Famílias fazem vaquinhas para pagar tratamento contra covid

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Foto: Felipe Dana/AP

Com dificuldade para encontrar leitos públicos de atendimento para casos graves de Covid-19, famílias brasileiras têm se endividado ao recorrer à rede hospitalar particular para conseguir internar parentes em leitos de UTI (Unidades de Terapia Intensiva).

Apesar de a demanda por leitos ter caído na maioria dos estados na última semana, há locais em que a pressão no sistema de saúde ainda é grande, como no Paraná, onde nesta sexta-feira (2) havia 54 pessoas aguardando por leitos.

Em outros lugares, mesmo após a superação do colapso do sistema ainda há parentes que precisam arrumar maneiras de arrecadar dinheiro para pagar a conta, mesmo sem os entes queridos em casa.

No interior de São Paulo, a família do aposentado Luís Antônio Ribeiro, 64, vendeu 400 feijoadas no último final de semana e criou uma vaquinha virtual para ajudar a pagar a dívida em um hospital privado de Matão, distante 139 km de Batatais, onde a família mora.

A necessidade surgiu quando a cidade enfrentava um colapso na saúde, com ocupação de 100% em leitos de UTI e enfermaria na Santa Casa, único hospital local. Depois de passar quatro dias aguardando uma vaga, que não surgiu, a família contratou o leito em Matão.

Ribeiro foi internado em 15 de maio e, em 5 de junho, morreu devido a complicações da Covid-19. A internação custou pouco mais de R$ 115 mil, dos quais restam R$ 60 mil a pagar.

Enquanto esteve internado, os filhos colocaram um terreno à venda, para custear os gastos, mas a morte de Ribeiro, seguida da morte de sua mulher, Angela Maria Ribeiro, 59, no último dia 20, também de Covid-19, fizeram os filhos desistirem, já que é preciso fazer os inventários.

Sem os pais, Ana Paula Ribeiro de Andrade, 39, e o irmão, Lucas, não conseguem vender nada para quitar a dívida. “Meu pai foi muito bem tratado, não temos nada para falar contra. Ele morreu em decorrência da Covid e da demora em conseguir uma vaga para ele”, disse a filha.

A arrecadação com a feijoada não chegou a 10% do necessário para quitar a dívida. A vaquinha virtual juntou outros R$ 4.700, mas os filhos decidiram interrompê-la com a morte do pai. “Vamos continuar tendo de fazer coisas. Meu pai jamais ia querer que ficássemos devendo.”

A luta da dona de casa Jandira Alves de Oliveira, 66, de Volta Redonda (RJ), contra a Covid-19 durou 42 dias. Começou em 2 de abril, quando foi internada, e terminou na madrugada de 14 de maio, quando ela morreu por complicações da doença.

Desde então, a família trava outra batalha, agora para o pagar a dívida com o hospital. O filho, Luiz Gustavo de Oliveira, 37, técnico em informática, conta que a dívida é de R$ 112 mil, de gastos com diárias em UTI, intubação, traqueostomia e hemodiálise, entre outros serviços.

Outros R$ 137 mil já foram pagos com recursos da família e de amigos. Para quitar o restante, os parentes tentam renegociar a dívida com o hospital, que é da Unimed, e abriram uma vaquinha na internet, já encerrada. O valor arrecadado em um mês foi de R$ 8.705,72.

A decisão de levar a mãe a um hospital privado ocorreu depois de a família não encontrar vaga para internação na rede pública. “Pensamos: temos uma reserva financeira. Vamos pagando e, ao mesmo tempo, tentamos a transferência”, contou o filho.

A ida ao hospital público, no entanto, só ocorreu depois de determinação judicial, em 13 de maio. Jandira foi transferida às 22h15 daquele dia, mas faleceu duas horas depois.

Em nota, a Unimed Volta Redonda afirmou que negocia formas de pagamento com a família.

No Paraná, onde a taxa de ocupação de leitos de UTI está acima dos 90% há cinco meses e a fila por leitos só voltou a cair nas últimas semanas, há diversos relatos de famílias endividadas.

No final de abril, após alguns dias com sintomas leves de Covid-19, o corretor de imóveis Rodrigo Rizzi, 42, foi internado em uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Ponta Grossa, a 120 km de Curitiba. Ele foi intubado no dia 4 de maio, quando a família foi comunicada de que o ideal seria transferi-lo para uma UTI.

“Aí começou a luta para procurar vaga. A situação dele se agravou muito rápido, estava com todo o pulmão comprometido e não aguentaria esperar”, contou a secretária Claudiane Nascimento dos Santos, 30, com quem Rizzi tem três filhos pequenos.

Segundo ela, o hospital da cidade tinha 12 pacientes na fila por leitos naquele dia, o que fez a família recorrer à rede particular. Ele só deixou o hospital nesta terça-feira (29), levando consigo uma dívida de R$ 350 mil.

Além de pedir empréstimos, parentes e amigos fizeram uma vaquinha, que soma R$ 60 mil. A banda de rock da qual Rizzi faz parte também promoveu uma live e uma rifa em prol do amigo.

Apesar da dívida, Claudiane acredita que ele não seria salvo sem o recurso. “Meu filho fez aniversário e disse que Deus o escutou: trouxe o pai de volta”, contou.

A estudante de fisioterapia Eduarda Almeida, 22, falou com a reportagem no aniversário de 50 anos do pai, o vereador Paulo Cesar Almeida, em 16 de junho. Mas a família não teve oportunidade de comemorar: Paulinho, como era conhecido, morreu no dia seguinte.

Com Covid-19, ele havia sido internado no dia 1º de junho em uma UPA de Rio Negro (a 110 km de Curitiba), onde vivia. Como seu quadro se agravou, depois de uma semana foi transferido para um hospital particular de Porto União (SC), na divisa com o Paraná.

“Foi uma corrida contra o tempo. No dia em que ele foi intubado, já estava faltando medicamentos para sedação, então ficamos desesperados atrás de uma vaga”, contou a filha.

A família ainda tem que lidar com a conta do hospital, que soma mais de R$ 50 mil. Até agora, arrecadou cerca de R$ 15 mil.

Em nota, a Secretaria de Saúde do Paraná afirmou que, nas últimas semanas, houve queda no total de pacientes aguardando por transferência para leitos exclusivos para Covid-19 e que a expectativa é de que a redução continue. A pasta ressaltou que, no aguardo de vagas, todos os pacientes são assistidos de alguma forma.

A queda ainda não foi sentida na ponta. O médico intensivista Juliano Gasparetto, diretor do Hospital Universitário Cajuru, de Curitiba, diz que as medidas adotadas na capital ainda não foram suficientes para desafogar o sistema.

“Não é só Covid-19, temos atendido doenças respiratórias e cardiovasculares próprias da estação e muitos traumas, que aumentam com a maior circulação de pessoas”, apontou. Ele lembra que pacientes de Covid chegam a ficar 30 dias internados, diminuindo o fluxo de vagas.

A falta de leitos na rede pública também tem pressionado os hospitais privados. A assessoria da Unimed no Paraná afirmou que, “em momentos de pico de contaminações e internações, o sistema tem trabalhado no limite”, com média de 13 horas de espera por vagas.

Diretora da Escola de Comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Suzy dos Santos afirmou que o plano demorou quase dois dias para conseguir uma UTI para a mãe dela. Eunice Sonego, 76, de Cascavel, no oeste do Paraná, foi encaminhada para a vizinha Foz do Iguaçu. Ela morreu no dia 9 de junho, após um dia de internamento no leito especializado.

“Tinha uma fila gigantesca no hospital público da cidade, uma das mais ricas do estado. Me sinto roubada por uma política tosca, levaram a minha mãe por falta de investimento”, disse.

À Folha, a assessoria da Unimed discordou da informação de demora no atendimento. Disse que, num primeiro momento, a beneficiária procurou a UPA da cidade e acionou o plano apenas após o agravamento do caso. Ainda segundo a seguradora, a família restringiu a busca por vagas a Cascavel e que só depois de obter autorização pôde encaminhar a paciente a Foz.

A Unimed afirmou que, apesar de ter criado uma célula exclusiva para atender pacientes com Covid-19, “eventualmente, o cliente pode ter que esperar” por atendimento telefônico.

Folha de S. Paulo

 

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