Mandetta mostra que leva a sério candidatura presidencial
Foto: Adriano Machado/Reuters (7.abr.2020)
Um político experiente que opera no circuito Brasília-São Paulo vê a corrida presidencial de 2022 como uma prova de resistência, e não de velocidade. Nesse quesito, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, presidenciável do DEM, estaria com fôlego de atleta.
Depois de suportar as nove horas de depoimento aos senadores da CPI da Pandemia na semana passada, Mandetta submeteu-se ontem ao escrutínio de um público igualmente severo e influente nas eleições. O ex-ministro foi ouvido durante quase três horas pelos membros da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que reúne parte importante do empresariado paulista.
Mara Gabrilli seria uma “boa vice”, diz Mandetta a tucano
A coluna procurou representantes da entidade que assistiram à conferência do pré-candidato, que não foi aberta à imprensa ou ao público em geral. Ouviu que Mandetta surpreendeu positivamente ao não restringir sua fala ao cenário pessimista sobre a pandemia, e revelar-se apto ao debate de outros temas candentes, como a defesa da democracia, reforma tributária, educação, segurança pública e combate à desigualdade.
Segundo relatos, Mandetta colocou-se como pré-candidato, mas, também, como cabo eleitoral influente. Pesquisa divulgada ontem pelo Instituto Atlas mostrou Mandetta empatado com o presidente Jair Bolsonaro no segundo turno, e numericamente à frente de Ciro Gomes (PDT).
“Estou aqui para ajudar”, ofereceu-se na conversa com os empresários. Adiantou que, se for para contribuir, retira o nome da disputa. “A não candidatura também é um ato político de união para esse país”.
Idealizador do manifesto pela consciência democrática, que reuniu os seis pré-candidatos à Presidência, Mandetta fez um novo alerta ao tensionamento das instituições, disse que é preciso garantir a realização das eleições no ano que vem com lisura, e que não se tem dado atenção devida ao questionamento que vem sendo feito à integridade das urnas eletrônicas.
Segundo uma fonte que assistiu à palestra, sem citar Bolsonaro, Mandetta disse que a exigência do voto impresso tem sido feita “quase como uma ameaça” de não se aceitar o resultado, e completou que este pode mesmo não ser o que os governistas esperam.
Sobre a reforma tributária, Mandetta disse que se não houver uma liderança com capacidade de negociação e diálogo para evitar a ampliação da carga tributária, e em contraponto, assegurar leveza e simplicidade aos negócios, nada acontecerá.
Ele advertiu aos empresários que a tributação dos serviços é um alvo, e seria uma saída “perversa”, diante da desindustrialização do país, e já que o agronegócio tem uma blindagem política eficiente.
O ex-ministro também alertou que está muito próxima a solução árida de novo ciclo de aumento de taxa de juros, cenário adverso para os empresários que lidam com crédito. Recomendou a aprovação do projeto de valorização do bom pagador.
A coluna apurou que diretores da entidade reclamaram de não serem ouvidos na discussão da reforma, e da iniciativa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de fatiar a proposta.
Convidado para o evento, o cientista político Antonio Lavareda exortou Mandetta a participar de um debate público com os demais presidenciáveis do centro político para explicitar não a concordância entre eles, que é a defesa da democracia, mas para explicitar as diferenças, o que ajudaria a afunilar a disputa.
Mandetta mostrou-se disposto ao embate público, mas aproveitou para rechaçar a crença generalizada de que o centro é “amorfo”, sem luz própria. “Eu quero ser um radical de centro, um radical de bom senso, radical de coisas bem feitas, um radical de Brazilzão”, declarou, segundo relato de dois espectadores.
Mandetta acrescentou que tem “pressa”, mas ponderou que o tempo da política difere para cada um. Na presença do secretário especial do governo de São Paulo em Brasília, Antonio Imbassahy, aguerrido aliado de João Doria, lembrou que há no PSDB quem queira adiar as prévias do partido para março.
Completou que a persistir a fragmentação do centro, o eleitor votará no pleito de 2022 em quem odiar menos, e observou que não se pode construir um país baseado no ódio.
No fim de abril, o Valor publicou uma pesquisa exclusiva, encomendada ao Instituto Travessia, sobre as chances de sucesso de uma candidatura de centro. Na pesquisa estimulada, 35% aderem a nomes desse espectro. Nesse conjunto, Mandetta arrebata 2% dos votos.
Na qualitativa, Mandetta se sobressaiu ao empatar com Luciano Huck: ambos são considerados os mais simpáticos. Ao lado de Doria, desponta como o mais trabalhador, e é o mais qualificado no debate da saúde.
Nas qualitativas do DEM, é lembrado como homem de família (é casado há 32 anos), de valores conservadores, com interlocução com o agronegócio, e com profissionais da saúde. É considerado “mais brasileiro” do que o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), porque o gaúcho “não expressa o sentimento de alguém do Centro-Oeste”, disse à coluna um integrante da Executiva do DEM.
Mas o DEM que fique atento, porque Mandetta está no radar de outros partidos. Um cacique do MDB disse à coluna que o ex-ministro é um “belo quadro, com enredo que, se bem construído, pode ter um diálogo bacana com a classe média”.
Quando ainda havia a hipótese do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (RJ), de saída do DEM, filiar-se ao MDB, lideranças emedebistas cogitaram o convite para que Mandetta acompanhasse o aliado. O ex-ministro ouve críticas de que não pode se apresentar como adversário de Bolsonaro em uma legenda que tem dois quadros no governo: os ministros Onyx Lorenzoni e Tereza Cristina.
No fim da palestra, Mandetta propôs uma chapa: disse ao presidente da ACSP, Alfredo Cotait Neto, presidente do PSD paulista, que a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) seria uma “vice tão boa, embaixadora internacional do Brasil”. Cotait é ex-senador e suplente de Gabrilli. Em tom gaiato, sugeriu a Imbassahy que consultasse o alto tucanato sobre a chapa.
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