Gilmar Mendes será decano do STF por quase uma década
Foto: Agência Brasil
Com a aposentadoria de Marco Aurélio, o ministro Gilmar Mendes se tornará o integrante mais antigo do STF (Supremo Tribunal Federal) e assumirá o posto de decano da corte.
Caso fique no tribunal até atingir 75 anos, idade limite para se aposentar, Gilmar desempenhará o papel por nove anos e meio, até dezembro de 2030.
O magistrado afirma que assume a função em um período crítico do país, mas diz acreditar que essa fase será superada.
“Temos passado por situações críticas, mas temos sabido dialogar, os vários integrantes do tribunal têm dialogado com setores envolvidos e temos que prosseguir”, diz.
Gilmar avalia que o posto é uma “função simbólica cujo exercício depende da pessoa que a exerce e das circunstâncias institucionais internas e externas”.
A única mudança prática ao se tornar o membro mais antigo da corte é que o ministro passa a ser o último a votar em todos os julgamentos antes do presidente.
Historicamente, porém, a voz do decano do tribunal costuma ter peso, no diálogo com os outros Poderes e para enviar recados com respaldo da corte.
Gilmar afirma que manterá relação próxima com o mundo político. “Eu sempre procurei ter bom diálogo com o sistema político como um todo e sempre entendi a necessidade de valorar o sistema político. Eles são os grandes construtores e mantenedores da democracia como nós a conhecemos.”
Nas últimas décadas, o decanato no STF foi exercido pelos ex-ministros Djaci Falcão (1977-1989), Moreira Alves (1989-2003), Sepúlveda Pertence (2003-2007) e Celso de Mello (2007-2020).
O universo jurídico concorda —e às vezes diverge — sobre os feitos de cada um deles no desempenho da função, mas é unânime ao destacar a singularidade da atuação de Celso de Mello como o mais antigo integrante da corte. Ele ficou no posto por 13 anos.
Celso disse à Folha que o decano é “figura de exponencial importância, pois tem, entre suas principais atribuições, o desempenho de verdadeiro poder moderador no plano interno da corte, sempre buscando, pelo exercício da persuasão, a construção da harmonia e da tranquilidade da ordem entre seus pares”.
Na visão dele, ao tribunal se impõe o desafio de preservar a institucionalidade, fazer respeitar o princípio básico da separação de Poderes, manter o respeito à ordem democrática e repelir a retórica do insulto — cada vez mais intensa e perigosa, segundo ele.
Quando se aposentou em 2020, ano marcado por ataques de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro a integrantes do tribunal, Celso afirmou que o Supremo irá superar os desafios a que o Brasil tem sido confrontado ao longo da história.
Para ele, por mais difíceis que sejam as previsões sobre o futuro, o STF atuaria na “proteção da ordem democrática, na neutralização do abuso de poder e, como seu mais expressivo guardião, no respeito e na defesa indeclinável da supremacia da Constituição e das leis”.
O ex-ministro voltou ao tema ao classificar de inaceitável que “um chefe de Poder demonstre com atos diários e atrevidos de dolosa transgressão à ordem constitucional o seu evidente despreparo para o exercício do ofício presidencial”.
“É preciso resistir e repelir tais comportamentos no plano e nos limites traçados pela Constituição da República”, afirma.
Marco Aurélio Mello assumiu o posto de decano em outubro passado, com a aposentadoria de Celso. Os dois foram, até aqui, os ministros mais longevos na corte, com mais de 30 anos.
No curto período em que desempenhou o papel de mais antigo no tribunal, ele se posicionou sobre polêmicas relativas ao Executivo.
No mês passado, quando o comando do Exército decidiu livrar o general da ativa e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello de punição por ter participado de um ato político ao lado de Bolsonaro, Marco Aurélio afirmou que o sentimento era de “perplexidade” e considerou um “preocupante precedente”.
Na última sexta-feira (9), em meio às providências finais como ministro, ele conversou com a Folha sobre a experiência de decano. “Eu me considero e sempre me considerei o vice-decano, vamos dizer assim”, disse, em relação a Celso.
Marco Aurélio declarou ter encarado com naturalidade a posição de decano no Supremo, mas frisou que jamais se sentiu superior aos colegas.
“O posto não tem, assim, atribuições específicas. Nós, os 11 ministros, ombreamos. Somos iguais”, afirmou. “A figura do decano é só a cadeira no plenário, à mão direita do presidente.”
O magistrado destacou como exemplo que a ordem de votação não privilegia o decano. “Infelizmente, depois do relator, não vota quem se segue a ele em antiguidade. Vota o bucha de canhão, o novato”, disse, lembrando que, por duas ocasiões propôs, sem sucesso, a mudança.
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