Depoimentos dão fôlego à CPI contra Bolsonaro

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Integrantes da CPI da Covid avaliam que os depoimentos prestados nesta semana na comissão darão fôlego para que Renan Calheiros (MDB-AL) elabore um primeiro relatório, parcial, que aponte erros e omissões do presidente Jair Bolsonaro no combate da pandemia. A ideia seria reforçar as linhas de investigação traçadas para as próximas oitivas.

Além disso, cresceu no grupo majoritário a intenção de convocar o filho do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), por causa das informações de que ele participou de reuniões sobre as ações contra a Covid. Já há requerimento pronto pedindo a convocação dele.

Os senadores querem explorar com Carlos a narrativa de enfrentamento da Covid-19 construída junto ao pai, assim como questioná-lo a respeito da propagação de mensagens nas redes sociais e sua relação com o chamado “gabinete do ódio”.

A máquina de propaganda do governo —tanto a formal como a informal, que consiste na atuação de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais— será explorada em depoimentos a partir da semana que vem.

A CPI passou nesta semana para a fase de ouvir testemunhas. Prestaram depoimento os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, além do atual titular da pasta, Marcelo Queiroga.

Na última quarta-feira (5), estava prevista a ida à comissão do ex-ministro e general Eduardo Pazuello, que, no entanto, alegou ter tido contato com subordinados infectados pelo coronavírus. Por isso os membros da CPI decidiram remarcar seu depoimento para o dia 19, após o período de quarentena recomendado.

O grupo majoritário da CPI, formado por oposicionistas e independentes, se reuniu na noite de quinta-feira na casa do presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), para fazer um balanço da semana de trabalhos. Dos 11 integrantes titulares da comissão, só 4 são considerados governistas.

OS DEPOIMENTOS À CPI

Os membros do colegiado que integram a ala majoritária apontaram que os depoimentos materializaram três importantes elementos: a existência de um “ministério paralelo” ao da Saúde, no qual Bolsonaro seria o comandante; a ideia de que quem liderou a estratégia de propagar o uso da hidroxicloroquina foi o próprio presidente; e que o mandatário deliberadamente menosprezou o recrudescimento da pandemia.

“Todos os depoimentos foram relevantes e colaboram para a construção do conjunto de dados que vai nortear o relatório”, afirma o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), membro suplente da comissão.

“A primeira fala do Mandetta foi mais clara nesse sentido [do ministério paralelo]. Ele se referiu aos fatos de ter sido instado a participar de reuniões e indicou nomes de participantes, todos eles defensores dessa teoria da imunidade natural”, completou.

Em relação a ter ignorado o recrudescimento da pandemia, os membros da CPI afirmam que a prova desse fato seria a carta entregue pelo ex-ministro Mandetta, na qual informava ainda em março do ano passado sobre a perspectiva de haver 180 mil mortes em decorrência do novo coronavírus até o final de 2020.

Os governistas, por outro lado, dizem que a semana terminou bem por não haver provas materiais contra o mandatário. “A semana foi positiva pois os primeiros dois depoentes não trouxeram nenhuma novidade. Nenhum fato novo. A oposição tem pela frente uma missão impossível”, afirmou à Folha o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

Na avaliação de Bezerra, os argumentos usados pela oposição para justificar a omissão do presidente, a orientação contra o distanciamento social e a propagação do tratamento precoce, não oferecem “base jurídica legal para qualquer ação de criminalização”.

O senador diz que o Brasil está no mesmo patamar de casos por milhão de habitantes do que outros países que fizeram ações de distanciamento mais rigorosas do que aqui.

“Quanto ao tratamento precoce tem uma grande controvérsia sobre se é adequado ou não. Mas hoje já temos uma certeza: o tratamento precoce independente dos medicamentos utilizados é mais eficaz do que a recomendação de ficar em casa”, disse.

Além disso, Bezerra afirma que Bolsonaro transferiu dinheiro para estados e municípios para o enfrentamento da Covid.

“Preocupação zero com qualquer depoimento. Imagino que, se o tom empregado pela direção da CPI se mantiver, ela se caracterizará pela parcialidade e instrumento de ação política.”

O depoimento de Mandetta foi considerado pelos parlamentares do grupo majoritário o que ofereceu mais elementos a respeito da omissão do governo Bolsonaro. O ex-ministro relatou que repassava frequentemente informações a respeito de formas de conter o avanço da doença, em particular as ações de distanciamento social e uso de máscaras. Todas eram ignoradas posteriormente pelo presidente.

Mandetta também foi responsável por apontar a existência de uma rede de aconselhamento ao presidente, fora da estrutura do Ministério da Saúde. Renan Calheiros nomeou esse grupo de “ministério paralelo”.

Em uma reunião, na qual teria sido apresentado ao então ministro uma minuta de decreto para expandir o uso da hidroxicloroquina, Mandetta apontou a presença de Carlos Bolsonaro, que por isso se tornou um dos principais alvos da comissão.

Ao longo da semana, o uso da hidroxicloroquina —medicamento sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19— se tornou ponto central das oitivas.

Em mais um indício de erro na condução da pandemia, segundo os parlamentares, o ex-ministro Nelson Teich afirmou que havia pressão do governo para a ampliação do uso do medicamento e que esse foi o motivo que o levou a pedir demissão.

Os membros da CPI, por outro lado, afirmam que o atual ministro Queiroga foi muito bem preparado pelo Palácio do Planalto, tanto que aguentou mais de sete horas de depoimento repetindo as mesmas frases, escapando de provocações dos senadores, principalmente do relator Renan Calheiros.

A próxima semana também promete ser de dificuldades para o governo, com o depoimento do ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten.

Ele será questionado na quarta (12) sobre falhas na política de comunicação durante a pandemia e, principalmente, sobre suas falas culpando a gestão Pazuello por não ter comprado a vacina da Pfizer e sua atuação nesse episódio.

O ex-chanceler Ernesto Araújo estava previsto para depor na próxima quinta-feira (13). No entanto, os comandantes da CPI decidiram adiar para a semana seguinte.

Folha de SP