das Forças Armadas mantida desde 1985. Há no governo outros representantes dessa posição, mas não creio que ela seja majoritária. O vice-presidente também já fizera declarações do mesmo teor, mas não é um linha-dura e tem bom humor. Sua foto está hoje (terça, 30) nos jornais, tomando a vacina.

Há risco real de golpe?
Não vejo tal risco. Não poderia ser dado sem o apoio das Forças Armadas e seria um desastre para a imagem delas entrar numa aventura dessas. Um eventual momento crítico seria uma possível disputa presidencial entre Bolsonaro e Lula na próxima eleição. Mas até lá muita água vai rolar.

Mas qual seria o objetivo de um golpe desse tipo no Brasil?
Só poderia ser um governo livre das amarras democráticas para a execução das conhecidas ideias do presidente. Não passará.

Qual seria a base social para esse golpe, já que empresários já manifestaram insatisfação, por exemplo?
A base eventual civil está cada vez mais rala. Os empresários estão com as barbas de molho. O eventual apoio de beneficiados pelo auxílio emergencial não teria peso político.

No caso de maior envolvimento dos militares na política, não haveria risco de Bolsonaro dividir seus erros com os quartéis – por exemplo, a condução na pandemia, que já tem mais de 300 mil mortos?
É tudo que as Forças Armadas não querem. O grande argumento que usam para se justificarem é a boa imagem que têm entre a população. Não trocarão isso por nada. Muito menos em benefício de alguém que as tenta instrumentalizar.

Adeptos do presidente pedem intervenção militar, mas ressalvam: “com Bolsonaro”. O regime militar pode voltar?
Não creio na volta de um governo estritamente militar. O que permanece, sim, é a ideia de tutela da República, muito enraizada sobretudo no Exército, que a proclamou. Essa tutela, a “garantia dos poderes constitucionais” que consta do infeliz artigo 142 da Constituição, é que estará conosco até que nossa República adquira sua maioridade.

Aonde pode nos levar a crise?
Acabo de ler que os comandantes das três Forças puseram seus cargos à disposição do Ministro da Defesa. É algo inédito e confirma o que disse a respeito dos danos que podem ser causados às três corporações pelo uso político que delas quer fazer o presidente da República.

Estadão 

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