Covid matou a família inteira em um mês

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Foto: Reprodução

No último dia 25 de maio, a família Lorensseto Neder deixou de existir. Literalmente. Em menos de um mês, pai, mãe e filho morreram de Covid-19.

O coração de André Ibrahim Neder, de 30 anos, parou de bater às 22h30 de terça-feira. Na semana anterior, em 19 de maio, ele fizera aniversário internado em uma unidade de terapia intensiva (UTI) no Hospital Planalto, na zona leste de São Paulo.

Intubado, respondeu a um áudio gravado por amigos e familiares tentando abrir os olhos.

O estado de saúde dele naquela ocasião em nada se comparava com os primeiros dias de internação, no fim de abril. André brincava e sorria em conversas por chamada de vídeo com parentes e a noiva.

Além do pai e da mãe, a futura esposa e três tios contraíram o vírus. Só que todos se recuperaram bem.

Prima de André, Juliana Lorensseto conta que ele estava confiante. “Ele pedia para a gente ter paciência. Ele tinha muita certeza de que ia se curar e sair bem dessa”, afirma ao Metrópoles.

Foi pela tela do celular que ele soube da morte da mãe, Clarice Lorensseto Neder, aos 57 anos. Ela foi a primeira a apresentar os sintomas da Covid, como sinais de gripe e falta de ar, na segunda metade de abril.

Entre a internação e o óbito, houve um intervalo de apenas quatro dias. Clarice chegou ao hospital no dia 23 e morreu no dia 27, sem apresentar nenhum sinal de progresso. Os familiares iam à unidade diariamente para receber o boletim médico.

O pai, Ibrahim Neder, 61 anos, já estava infectado, porém relutava em visitar uma unidade de saúde. Segundo Juliana, o tio decidiu se consultar com um médico particular no bairro onde morava, na Vila Pierina, na zona leste.

Ele receitou cloroquina e azitromicina, medicamentos sem eficácia comprovada no tratamento contra a Covid-19.

Com a piora gradativa, a saturação de oxigênio de Ibrahim despencou para menos de 50%, o que o impossibilitou de andar. Ele foi levado para um hospital com urgência em 3 de maio.

O casal foi internado na mesma unidade, Tide Setúbal, na região onde moravam.

No dia seguinte, Juliana foi chamada pela equipe médica e pensou que seria atualizada do quadro clínico de Ibrahim. Mas foi surpreendida com o anúncio da morte do tio. “Ele já chegou muito debilitado. Dizia que precisava se recuperar e cuidar do André, que estava sem mãe. Nem sei te dizer como reagi.”

No leito do hospital, André suspeitava de que a retirada de seu celular pelos médicos tinha uma explicação: a morte da mãe. Os familiares e profissionais discutiram por dias até entregar o aparelho de volta nas mãos dele.

Ele só não soube do falecimento do pai, pois as duas partes repetiram o dilema de compartilhar ou não o celular para informar sua morte. André foi intubado no dia 7 de maio, sem saber o destino de Ibrahim.

Por duas semanas, Juliana teve esperança remota na recuperação do primo. Entretanto, o coronavírus inflamou os pulmões, o impedindo de respirar.

“Em um mês, a família acabou. Essa doença deixa um sentimento de impotência muito grande. Você não consegue ajudar, visitar nem se despedir. É difícil dizer o que sinto, é uma perda muito grande”, diz Juliana, que foi aos três sepultamentos.

A família Lorensseto Neder estava na fila da vacinação contra a Covid-19. Os pais receberiam a primeira dose no início de maio.

Enquanto esperavam a imunização, André montou um escritório para trabalhar dentro do quarto. Ele esperava se formar em contabilidade ainda em 2021 e planejava o casamento com a noiva após o fim da pandemia.

Ibrahim e Clarice trabalhavam no mercadinho de bairro anexo à casa da qual eram proprietários há mais de 20 anos.

Além da saudade, paira na cabeça dos familiares a incerteza do que fazer com o terreno onde eles constituíram trabalho e família. Nas redes sociais, o único irmão de Ibrahim anunciou uma liquidação com 30% dos produtos que restaram no mercado.

Metrópoles