Por que o STF deve suspender a Copa América

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Foto: Reprodução

Primeiro, é necessário que eu explique que deverá haver uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que tem como objetivo proteger os preceitos fundamentais que são aqueles que estão ligados diretamente aos valores supremos do Estado e da Sociedade.

Somente alguns entes podem propor conforme a Constituição Federal como o Presidente da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; a Mesa de Assembleia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do DF; o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal; o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido político com representação no Congresso Nacional; Confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

No caso da realização da Copa América, preceitos eminentemente fundamentais que podem ser ainda mais feridos são os sociais e político, especialmente o direito universal a saúde, além da dignidade humana, a cidadania e a garantia de tratamento não desumano.

Segundo o artigo 196 da Constituição Federal revela: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

Já no art. 5º é assegurado: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”

No artigo 6º da Constituição são assegurados à sociedade brasileira “direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia…”

Em seu artigo 7º a CF é muito pontual ao proteger a sociedade no sentido de que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;” e no artigo 23 do mesmo diploma maior que é “competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: XII – previdência social, proteção e defesa da saúde;”

Nesse sentido, ao admitirmos uma Copa América no Brasil, enormes são os riscos e ferimentos aos preceitos fundamentais.

Estamos na iminência do desembarque de 10 delegações de seleções, com aproximadamente 800 pessoas que estão participando de competições em todo o globo com situações pandêmicas distintas e em diversos níveis; com restrições e ordens sanitárias das mais diferentes formas.

Como se trata de um evento com grande impacto, turistas poderão vir ao Brasil para acompanhar suas seleções, mesmo com os estádios fechados. A Copa América é também um convite ao turismo nas cidades designadas, e isso pode causar mais risco ainda ao povo brasileiro de uma nova onda com colapso nos hospitais.

Importante dizer que indiretamente inúmeras são as pessoas que terão contatos com as delegações e eventuais turistas, como trabalhadores em hotéis, motoristas, torcedores ao redor dos hotéis e etc. Assim, temerária a realização deste evento em território nacional, sendo que os reais países sedes recusaram o evento em face da crise sanitária e social.

Interessante destacar que a própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária recomendou ao Governo Federal que viajantes advindos de outros países em situação calamitosa quanto à pandemia fossem impedidos de ingressar no Brasil e, com relação aos brasileiros, sejam obrigados a realizar quarentena de 14 (quatorze) dias na cidade de desembarque.

Assim, incoerente assumirmos um risco que o próprio órgão estatal federal, através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, recomenda o impedimento de pessoas oriundas de outros países em situação calamitosa.

Nesse sentido, indispensável que os legitimados proponham ADPF imediata com pedido de urgência para a suspensão imediata dos atos preparatórios para a Copa América junto a CBF e CONMEBOL, e que é meramente perigosa a realização da Copa América 2021 no Brasil, enquanto houver a necessidade de isolamento social decorrente do estado de pandemia e de calamidade pública em razão da COVID-19.

*Marcelo Válio, especialista em Direito Constitucional pela ESDC, especialista em Direito Público pela EPD/SP, mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP, doutor em Filosofia do Direito pela UBA (Argentina), doutor em Direito pela FADISP, pós-doutor em Direito pela Universidade de Messina (Itália) e pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca (Espanha)

Estadão