Guerra política gera atentado com 14 mortes no Peru

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Foto: Ernesto Benavides – 22.mai.21/AFP

Um atentado que matou ao menos 14 pessoas no domingo (23) à noite no Vraem (abreviatura pela qual se conhece a região do vale dos rios Apurímac, Ene e Mantaro) causa preocupação no Peru a pouco menos de duas semanas do segundo turno das eleições presidenciais.

As Forças Armadas afirmaram, por meio de um comunicado, que o ataque havia sido realizado pelo Sendero Luminoso (guerrilha de esquerda desarticulada nos anos 1990, mas que ainda possui células ativas). Os soldados encontraram no local panfletos que atribuem o ataque ao grupo e pedem que eleitores votem nulo, “para limpar o Vraem e o Peru de antros de mal viver, de parasitas e de corruptos”.

O texto também diz: “Povo peruano, boicote as eleições burguesas, porque não é teu caminho. Não vá votar, vote em branco, ou vote nulo”. E, ainda: “Quem vota em Keiko Fujimori é traidor, é assassino do Vraem e assassino do Peru”.

Entre as vítimas do ataque, num bar localizado em San Miguel del Ene, em Vizcatán del Ene, havia mulheres e crianças.

O presidente peruano, Francisco Sagasti, condenou as mortes e ordenou o deslocamento de forças extras do Exército para a região. “Condeno e repudio energicamente o assassinato de 14 pessoas no Vraem. Ordenei que as Forças Armadas e a polícia nacional reforcem a zona, para que este tipo de ação terrorista não fique impune”, escreveu numa rede social.

 

Na época da guerra entre o Estado peruano e o Sendero Luminoso, principalmente nas décadas de 1980 e 1990, o Vraem foi uma região de duros enfrentamentos. A vitória do Estado ocorreu apenas depois de aceitar a ajuda das “rondas campesinas”, milícias compostas por civis que entraram no confronto para enfrentar a guerrilha. O resultado do conflito foi a morte de mais de 70 mil peruanos.

O ataque pode ter consequências eleitorais —o segundo turno da disputa à Presidência está marcado para 6 de junho, entre o sindicalista e professor de esquerda Pedro Castillo, 51, e a direitista Keiko Fujimori, 45, filha do autocrata Alberto Fujimori (1990-2000).

Castillo tem o apoio dos chamados “ronderos”, que ainda atuam no país e são aceitos pelas comunidades do campo, que veem neles protetores. Há membros do entorno do candidato, no entanto, que possuem vínculo com o Movadef —o braço político do Sendero Luminoso.

Integrantes do grupo, inclusive, atuam como assessores da campanha na corrida presidencial. E alguns já estiveram presos por ligação com ações consideradas terroristas pela Justiça.

 

A propaganda de Keiko Fujimori, por sua vez, ataca tanto os “ronderos” quanto os senderistas, dizendo que são todos “terroristas”. A candidata ainda não se manifestou sobre as mortes deste domingo.

A bandeira de ter colocado um fim à guerra com o Sendero Luminoso, naquela época, com a prisão do seu líder máximo, Abimael Guzmán, em 1992, deu enorme popularidade ao então presidente Alberto Fujimori, e também ao fujimorismo.

A região do Vraem é uma zona de instabilidade já há muitos anos porque é área de plantio de coca e parte de rotas de narcotráfico. Nos últimos tempos, uma tentativa do governo de começar a erradicação do plantio de coca e da substituição por outros cultivos gerou tensão na região. Ataques entre grupos que ficaram com o que restou da ação antes comandada exclusivamente pelo Sendero Luminoso são muito comuns.

No sábado (22), milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades do país contra a candidatura de Keiko, em passeatas convocadas por grupos de direitos humanos e anticorrupção.

Sob o lema “Pelo Peru Keiko não vai”, a marcha foi realizada pacificamente em Lima com milhares de pessoas usando máscaras e agitando faixas com slogans contra a candidata e seu pai, o ex-ditador Alberto Fujimori, que esteve no poder de 1990 a 2000.

Um levantamento publicado neste domingo (23) indica que 44,8% dos entrevistados pretendem votar em Castillo, enquanto 34% dizem que vão escolher Keiko. A sondagem foi realizada pelo Instituto de Estudos do Peru a pedido do jornal La Republica com 1.208 pessoas nos dias 20 e 21 de maio e teve margem de erro de 2,8 pontos percentuais.

A pesquisa também indicou que 13% pretendem votar em branco ou anular seu voto no segundo turno.

Folha de S. Paulo