Fachin critica polícia por chacina no Jacarezinho
Foto: Felipe Sampaio/STF
O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), criticou a operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro na favela do Jacarezinho, no último dia 6 de maio. Para ele, a ação mostra que “há indícios de que não houve o devido planejamento” e que ocorreu uso abusivo da força.
Como revelou o UOL, a ação no Jacarezinho foi a mais letal da história do Rio de Janeiro, com um total de 28 mortos —27 moradores da comunidade e um policial civil. Agentes de diversas delegacias da Polícia Civil foram à comunidade cumprir 21 mandados de prisão contra suspeitos de participar do tráfico de drogas no Jacarezinho.
Contudo, apenas apenas três dos alvos foram presos. Outros três acabaram mortos, segundo a relação de vítimas divulgada pela Polícia Civil.
Fachin é relator da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) 635, que discute a letalidade policial no Rio. Em junho, ele determinou que as operações policiais em comunidades do estado fossem restringidas apenas a situações excepcionais, tendo em vista a pandemia de covid-19 —a decisão foi referendada pelo plenário do Supremo.
Após as mortes no Jacarezinho, o PSB e as demais entidades autoras da ação solicitaram que o STF defina objetivamente qual é o critério de excepcionalidade que as forças policiais devem observar. Também pediram que o Tribunal determine a investigação do possível descumprimento de sua decisão.
As declarações de Fachin fazem parte de seu voto, divulgado hoje, no julgamento desses pedidos —que ocorre no plenário virtual do STF, com previsão de término em 28 de maio.
O ministro afirma que é preciso conceder medidas adicionais para impedir que a decisão do STF se torne “ineficaz”.
“A operação [no Jacarezinho] indica, em síntese, que se não forem tomadas medidas adicionais, a decisão do Tribunal pode vir a se tornar ineficaz”, escreveu Fachin em seu voto.
Ele ainda fez duras críticas à ação da Polícia Civil, com base nos relatos trazidos por entidades como a Defensoria Pública do Estado e a Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, as quais recolheram indícios de mortes arbitrárias pela polícia, desfazimento das cenas de crime e invasões de casas de moradores durante a operação.
O ministro afirma que houve falta de planejamento na ação e uso ilegal da força letal pelos agentes.
“De acordo com as informações trazidas pela Parte requerente, a operação não era absolutamente excepcional, não houve a comunicação prévia ao Ministério Público, não foram apresentadas justificativas para a realização da operação, não foi observada a determinação de preservação dos vestígios para a realização das perícias e, finalmente, quer pelo número alarmante de fatalidades, quer pela inefetividade do cumprimento dos mandados, há indícios de que não houve o devido planejamento para a realização da operação, nem houve o emprego da força letal nos estritos parâmetros legais, conforme preceituam os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo.”
Em seu voto, Fachin atende a diversos pedidos feitos pelos autores da ação. Entre eles, que o MPF apure se houve descumprimento por parte das autoridades do Rio da determinação de restringir as operações.
Também ordena que o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) apure, em um prazo de 60 dias, se a extinção do Gaesp (Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública) —até o início do ano a estrutura responsável por investigar crimes cometidos por policiais no Rio— manteve ou não a eficácia das apurações de violações cometidas pelas forças policiais.
A extinção do Gaesp foi uma das primeiras ações do novo chefe do Ministério Público do Rio de Janeiro, Luciano Mattos. Ele foi nomeado procurador-geral de Justiça do Rio em janeiro pelo governador Cláudio Castro.
“É possível que as novas alterações promovidas pelo Ministério Público possam se mostrar mais eficientes. É inadmissível, no entanto, que um desenho institucional que tenha se mostrado exitoso possa ter sido substituído por um outro menos eficaz, especialmente em um contexto no qual é baixíssima a eficiência das investigações que envolvam o emprego de força letal. Não se pode admitir nenhum retrocesso na concretização de direitos fundamentais.”