Chefe da Campanha de Bolsonaro defende urnas eletrônicas

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Foto: Reprodução

Diferentemente do que Jair Bolsonaro tem difundido sem apresentar provas desde a eleição de 2018, o coordenador jurídico nacional de sua campanha presidencial, Tiago Ayres, defendeu em entrevista à Folha a confiabilidade e a segurança das urnas eletrônicas.

Assim como o presidente da República, o advogado eleitoral também é favorável à implantação de um sistema de impressão do comprovante do voto dado na urna eletrônica, mas com um argumento bem distinto do que prega Bolsonaro.

“Todas as eleições realizadas até hoje tiveram resultados fiéis à vontade popular”, disse Ayres, para quem o mecanismo de impressão do comprovante servirá tão somente como reforço à segurança “do já louvável” sistema.

“O reconhecimento do bom funcionamento do sistema eletrônico de votação e a defesa do comprovante físico do voto não são ideias excludentes. A compreensão dessa premissa é fundamental para a remoção de um peso que se tem colocado indevidamente sobre o tema.”

Bolsonaro afirmou por diversas vezes desde que foi eleito que houve fraude nas urnas eletrônicas, que ele teria provas de que foi eleito no primeiro turno, em 2018, mas jamais apresentou qualquer mínimo indício nesse sentido.

Seus aliados tentam aprovar na Câmara uma emenda à Constituição para implantar o voto impresso, também amparados em notícias falsas e suspeitas sem comprovação sobre a confiabilidade das urnas.

O sr. considera necessária a implantação do voto impresso nas eleições de 2022? O reconhecimento do bom funcionamento do sistema eletrônico de votação e a defesa do comprovante físico do voto não são ideias excludentes. A compreensão dessa premissa é fundamental para a remoção de um peso que se tem colocado indevidamente sobre o tema.

Os defensores do voto impresso não estão flertando com a modalidade de cédula [de papel]. Está muito claro que a ideia é que haja um equipamento que vai integrar a urna eletrônica, uma espécie de receptáculo, onde ficará armazenado o comprovante do voto do eleitor, depositado sem contato manual, após conferência visual por ele.

O Tribunal Superior Eleitoral, acertadamente, tem defendido que o sistema eletrônico de votação jamais sofreu qualquer ataque que comprometesse a sua segurança. Todas as eleições realizadas até hoje tiveram resultados fiéis à vontade popular. Agora, esse êxito é resultante do permanente investimento em seu aperfeiçoamento.

Não há uma aparente contradição? O que motivaria adotar impressão do voto se não há nenhuma suspeita de forma séria sobre a urna eletrônica? A discussão poderia tomar outro rumo. A perspectiva é outra: não está em torno da ideia da segurança. A sociedade reconhece a segurança do processo conduzido pela Justiça Eleitoral. O foco da discussão é vitaminar, reforçar ainda mais a própria transparência.

Um dos argumentos que, para mim, não se sustenta é que isso importaria um custo [ao menos R$ 2 bilhões, segundo cálculos conservadores]. Ora, direitos custam. A saúde, a educação e a segurança pública exigem investimentos, por que seria diferente com a democracia e o seu ponto alto, que é o exercício do voto? Seria um mecanismo para reforçar ainda mais a transparência.

Eventual fraude que exista não será resultante de fraude na urna. Será uma fraude externa. Eu advogo muito na área eleitoral, desde muito tempo, e você sabe que o principal mecanismo de fraude em eleição é a compra de voto.

Uma pessoa que deseja fraudar um sistema de segurança tão eficiente quanto o da Justiça Eleitoral, isso deve exigir um investimento muito grande. Há um meio muito mais simples e barato que é simplesmente você comprar o voto do eleitor. Infelizmente a gente sabe que isso acontece e a Justiça Eleitoral tem apurado com eficiência.

[Voltando a falar sobre o voto impresso] não basta ser confiável, precisa parecer ser confiável. Para algumas pessoas basta dizer que algo é confiável para que elas durmam em paz. Para outras, elas precisam ver para crer. O que faz cada um ser assim não cabe em um manual, é algo relativo à própria complexidade da vida.

Não importa quem está certo e quem está errado. É isso que eu quero dizer, está havendo uma espécie de rotulação ambulante e isso é ruim para a ciência, para o debate técnico. Como qualquer discussão em um ambiente democrático, é importante que seja recebido com leveza. O peso pode afundar um debate que poderia ser enriquecedor. Então, que não haja rótulo nem para quem defende nem para quem é contra o voto impresso.

É preciso considerar com seriedade com a perspectiva daqueles que defendem o voto impresso como um reforço à segurança do já louvável sistema eletrônico de votação. E por ser um mecanismo que, segundo sustento, geraria mais confiança para o eleitor, seria um investimento de custo módico e benefícios relevantes. A gente não pode reduzir isso a um tema político, é um tema da sociedade, vamos discutir sem politizar.

Embora entenda seu ponto de vista, há um debate politizado já há muito tempo. O sr., que trabalhou na campanha do presidente Jair Bolsonaro, concorda com a afirmação que ele fez de que houve fraude na eleição de 2018? Ele diz que ganhou no primeiro turno e que iria apresentar provas, mas nunca apresentou. Eu respeito a declaração de qualquer pessoa, eu não não me manifesto sobre política. Sou advogado da área eleitoral, meu objeto de trabalho é a política, então as minhas análises independem de considerações políticas. Eu respeito a opinião de todos, mesmo porque eu preciso conhecer as razões de cada um, de cada ator e atriz do processo político para fazer as minhas análises técnicas, mas elas independem de considerações políticas.

Além do voto impresso, o que o sr. considera que o Congresso deveria discutir e aprovar? Um tema que acho muito importante, que deveria ser amadurecido, é o retorno do financiamento empresarial. As pessoas jurídicas participam da política, geram empregos, recursos para a economia, participam da vida comunitária e política da sociedade.

Não me parece razoável que todo o custo de uma campanha política fique a cargo do erário. É possível inclusive até conviverem os dois modelos, o financiamento empresarial e o público. Mas com teto, com limitação, esse é o modelo correto.

Qual teto? No grupo técnico da reforma eleitoral [da Câmara] já se falou em R$ 200 mil por CNPJ, me parece razoável. O problema não está na doação empresarial. O principal argumento que motivou o fim da doação empresariam foi o toma lá, dá cá.

Se o Estado brasileiro diz que está proibindo a doação empresarial porque há toma lá, dá cá, ele está expedindo uma certidão de incapacidade de controlar com eficiência. Se o problema está na relação espúria, tem que se combater essa relação espúria. O empresário não pode achar que por estar doando ele terá acesso ilimitado e permanente à administração pública, que terá facilidade.

Um dos principais argumentos do STF ao proibir a doação empresarial, em 2015, foi o desequilíbrio de forças entre os candidatos causado pelo poderio econômico… Mas o equilíbrio tem a ver com calibragem. O poder econômico nunca pode ser o problema em uma sociedade capitalista, o problema é o abuso. Esse abuso é que tem que ser revisitado por meio da infraestrutura legislativa para que haja o devido temperamento.

A gente não quer que o poder político seja capturado pelo poder econômico como uma marionete. Isso aconteceu no Brasil durante muito tempo, não só no Brasil, mas deve ser combatido com eficiência, não com discurso vazio. Simplesmente proibir o financiamento empresarial não é solução, é o adiamento do enfrentamento da causa mais importante, que é tornar os mecanismos de controle do estado brasileiro mais eficientes.

A volta das doações empresariais com teto levaria o STF a rever a posição de 2015, em sua visão? Acho que sim, com teto mais conservador, com limitação mais clara… O que o STF fez de maneira acertada foi tentar frear um cenário de absoluto abuso. Na eleição de 2014, me parece, foram gastos mais de R$ 5 bilhões, é algo desproporcional

Folha