Militares garantem que Pazuello será punido

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Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

O ex-ministro da Saúde e general da ativa Eduardo Pazuello vai ser punido por ter participado de ato político em favor do presidente Jair Bolsonaro neste domingo 23, no Rio de Janeiro. A interlocutores, colegas de farda e até superiores hierárquicos, ele admitiu que cometeu “um erro” ao subir no palanque no Monumento aos Pracinhas do ex-chefe. Pazuello transgrediiu o Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) que proíbe a manifestação política de militares da ativa sem a autorização prévia dos seus superiores.

Militares ouvidos pela ÉPOCA deixaram claro o descontentamento da cúpula do Exército com a ida de Pazuello ao Rio. O general estava em Brasília e viajou à capital fluminense ao lado do presidente no avião da Força Aérea que levou a comitiva do governo. A única agenda de Bolsonaro na cidade era um passeio de motocicleta com apoiadores a favor dele.

Apesar da carona, vista como o primeiro erro, a avaliação era de que o ex-ministro da Saúde poderia ter passado despercebido se não tivesse decidido ir até ao Monumento dos Pracinhas, no Aterro do Flamengo, e subir no carro de som contratado por apoiadores do governo para Bolsonaro e outros políticos discursarem.O general, mesmo falando muito pouco, estava em um ato político.

Pazuello mandou uma mensagem ao comandante do Exército, de acordo com interlocutores, assim que o ato terminou. Ele reconheceu que estava errado e se mostrou arrependido. Aos mesmos interlocutores, ele justificou que acabou sendo “empurrado” a ir parar do lado do presidente. O general afirmou ainda que estava de máscara o tempo todo até subir no caminhão de som.

Militares ouvidos pela ÉPOCA afirmam que a atitude do ex-ministro da Saúde atingiu a imagem da corporação. Eles afirmaram que era dever do general “se preservar” e lembraram que ele teve apoio do novo comandante do Exército durante a ida dele à Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as ações do governo na pandemia, a chamada CPI da Covid.

No entanto, de acordo com oficiais ouvidos pela ÉPOCA, “ele derramou o caldo”. O militar afirmou que, agora, o comandante Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira não pode deixar de puni-lo porque, senão abriria um flanco para que outros militares, de qualquer patente, subissem em palanques no período eleitoral que se aproxima. Além disso, se não punir, também estaria cometendo uma transgressão.

Pazuello explicou aos colegas de fardas mais próximos que “não fez pronunciamento político”. “Falei como cidadão, não falei como oficial-general”, justificou ele a um interlocutor via Whatssap. O ex-ministro, ao insistir que não falou nada com cunho político, comentou apenas agradeceu “a galera” e disse que “não podia perder esse passeio de moto”, “que era imperdível” e encerrou sua participação. Pazuello nunca falou em entrar para a política, mas algumas pessoas próximas já apostam neste caminhos após a aposentadoria.

O ex-ministro passou o restante do domingo ouvindo reclamações dos colegas de farda. Confidenciou que, se pudesse, “voltaria atrás no tempo e não teria ido lá”. Nesta segunda-feira, Pazuello, que está sem função e mora no Hotel de Trânsito de Oficiais em Brasília, vai “se apresentar” no Quartel General. Ele sabe e já espera que deve ser punido pelo que fez. E reconhece ainda que não tem nem o que dizer mais sobre o assunto.

No Planalto, também houve preocupações com essa aparição de Pazuello. A avaliação que o gesto deve reforçar o foco da CPI na atuação do governo e a sua relação com o presidente. Interlocutores de Bolsonaro afirmaram que esse comportamento servirá de “munição” contra ele e o seu governo e que “a ida ao shopping sem máscara virou bobagem”. O presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), já disse aos seus pares que deve reconvocar o militar.

Uma solução para a punição do general começou a ser construída logo após as primeiras imagens dele em cima do trio elétrico passaram a circular. A cúpula do Exército espera construir um consenso para evitar nova exposição interna e evitar novo constrangimento ao comando pelo gesto que desde que saiu do governo, em março, e voltou à caserna.

A tendência, neste momento, é que Pazuello sofra uma “advertência” pela sua atitude e que seja “pressionado” e, mais do que isso, “instado” a pedir transferência para a reserva, embora “por direito” tenha pelo menos mais um ano de permanência no serviço ativo.

Não existe norma legal que determine ou possibilite como sanção por cometimento de transgressão disciplinar a passagem compulsória para a reserva de militar que possua estabilidade assegurada. No entanto, este pedido para que ele deixasse o serviço ativo já vinha sendo feito por diversos oficiais e integrantes da cúpula militar desde quando decidiu aceitar assumir efetivamente o cargo de Ministro da Saúde no ano passado.

Enquanto estava no governo, Pazuello rejeitou a ideia de passar para reserva e nunca conversou com Bolsonaro sobre isso. Embora todos achassem que, ao permanecer na ativa, como ministro da Saúde, o general trazia desgastes e problemas ao Exército. Para justificar, os militares reconheciam também que era um direito de ele não abandonar a farda.

Agora, no entanto, embora ainda seja um direito seu não querer assinar pedido para ir embora para casa, ele cometeu um erro grave e expôs toda a instituição e o comandante do Exército e, daí, a pressão. A saída não é simples.

Segundo interlocutores, Pazuello não estaria disposto a sair agora do Exército. Eles afirmam que o general ” está passando por momento delicado em sua vida”, sendo obrigado à comparecer CPI da Covid. Uma opção, seria ir para a reserva após o fim das investigações, mas não apenas no ano que vem.

Pelo RDE, se o seu superior hierárquico não enquadrar o ex-ministro da Saúde, ele estará infringindo, pelo menos, a quinta regra do anexo 1 onde as 113 infrações estão listadas. A norma fala em “deixar de punir o subordinado que cometer transgressão, salvo na ocorrência das circunstâncias de justificação previstas neste Regulamento”. Os artigos subsequentes falam ainda que é violação de regra também “não levar falta ou irregularidade que presenciar, ou de que tiver ciência e não lhe couber reprimir, ao conhecimento de autoridade competente, no mais curto prazo” e “retardar o cumprimento, deixar de cumprir ou de fazer cumprir norma regulamentar na esfera de suas atribuições”.

O enquadramento de Pazuello deverá ser feito com base no item 57 que trata de manifestar-se, publicamente, o militar da ativa, sem que esteja autorizado, a respeito de assuntos de natureza político-partidária. Hoje, Pazuello está “adido à Secretaria Geral”, aguardando para ser transferido. Essa situação acontece quando um militar retorna à força, como é o caso dele, um general 3 estrelas e não existe um cargo vago para o qual ele possa ser designado. Com as movimentações de julho, esse cargo surgiria, certamente na área de economia e finanças do Exército.

Apesar de a ida de Pazuello ao palanque poder lhe custar a punição com advertência, o general ainda tem a seu favor o seu histórico militar, que contém muitos atenuantes já que sua carreira é considerada impecável. Segundo a classificação resultante do julgamento da transgressão, existem seis punições disciplinares que podem ser aplicadas, que começam com advertência, passam por repreensão, detenção e licenciamento.

A advertência, que militares ouvidos apostam que deverá ser a opção do comando, significa mais um gesto político, de demonstração de autoridade, e de satisfação e alerta aos demais militares, para que fiquem atentos que não haverá condescendência com esse tipo de ato. Na prática, não terá nenhuma consequência mais grave, além de constar na ficha militar do general três estrelas.

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