Senadora maranhense vira membro honorário da CPI
Foto: Jeferson Rudy/Agência Senado
“Podem contar com meu voto em tudo no que vocês decidirem. Ops, na verdade eu não voto”, brincou a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) ao se despedir dos colegas, depois de uma reunião do bloco de senadores independentes e de oposição na CPI da Covid na última segunda-feira.
Eliziane não é titular da CPI, mas foi incorporada pelo grupo que toma as decisões na comissão. É como se o grupo, chamado de G7 por reunir sete dos onze senadores que fazem parte da CPI, tivesse se transformado em G8.
A presença de Eliziane ajuda os senadores a atenuarem a pressão que vinham sofrendo para incluir mulheres na CPI. Combativa, ela tem ajudado também a engrossar os ataques ao governistas nas sessões da comissão.
Há duas semanas, Eliziane tem participado de reuniões e de informações estratégicas do G7. Até no grupo do WhatsApp, o “filhos de Otto e Tasso”, ela foi incluída. Ainda assim, conseguir voto para Eliziane continua um desafio aparentemente intransponível.
A pressão pela presença de uma mulher entre os titulares da CPI vem desde as primeiras sessões, e fez seu presidente, Omar Aziz, abrir espaço para que o primeiro discurso fosse sempre de uma mulher. Como houve protestos dos governistas, a regra passou a ser permitir que uma mulher sempre falasse junto com os titulares da comissão.
Antes, quando ainda estavam discutindo quem comporiam a comissão, os líderes partidários chegaram a cogitar a indicação de mulheres – como Katia Abreu (PP-TO), ou Simone Tebet (MDB-MS).
Katia, porém, era considerada “muito independente” pelo líder do PP, Ciro Nogueira, que precisava garantir que os votos de seu partido fossem sempre fechados com o governo.
Já Simone Tebet não faz parte do núcleo que comanda a bancada do MDB no Senado, e que ocupou as vagas do partido na comissão com Renan Calheiros, Eduardo Braga, Jader Barbalho e Fernando Bezerra. Nenhum deles cogitou entregar sua vaga à colega.
O próprio bloco do qual faz parte o Cidadania, de Eliziane, só tinha uma vaga para titular – preenchida por Randolfe Rodrigues (Rede), do Amapá, que assinou o pedido de CPI. A suplência foi para Alessandro Vieira (Cidadania-SE), um dos autores da ação que pediu ao Supremo Tribunal Federal a instalação da comissão.
O inconformismo das mulheres com a ausência de uma representante da CPI tinha um motivo concreto. Os membros titulares são os primeiros que falam e fazem perguntas, podem apresentar requerimentos e participar ativamente das investigações. “Faltou perceber que faltava uma mulher, já que somos a maioria da sociedade brasileira”, reclamou na época Simone Tebet.
Para amenizar a pressão, a primeira iniciativa de Omar Aziz foi criar uma “cota feminina” informal, que dava a uma mulher a palavra logo no início dos depoimentos. A própria Simone Tebet, além de Katia Abreu, Eliziane e Leila Barros (PSB-DF) se revezaram na função.
Mesmo assim, não resolveu.”Temos voz, mas não temos vez”, reclamou a emedebista. “Não podemos levantar uma questão de ordem que tenha como resultado a mudança no trabalho dos procedimentos, não temos direito de apresentar requerimentos, não vamos votar relatório e nem podemos apresentar substitutivo.”
Eliziane Gama começou a mudar em parte esse quadro em 20 de maio, durante o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. Foi quando ela protagonizou um embate com Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e com o governista Marcos Rogério (DEM-RO), que apresentou na CPI montagens com vídeos do início da pandemia que davam a impressão de que governadores de oposição a Bolsonaro também tinham feito campanha pelo uso de cloroquina no tratamento da Covid.
Inconformada, Eliziane começou a protestar ao microfone, enquanto os governistas riam, debochavam e a acusavam de ser “advogada de governadores” – referência ao fato de ela ser aliada do maranhense Flávio Dino. Por causa do tumulto, Aziz interrompeu a sessão e chamou o intervalo.
A discussão arrefeceu, mas a performance de Eliziane fez sucesso nas redes e angariou o respeito dos colegas da oposição.
Apesar do bom desempenho, Eliziane diz que “não é simples” tratar sobre o seu ingresso como membro pleno da CPI. Isso porque as vagas na CPI são distribuídas aos partidos de acordo com o tamanho das bancadas. E como não há mais vagas para o Cidadania, para incorporar Eliziane, ela teria que entrar na vaga de outro partido.
“Há muitos interesses envolvidos. Um bloco não vai abrir mão de uma vaga em nome de uma pessoa de um partido de outro bloco”, diz ela. “Não consegui até agora e acho que não vou conseguir”.
Essa saída de fato chegou a ser cogitada. Há alguns dias, membros do G7 passaram a discutir a possibilidade de Eduardo Braga (MDB-AM) ceder sua vaga a Eliziane. Como o movimento não prosperou, os senadores Randolfe Rodrigues e Renan Calheiros agora tentam convencer o suplente de Braga, Jader Barbalho (MDB-PA), a dar o seu lugar à emedebista Simone Tebet.
Como não conseguia resolver formalmente o impasse, Aziz foi criando exceções. Além de incorporar Eliziane ao grupo, ela também foi autorizada também a apresentar requerimentos de convocação e pedidos de informação.
Embora não esteja totalmente satisfeita, Eliziane aproveita as brechas. Está especialmente empenhada em descobrir as relações de Jair Bolsonaro com os fabricantes de hidroxicloroquina e de outros medicamentos sem eficácia recomendados para o tratamento da Covid, e não a vacinação.
Ela passa quase todo o tempo dedicada à CPI – é uma das primeiras a chegar na CPI, só para poder se inscrever na frente e ser a primeira mulher a falar na CPI, e é a última a deixar o Senado. Também destacou uma das assessoras de seu gabinete só para auxiliá-la na comissão.
“Tem hora que eu até acho que voto, menina”, conta ela. “Quando dizem ‘vai começar a votação’, fico atenta pensando ‘ai meu Deus, tenho que votar’, mas em seguida me lembro que não voto.”